Commirnaty Bivalente, RNAm e Covid

Henrique Autran Dourado

Segunda-feira, 24 de abril de 2023. Pensando em uma conversa tida com um amigo no sábado, não demorei cinco minutos para decidir: Centro Municipal de Especialidades Médicas, o Cemem, perto do centro de Tatuí, SP. A rua é movimentada, mas achei vaga no estacionamento da calçada da clínica, desci, andei um pouco, galguei o ambiente limpo, amplo, organizado. Ali, sentei-me um pouco e puxei assunto com uma senhora de branco, gentil enfermeira, que após conferir meus dados aplicou-me no braço esquerdo uma dose da Pfizer – Commirnaty Bivalente RNAm, a chamada sexta dose de vacina contra a Covid-19. Ela é uma sequência das anteriores anti-Covid, acrescida (daí o ‘bivalente’) do Ômicron B.1.1.526. Já RNA é a sigla em inglês de ácido ribonucleico, que com o “m”, “mensageiro”, forma batalhões de microscópicos cavalos de Troia que atuarão dentro do corpo para contra-atacar o vírus.

Aproveitei para, no braço direito, ter aplicada uma dose contra gripe, a Influenza Trivalente, já que esses bichinhos vão mudando ano a ano e temos de nos atualizar. Atendimento e eficiência: saí de casa e em menos de uma hora eu estava de volta almoçando. Antes que eu me esqueça, minhas experiências com vacinas aqui em Tatuí têm sido cada vez melhores, mas é hora de colocar na pauta alguns problemas de consciência: se eu não me vacinasse, abriria guarda para que os vírus que hospedasse fizessem vítimas terceiros que não escolheram adoecer, o que é muito grave. Uma boa notícia: apesar de esta última vacina ter sido destinada a categorias etárias ou comorbidades específicas, no mesmo dia 24 o governo liberou a bivalente para todos acima de 18 anos, desde que já tenham tomado ao menos duas de Coronavac, AstraZeneca ou Pfizer até há pelo menos quatro meses (G1, 24/04/23). Li que era grande a preocupação do governo com a baixa procura – cerca de 18% – pela faixa etária e comorbidade iniciais, daí a liberação para os 18 anos.

Parece que o apelo já não era tão grande quando do pavor inicial provocado pela doença. Penso que vários fatores contribuíram para esse, digamos, descaso na campanha da vacina anti-Covid: um pouco de cansaço nessa já longa jornada, a desatenção para certos cuidados – máscaras e álcool em gel, além dos efeitos profiláticos, tinham um componente psicológico: ambientavam a tomada de certas precauções. Esse descaso é grande, antes estimulado no viés político por autoridades do nosso país, banalizando as dimensões da virulência da praga covidiana: com certeza, mesmo que um pouco mais rarefeita, o fato é que a incidência do vírus diminui, mas ele continua infectando. E matando.

Resolvi escrever este artigo por motivos que fincam raízes no cenário que acabo de descrever acima. O “gatilho”, para mim, veio com a decisão solidária que me deu na tradicional selfie com a carteirinha de vacinas na mão, tirada ainda na rua, e convenientemente postada em uma rede social. Muitos fazem isso, e eu não me furtei: estimula a procura pela inoculação e a solidariedade. Outro motivo: respondendo à questão de um amigo idoso na rede social sobre se “tem” de tomar esta sexta dose, expliquei o que sabia e ele se disse convencido a ser inoculado. Mais um protegido, que seja. Por fim, lembrei-me de que, apesar de meu conhecimento superficial de infectologia e afins, era meu dever de cidadão de fazê-lo (no sábado, durante aquele bate-papo com o amigo vizinho, fora convencido a segui-lo sem que ele tivesse de mover um dedo: brotou em mim (em música, diríamos que foi vibração por “simpatia” e reproduzi o gesto, foi solidariedade, mesmo. Feliz como eu fiquei ao ouvir daquele amigo idoso que se manifestou pela decisão de tomar a vacina. Afinal, a humanidade não é uma corrente?

Hoje todos já sabemos muito mais do que sabíamos sobre o vírus Covid e suas variantes e cepas, às vezes elegantes e eruditas com o alfabeto grego a reboque; há três anos tudo era temor contra esses vírus franco-atiradores invisíveis. Medo, muito medo. À medida que novas cepas foram surgindo e a vacinação no mundo mostrava certo progresso, vimos que é no coletivo que ela funciona: já sabemos que o vírus não vai desaparecer, veio para ficar, mas a inoculação em massa diminuiu os efeitos que levaram muita gente à internação ou à morte. E agora, estamos protegidos? Em tese, parece que será uma luta constante: manter o nível de infecção muito baixo, cujos efeitos seriam pouco significativos em grande escala. Porém, para tanto é preciso que a campanha não arrefeça e continue o esclarecimento público, assim como que as pessoas atendam aos apelos quando convocadas em suas vezes. Foi assim com a pólio e outras doenças. Ao contrário, o negacionismo vai muito além de “pinga mata isso”, “já tive, estou imunizado” e balelas assim: negar o potencial do vírus é abrir flancos para mais formas de ataque.

Já houve uma “Revolta das Vacinas” contra a campanha do Dr. Oswaldo Cruz, em 1904, quando a peste bubônica, a tuberculose, a febre amarela, a cólera e a varíola tomavam conta das ruas e sua população, em grande número recém-liberta da escravatura, sem que lhe fosse oferecida moradia condigna e sequer o saneamento necessário. Mas o Brasil, terra do Oswaldo Cruz, continua sendo um dos bastiões dessa luta. É preciso ajudar, cada um colocar o seu grãozinho de areia. As vacinas protegem e são de graça, ou, melhor dizendo: nós todos pagamos, por meio de impostos que nos retornam com as inoculações que nos são de direito!

Obrigado por tudo, enfermeiras!