Sem-terra acampados em Quadra apontam para possí­vel ‘massacre’





Arquivo o Progresso

Barracos podem ser derrubados por ação da tropa de choque da Polícia Militar

 

Responsável por um dos maiores acampamentos de sem-terra instalados no país, a FNL (Frente Nacional de Luta Campo e Cidade) promete voltar aos holofotes. A liderança do movimento divulgou, nesta semana, que não pretende deixar a área invadida no município de Quadra – pelo menos, não, sem entrar em confronto.

A Frente espera, para “qualquer momento”, o cumprimento de liminar, expedida pela Justiça de Tatuí, de reintegração de posse. Também programa manifesto em “grandes proporções” na frente da Secretaria Municipal da Educação de Quadra. O objetivo é chamar a atenção para a reforma agrária.

Em agosto do ano passado, sob o comando de José Rainha Junior, os sem-terra invadiram a Fazenda Paiol, localizada à margem da rodovia Gladys Bernardes Minhoto (SP-129).

Eles reivindicavam quase 2.000 hectares de terra para fins de reforma agrária. Na ocasião, 130 famílias compunham o movimento.

Os invasores tiveram de deixar a propriedade após cumprimento de mandado de reintegração de posse, apresentada pelos proprietários. Por conta disso, em novembro de 2014, um segundo grupo fixou-se ao longo da propriedade.

Com adesão de moradores de Tatuí e de cidades da região, o movimento registrou 800 famílias. Na época, a maior parte delas construiu barracos que permanecem em pé até esta semana.

Entretanto, as construções devem ser demolidas com o cumprimento da reintegração de posse ajuizado pela Prefeitura de Quadra. O Executivo alega que os sem-terra ocupam “passeio público”.

Segundo Luciano de Lima, as famílias acampadas não deixaram o local conforme se esperava. Uma parte do grupo saiu das áreas contestadas pelos proprietários – e que estavam sendo usadas para cultivo de pequenas plantações –, mas voltou na sequência. A decisão de permanecer é da própria liderança.

A FNL quer pressionar o prefeito de Quadra, Carlos Vieira de Andrade, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e o governo federal a acelerarem o processo de reforma agrária.

Os dirigentes alegam que as áreas invadidas não são produtivas, questionam a legitimidade das propriedades (sustentam que foram “griladas”) e querem a divisão.

Até segunda ordem, os invasores têm a instrução de ignorar as medidas judiciais. Tanto que, no dia 14 deste mês, parte deles voltou à Fazenda Paiol.

Um segurança do local registrou o fato em boletim de ocorrência na Central de Flagrantes da Polícia Civil de Tatuí. Conforme ele, os sem-terra entraram na propriedade às 10h05, quase um mês depois da reintegração de posse. A Justiça de Tatuí determinou a saída dos acampados em dezembro do ano passado.

Em depoimento, o segurança alegou que conversou com um dos coordenadores do movimento. Conforme o funcionário, o homem afirmou que “nesse caso, o procedimento adotado pela FNL é aceitar a reintegração, num primeiro momento, aguardar uns dias e voltar a invadir, numa segunda fase”.

A liderança sustenta que quer “apenas continuar na região para ter os direitos garantidos”. Os dirigentes dizem que não sairão até que o Incra emita um parecer. O instituto é quem dá início ao processo de reforma agrária.

Por telefone, Lima afirmou que os sem-terra tentaram negociar com as autoridades. Também alegou que a Prefeitura de Quadra está “forçando uma retirada”.

“Até agora, estamos no aguardo (do cumprimento da liminar). Por enquanto, nosso pessoal permanece. A Prefeitura diz que vai cumprir, e pode acontecer a qualquer momento. Nós até esperamos que algo aconteça, porque, lá, vai virar uma nova Eldorado dos Carajás”, disse o dirigente, em menção ao massacre ocorrido no Pará, no dia 17 de abril de 1996.

Nesse episódio, 19 sem-terra morreram em confronto com a polícia do Pará. O episódio ocorreu quando 1.500 acampados decidiram fazer marcha em protesto contra a demora da desapropriação de terras, como em Quadra.

Lima disse que as famílias estão em “estado de tensão” e que não havia necessidade de confronto. “Uma coisa que não precisava. Era só o prefeito cumprir o acordo que nós fizemos com o Incra, que falta concluir o levantamento”, alegou.

A FNL pediu mais 60 dias de prazo, além dos 30 concedidos pela Prefeitura de Quadra para aguardar o laudo no acampamento.

Segundo o dirigente, o prefeito da cidade vizinha não manteve acordo verbal. “O mais importante é criarmos o fato. E nós vamos aproveitar esse conflito para fazermos a reforma agrária”, disse Lima. Por esse motivo é que o grupo espera possível confronto com a tropa de choque da Polícia Militar.

Também nesta semana, a FNL pretende realizar um manifesto na frente da Secretaria Municipal da Educação de Quadra. O objetivo é protestar contra decisão do Executivo de não matricular os filhos dos acampados nas escolas locais.

Os sem-terra prometem realizar um evento “pacífico”, com passagem pelas principais ruas da cidade. A intenção é chamar a atenção das autoridades para a falta de vagas. Conforme Lima, a Prefeitura teria se negado a matricular os filhos dos acampados com diferentes idades escolares.

“Onde já se viu uma situação dessa. Está no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), mas em Quadra não se pode estudar. Lá, tudo é diferente”, encerrou.