O chorão toca seu bandolim, criado no século 18 a partir da “bandola” italiana. Usa uma palheta (como o “plectrum” do antigo cravo). No grupo, o cavaquinho, também conhecido como Braguinha, veio da Braga lusitana, onde se chamava viola braguesa; o violão descende do “alaúde” (“al-ud”), introduzido pelos mouros durante a ocupação da Península Ibérica (711-1453). Pode ter seis ou sete cordas, e faz a “baixaria”. O pandeiro, saído do “adufe” árabe, cuida do ritmo, enquanto a flauta (do francês “flûte”, encontrada até em osso na pré-história) leva a melodia, às vezes seguida também pelo banjo, introduzido na África pelos árabes no século 17. O choro é música que nasceu da mistura do schottish – escocês, claro -, da polca polonesa e do samba (de “semba”, em dialeto de Luanda), por sua vez mesclado com maxixe, mistura de vários gêneros.
O guitarrista trabalha seus “licks”, trechos curtos em progressão, e “riffs”, padrões rítmico-melódicos. Costuma usar pedais como o “sustain” e o “wah-wah” (o som lembra o da surdina de trompetes nas velhas big bands), entre outros. Os grupos procuram “gigs” (do inglês) ou cachês (do francês “cachet”) para serviços em clubes ou boates (do francês “boîte”, caixa, pequeno ambiente), para depois se divertirem em uma “jam-session”, brincadeira de músicos (J.A.M.: “jazz after midnight”), quando o trabalho já terminou. Os acordes são escritos em cifras no mundo inteiro: “Cmaj7”, dó maior com sétima maior (“major”) e “Dmin7”, ré menor com sétima menor (“minor”), ambas em inglês).
Na música clássica, acontece o tempo todo: desde “sonata” (it.) peça tocada, ao invés de “cantata”, cantada. Sonata depois passou a designar uma forma padrão de movimentos; “sinfonia” (do grego) é o agrupamento de vozes, sons, depois também uma forma composicional definida. Pavana vem do francês “pavane”, dança palaciana. O pianista pode tocar um “impromptu” (do latim, improviso), uma “balada” (do francês “ballade”), canção de espírito narrativo, ou uma “polonaise” (polonesa, em francês) como em obras de Chopin. Pode-se tocar uma passagem em piano, suave, quem sabe “mezzo-forte” (em italiano); cantar com “voix de poitrine” (voz de peito, em francês), ou “boca chiusa” (boca fechada), como na “Bachianas 5”, de Villa-Lobos.
Os instrumentos de arco podem ser tocados de centenas de formas: “legato”, sem interrupção no som, “spiccato” (do italiano “spicare”, separar), com o arco saltando, “jeté”, “atirado”, “sul tasto”, executado próximo ao “tasto”, peça de ébano sobre a qual os dedos da mão esquerda pressionam as cordas. Talvez um “detaché”, “destacado”, em francês, “col legno”, “com a madeira”, em italiano, percutindo a vareta do arco na corda, “portato” (do italiano), sequência de notas levemente separadas, articuladas em uma mesma direção, e tantas outras. Há várias formas de se tocar cada um desses “golpes”, a depender da escola estilística e da época. E há os termos mistos, que juntam dois ou até três idiomas, como em “col legno gestrichen” (italiano-alemão), um movimento em que a vareta do arco é “raspada” sobre a corda, juntamente com a crina, e “detaché off-string” (francês-inglês), destacado, com o arco carregado fora da corda, sem nela repousar. A harpa, de cordas dedilhadas, pode tocar “près de la table” (do francês, “perto da mesa”, o tampo harmônico, caixa de ressonância do instrumento. O profissional que constrói ou repara instrumentos de cordas é o “luthier” ou “liutaio”, em francês e italiano, respectivamente (de “luth”, alaúde, que vem do árabe “al’ud”). As madeiras também levam nomes estrangeiros, principalmente italiano, como accero e abeto.
Eu poderia discorrer sobre o assunto “ad libitum”, expressão latina que em música significa que o instrumentista ou cantor deve executar sua parte com liberdade, sem mensurar o tempo. No meu “Dicionário de Termos e Expressões da Música” (SP: Ed. 34, 2004), coletei mais de 10.270 verbetes em diversos idiomas, mas sem incluir biografias para “engordar” o texto: são apenas termos e expressões. Mas será que todos os músicos são versados nessa babel de termos? Claro que não!
Os que fazem a música pura, a linda música de raiz, do baião ao xaxado, do cururu à moda de viola, do vaneirão à guarânia, do desafio ao samba de partido alto e o pagode – aquele de verdade, a tenda montada no quintal lembrando um pagode chinês, e não o modismo da TV, bem diferente. Todos usam instrumentos cuja origem para eles não importa realmente, e fazem sua arte por herança oral (diria até “aural”), coisa de pai para filho. Usam a viola caipira (ou um de seus outros 12 nomes) afinada em cebolinha, cebolão, rio abaixo, rio acima, conforme a região e o estilo. Pegam no “pinho”, sua viola de arame, e com incrível habilidade avançam na técnica chegando mesmo ao virtuosismo, simplesmente pela prática. No samba, podem tocar surdo de 1ª ou de 2ª (o tempo mais forte), e às vezes instrumentos que sabem apenas ser de origem africana, como afoxé e agogô, e isso lhes basta.
Esses artistas sabem que sua música sai do coração, tocam quase sempre por prazer e dedicação de devoto, não pensam em ser “sertanejos pop” e ficarem ricos. Sua arte é para sua comunidade, seus amigos, em quintais e bares, para quem quiser ouvir. Não pedem cachê, basta-lhes uma cervejinha barata ou uma pinga “para abrir a garganta”. Fazem desse amor à arte profissão de vida. E não carecem de quem os ensine teoria e afins: se ensinarem, estraga.