Off-road na rua 11





A rua 11 de Agosto, até os anos 70, praticamente terminava ali na esquina da rua Cel. Guilherme. Daí em diante era a estrada de Itapetininga. Uma estrada apedregulhada, diga-se de passagem.

O Clube de Campo era, pode-se dizer, “mais de campo” que hoje, porque atualmente se encontra dentro da cidade. Poucas eram as casas por ali. Havia denso eucaliptal às margens da estrada, onde atualmente é o Jardim Fortunato Minghini, do próprio Fortunato, que era proprietário do “calipá” e tinha lá uma serraria onde desdobrava as toras dessa madeira.

Mas, apesar das raras residências nas proximidades do Clube de Campo, já existia o bairro do Valinho e, ao lado do clube, o atualmente denominado Jardim Tatuí. Lá residia a minha amiga Dolores Dias da Rosa e, devido ao fato de morar tão longe do centro, os colegas de escola a chamavam de Dolores Dias da Roça.

Ainda nos anos 60, grande parte dos tatuianos que aqui viviam nem pensava em ir para essas bandas, porque não tinha nada para se ver e nem alguma necessidade a resolver por lá. Poucos automóveis e, se a ideia fosse dar um passeio pela cidade, nessa região ninguém passava, pois a estrada, apedregulhada, era horrível. Um convite para furar pneus.

Essa descrição da região pode parecer inacreditável para quem só a conhece há poucos anos. Diversos bairros, muitos estabelecimentos comerciais, supermercados, farmácias, escolas, faculdade…

Mas, nos anos 70, pouco tempo após a instalação das montadoras de automóveis no Brasil, possuir um carro já era o sonho de muitos brasileiros. Cada dia havia mais automóveis pelas ruas e, com a cidade crescendo, as ruas deixaram de ser simplesmente apedregulhadas e foram pavimentadas.

Desejando ter seu automóvel, o meu amigo Jaime Fonseca conseguiu comprar um Jeep Willys usado. Melhor explicando, um Jeep muito usado. Mas foi o que foi possível comprar.

Ah, que sensação deliciosa rodar pela cidade com aquele veículo. Não tinha capota e, baixando o para-brisa, sentia no rosto o sabor do vento. Jaime chamou uns amigos e foram rodar pela cidade.

Vira aqui e para ali… desejando um pouco mais de emoção, pegou a rua 11 – na ocasião já asfaltada – e foi em direção ao Clube de Campo. Lá era possível dirigir um bom trecho sem ter de parar em esquinas. Pudera, era quase uma estrada!

Mas o Jeep tinha lá seus problemas e “reinou” no caminho. Quase em frente ao Clube de Campo, bufou, rugiu, sacolejou e parou. Será que acabou a gasolina? Não! Será isto ou será aquilo? Ah, deve ser o platinado.

Como nessa época todos os automóveis carregavam diversas ferramentas, pois panes eram comuns, começaram a lidar com o jipe. Tira o platinado, dá uma lixadinha, recoloca, tenta a partida. Nada. Desmonta parte do carburador, limpa aqui, sopra ali, monta, tenta a partida. Nada.

De tanto girar o motor de arranque, em pouco tempo a bateria esgotou. Quase nem dava sinal. Bom, com aquele bando de amigos, a solução foi empurrar. Empurra, engata uma segunda, dá um tranco. Nada do motor do jipe pegar.

Empurra novamente, dá um tranco e parecia que quase pegou. Estavam todos cansados de empurrar o danado jipe e até com muito calor, pois o sol da tarde estava ardendo.

– Precisa de mais embalo, vamos descer aqui! – alguém deu a ideia, e começaram a empurrar o jipe em uma das ruas do Jardim Tatuí, logo depois do clube.

O jipe desceu mais embalado pela rua Máximo Toni (Máximo Toni foi um de meus bisavôs maternos) até seu final. Mas não pegou. Viraram o jipe no final da rua, tentando outros trancos. Mas não dava. Faltava só pegar um embalo que ia dar certo, pensavam. Mas onde?

Nessa rua, o Pedro “Doca” Ferreira estava construindo sua casa. Uma bela casa, quase uma chácara. Ainda não tinha muro e a casa estava em obra. Entraram com o jipe para aproveitar um pequeno trecho de descida.

Força! Empurra! Mais depressa! Apesar do entusiasmo, o jipe parou no fundo do terreno, quase caindo no ribeirão ali existente. Todos estavam desacorçoados de tanto empurrar e lidar com o teimoso jipe.

O Doca, vendo o jipe parado no fundo de sua propriedade, foi perguntar ao dono do veículo o que havia acontecido. Quase sem fôlego, pensando até em botar fogo no jipe e no meio de sua primeira desilusão automobilística, o Jaime disse:

– Comprei essa porcaria ontem, mas dá um trabalhão. Agora nem sei como vou levar isso a um mecânico! – explicou.

O Doca, com um misto de dó e movido pelo senso de comerciante, perguntou:

– Mas quanto você quer pelo jipe?

– Ah, eu comprei por 4.500 cruzeiros. Três pagamentos de 1.500 cruzeiros. Com 30, 60 e 90 dias!

– Pois vou lhe fazer uma proposta: dou 3.000 cruzeiros à vista! – Doca propôs.

O Jaime ficou pensativo. Rebocar o jipe, levar a um mecânico, gastar com peças e mão de obra… Humm!!! E resolveu:

– Com uma condição! – respondeu ao Doca. – Que o senhor dê uma carona para todo mundo até a cidade! – completou.

Assim fecharam o negócio, voltaram à cidade, Jaime com os bolsos cheios, e o jipe ficou lá, no barranco do ribeirão. O sonho automobilístico foi adiado.