Henrique Autran Dourado
Saldo de uma vil mistura de má-fé com falta do que fazer, ou de desemprego com a índole nata do brasileiro para a qual não há outra vacina senão educação, a cada dia que passa estamos e continuaremos vítimas de tentativas de fraudes e golpes. Não aquela moedinha e tampinhas de refrigerante sobre um caixote na Praça da Sé, truques de prestidigitação para lograr os incautos ou a autovitimização trapaceira para mendigar e roubar, os golpistas de hoje utilizam ferramentas mais poderosas: bits, linguagens binárias, extensões falsas e afins. Com uma vantagem: podem fazê-lo a partir da Romênia, da Rússia ou da Coréia, tudo sem sair do Brasil!
As queixas se avolumam, e não há delegacia especializada que dê conta dos crimes. As DPs civis não são dotadas de equipamento e pessoal para lidar com os cybercriminosos. Limitam-se ao possível, o boletim de ocorrência de autoria desconhecida. Isso, fora os novos punguistas das filas de banco – que não surrupiam carteiras, mas seu cartão e sua senha -, os clonadores com truques nas maquininhas, larápios com novas tecnologias, ladrões do Pix e dos cartões de crédito por aproximação.
No dia 2 de junho comprei uma boa máscara de proteção, a PFF2 da 3M, por meio de uma empresa de comércio eletrônico criada na Argentina e bastante popular do Brasil. O preço era convidativo e a proteção eu sabia excelente, poderia revezar com as duas N95 que já tenho. São máscaras de alta tecnologia e não laváveis por serem eletrizadas, o que garante a destruição de possíveis vírus nelas acampados. Finalmente, no dia 8 de junho chegou a encomenda pelo correio. Alegria! Formato concha, selos do Inmetro e da Anvisa, numeração especial indicada contra poeiras, névoas e fumos, uma beleza! Ou quase.
Para meu espanto, na aba inferior, que cobre o queixo, dava para ler “Mendes”, escrito grosseiramente a esferográfica, nome provável do usuário anterior. Reclamei, o vendedor Reis disse que o fornecedor marcava assim seus produtos. E que eu poderia devolver de graça e ter o valor estornado. Ora, ora, devolver? Que tipo de fornecedor chinfrim é esse? Devolver? Para ser revendida para algum incauto? Máscaras boas vêm em embalagens esterilizadas, lacradas, com todas as informações.
Há uns anos, havia o golpe da Loteria Espanhola, que paga os tubos em prêmios. Recebi por e-mail, e aceitei, para brincar, perguntando o que fazer. Estava em espanhol, mas fui respondido via Bélgica. Mais algumas questões, reenviei e a informação e desta feita o retorno veio ainda outro país. Ou seja, os fraudadores vão singrando entre provedores para impossibilitar sua localização. Mas o que queriam? Na ponta final, o gato apareceu: pediram uma boa cópia da página que traz foto (mais assinatura e informações…) do passaporte, além de uma conta bancária para que pudessem fazer o vultoso depósito. Não vou reproduzir o que escrevi em respeito ao leitor. Acabou a brincadeira, poderia ter dito o popular “a casa caiu”. (Lembrei-me da velha história americana do charuteiro ambulante que passava de porta em porta e recebia uma resposta que virou uma popular negativa para tudo há muitas décadas: “sorry, but no cigar” – “desculpe, mas charuto não”. Aqui, “perdeu, playboy”). Isso foi passado, hoje a bandidagem evoluiu.
Pululam modalidades de golpes nas redes sociais e na imprensa. Criativos, aparelhados, os meliantes poderiam dispor conhecimento e destreza a serviço da sociedade. (Os mais preparados vendem-se caro a círculos nada canônicos do poder, que acabam atingindo um universo muito maior de pessoas: a massa de contribuintes).
Não bastassem os milicianos digitais, há os hackers do submundo político, os invasores institucionais, os criadores de “fake news” e pilotos de máquinas de fazer mentiras. Ou, simplesmente, os propagadores de falsas informações com montagens grosseiras e textos mal redigidos. Em 2022, tudo indica, chegará o poderoso 5G, que alçará a Internet a patamares até então desconhecidos, um novo mundo de informações em tempo quase real, o chamado “real-time”. Um alerta: os fraudadores, que antes lidavam com vírus bobos e hoje usam golpes comerciais e de espionagem com bugs de RNA ultramodernos como os “Phishings”, galgarão rapidamente os degraus da nova tecnologia, tornando-se bandidos superpoderosos. Empresas serão aparelhadas para combatê-los e venderão seus escudos e antídotos – rapidamente neutralizados pelos criminosos, em uma roda-viva.
Não uso cartões de crédito por aproximação, pois que podem ser traiçoeiros e até, acredite, debitar valores em sua conta pela simples proximidade de uma maquininha com sua carteira no bolso. Não passo informações sobre nada pessoal, pesquiso a vida de cada candidato a “amigo” nas redes sociais: o que pensa, amizades comuns, principalmente, suas opiniões políticas e publicações – quando as há. Em suma, nada de desconhecidos ou que não tenham como “recomendação” tácita a afinidade com alguns amigos meus de boa reputação. Já tive meu perfil invadido supostamente da França, e diversos europeus passaram a ciscar no meu quintal. Foi o diabo para me livrar daquela “disgrâce”, mas passei a receber e-mails dizendo que tinham uma de minhas senhas – e a mostraram.
Se Gil compôs Lunik 9 em um longínquo 1967, “guerra diferente das tradicionais / guerra de astronautas nos espaços siderais”, o que será dos combates ora em diante? Como serão a disputa política em 5G, as fake news, e, pior ainda, tudo isso tendo em vista um previsível futuro /6G?