‘Mamãe Noel’ do Santa Cruz muda cor de uniforme e ainda aceita apoio





Cristiano Mota

Circe começou a embalar kits de meninos e meninas nesta semana

 

Há 20 “e tantos” anos, Circe Machado Bastos iniciou um trabalho que tem como recompensa o sorriso. Com ajuda de amigos, a mamãe Noel do bairro Santa Cruz promove arrecadação de brinquedos, separa as doações e prepara os kits (essa segunda tarefa sozinha) e sai à entrega na semana de Natal.

Em 2014, ela deve mudar a cor do uniforme. Do azul, como Circe gostava de se vestir, passará para o vermelho. A troca deve-se a uma doação: ela recebeu um uniforme novo de uma das filhas e vai utilizar roupa, gorro, cinto e barba “novos” para efetivar a entrega de brinquedos a mais de 3.000 crianças carentes.

Os presentes começaram a ser embalados nesta semana, na casa da própria voluntária. Cada criança receberá itens diversificados. No geral, as meninas ganharão bonecas e, os meninos, carrinhos. Mas há doações de todos os tipos, como bolas e petecas. Tudo é separado em sacolas individuais. Elas acompanham balas e são preparadas de uma maneira “padronizada”, para evitar brigas.

A voluntária começou a receber os brinquedos em doação no dia 12 de novembro. Muitos são entregues na residência dela, por pessoas que preferem não se identificar. É o caso de uma doação recebida na semana passada.

Na ocasião, houve a entrega de 2.000 caixas de brinquedos vindos de Laranjal Paulista. “A pessoa não quis se identificar, disse que apenas veio entregar”, contou.

Circe afirmou que todos os itens são bem-vindos. Armazenadas na garagem da casa dela, as caixas tiveram de ser abertas para que os brinquedos fossem separados. Segundo ela, a montagem dos kits é essencial para manter a organização. Também evita que as crianças se sintam desprestigiadas.

A distribuição acontecerá em três dias, começando na próxima terça-feira, 23. Ela seguirá na véspera do Natal, dia 24, e no dia de Natal, 25, basicamente em três bairros.

O primeiro deles a receber a visita da mamãe Noel será o Residencial Astória. Lá, Circe fará a entrega em um ponto a ser definido por lideranças do bairro.

A carreata iniciada por Circe continuará no Jardim Thomaz Guedes, e no Jardim Santa Rita de Cássia. A distribuição é feita juntamente com amigos e com “patrocínio do marido” de Circe, José Carlos Bastos. “Ele paga o combustível”, disse.

O grupo percorre os bairros em veículos que levam os brinquedos, além de balas e guloseimas. Na medida em que vão distribuindo os kits, voltam para “abastecer”. “Fazemos isso durante o dia todo. O maridão me ajuda, com carinho”, contou.

A colaboração de José Carlos não fica só no transporte. Ele também auxilia com a reposição de alguns itens de embalagens (como sacos plásticos e fitas para decoração) e balas. “Ontem, mesmo (terça-feira, 16), ele comprou uma caixa de balas para mim. O problema é que já acabaram todas”, falou.

Empresários do município, profissionais liberais e cidadãos em geral, também colaboram com a iniciativa. Circe, no entanto, está precisando de sacos e fitas de enfeite para concluir os kits restantes. As doações podem ser feitas até a segunda-feira, 22, na rua Artur Napoleão de Oliveira, 66, no bairro Santa Cruz. Quem preferir, pode agendar entrega pelo telefone 3259-7214.

Brinquedos novos e usados também podem ser doados durante esse período. Os primeiros são separados diretamente para embalagem; os demais, precisam passar por processo de limpeza e de higienização antes de compor os kits.

Circe realiza o trabalho de recuperação dos brinquedos desde que começou a entregar presentes no Natal. Ela teve a ideia de ajudar as crianças que não “recebiam a visita do bom velhinho” a partir dos brinquedos usados, deixados pelos filhos.

“Comecei dando os presentes deles. Depois, pensei: porque não arrecadar?”, disse. Anos depois, ela viu o trabalho prosperar e passou a atender as crianças do Jardim Europa (que residiam em áreas de preservação permanente).

Os primeiros anos foram marcados pelo anonimato. A divulgação veio com a publicação de uma matéria na imprensa e permitiu que a ajuda fosse ampliada. “Esses dias, mesmo, uma pessoa trouxe um brinquedo porque viu uma reportagem publicada no jornal O Progresso. Divulgar me ajudou muito”, disse.

A ação realizada por Circe é ininterrupta. Desde que começou a contemplar crianças, ela não parou. A voluntária explica que muitas pessoas cobram a distribuição. Em 2014, entretanto, um problema de saúde quase fez Circe desistir.

O diagnóstico mais recente apontou uma inflação no braço direito da voluntária. Atualmente, ela passa por sessões de fisioterapia, acompanhadas de medicamentos. O trabalho manual, de embalo, faz com que as dores piorem. “Mas eu não consigo parar. Enquanto Deus me der saúde, o braço é o de menos. Além disso, eu tenho o esquerdo para me mexer”, falou.

Para ela, todo o trabalho é compensado pelo sorriso das crianças. A voluntária afirmou que se sente privilegiada por poder ajudar crianças carentes. O empenho encontra explicação na história pessoal de Circe. Quando criança, ela não chegou a conhecer a figura do Papai Noel ou ter um brinquedo,

“Meu pai era um irresponsável. Quando criança, brincava com bonecas de milho que eu mesmo fazia. Então, oferecer para as crianças o que eu não tive é uma maravilha. Aliás, eu vivo para fazer esse tipo de trabalho”, comentou.

Para evitar expectativa nas crianças, Circe contou que não recebe cartas. A voluntária prefere entregar os presentes em uma ação conjunta porque desta forma as crianças ficam estimuladas a brincar e deixam de prestar atenção no tipo de brinquedo que ganharam. Ela também auxilia em campanhas em outros bairros.

Em média, Circe monta 62 kits por dia, sendo metade para meninos e o restante para meninas. A meta é concluir os trabalhos na segunda-feira para cumprir o prazo.