“Quando pobre come frango, um dos dois está doente”

Mouzar Benedito *

Recentemente, antes da coroação do rei Charles III, da Inglaterra, noticiários de jornais e da TV falavam de toda sua pompa, e que teria um almoço meio fraco em vez de um banquete.

Acho estranho esse fascínio da grande imprensa brasileira pela família real britânica. Dão páginas e páginas de jornais e revistas, e matérias extensas na televisão para qualquer evento da dita família, como se interessasse muito a todos nós.

Uma matéria comparava com a coroação de Elizabeth II, que foi mais pomposa. Mas o prato servido na coroação dela foi frango.

Festa da família real tão badalada servindo frango no almoço? Muita gente achou estranho. Frango hoje é a carne mais barata. Mas não era assim.
Depois que começaram a criar frangos em granjas, eles perderam muito o sabor, que não pode ser comparado ao de frango caipira, mas barateou muito.

Na época, frango era tão caro que quase só se comia aos domingos. Famílias com dez pessoas ou mais, dividiam um único frango, feito com bastante caldo pra dar sabor ao arroz com feijão.

Costumo brincar dizendo que naquela época as avós sabiam que só sobraria para elas o pescoço e os pés, mas elas fingiam que eram as suas partes preferidas. “O pescoço é meu”, diziam alegres.

E pobre não comia frango nem mesmo aos domingos.

Era tão raro nas suas refeições que o Barão de Itararé criou uma frase que ficou famosa: “Quando pobre come frango, um dos dois está doente”.
No meu tempo de infância, um caminhão chegava uma vez por mês em Nova Resende e outras cidades da região, para levar frangos pro Rio de Janeiro, a centenas de quilômetros, por estradas de terra.

Uma vez, um jovem desempregado pegou uma carona no caminhão, indo como ajudante, para tentar melhorar de vida no Rio de Janeiro. Sem dinheiro, ele combinou com o motorista um jeito de ganhar uma grana.
Pararam para almoçar num restaurante do centro de uma cidade, já no estado do Rio, e o motorista falou pra todo mundo que aquele jovem era mudo e tocava violão muito bem.

O rapaz pegou o violão que levava com ele e tocou bem mesmo. Admiraram, e ficaram muito comovidos por ele ser mudo. Foi muito aplaudido e lhe deram um dinheiro razoável.

Quando entrou na cabina do caminhão e o motorista deu a partida, ele pôs a cabeça pra fora e gritou ao público que o olhava admirado: “Tiau, mudaiada!”.

* Escritor, geógrafo e contador de causos.

Livros do Mouzar Benedito pelas editoras Boitempo, Limiar e Terra Redonda.

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