Mouzar Benedito *
Quando eu tinha 16 anos de idade, morava numa pensão no bairro de Pinheiros, em São Paulo, numa situação bem ruim. Banheiro fora, por exemplo… Em tempo seco, até que não tinha problema, mas quando chovia eu tinha que andar uns cinco metros debaixo de chuva para chegar ao banheiro, que era o único para 15 moradores da área externa da pensão.
Aí uns conterrâneos que também moravam lá e eu resolvemos criar uma república. Íamos morar sete trabalhadores numa casa relativamente pequena, mas com banheiro dentro e só para nós sete, em vez de 15 pessoas.
Alugamos a casa e um dos colegas disse que uma tia dele, com 60 anos, vivia sozinha e dizia que queria voltar a trabalhar. Perguntou se não topávamos trazer a tia, dona Maria, para morar com a gente. Ela lavaria a roupa e cuidaria da casa. Podia até fazer comida. A gente almoçava no trabalho e passaria a jantar em casa, e não mais numa pensão. Topamos.
Ele passou um telegrama para o pai, que colocou a dona Maria num ônibus e mandou recado do horário da chegada dela na estação rodoviária, num sábado à tarde.
Ele foi esperar a tia, e ela, um pouco idosa mas não por isso, estava um tanto debilitada e meio atrapalhada… Pra começar, teve muita dificuldade para subir na escada rolante e mais ainda para descer, no lugar onde deveria pegar o táxi. Ela só não caiu porque o sobrinho amparou.
Na república, à noite, vimos que dificilmente ela teria condição de fazer tudo o que a gente esperava: cuidar da casa, lavar a roupa e fazer o jantar. Mas tudo bem. Cuidaria da casa e no resto a gente se virava.
No dia seguinte, domingo, meu amigo foi com a tia visitar uns parentes, mas sabia que em São Paulo as visitas deviam ser curtas. O que fazer com a tia no domingo à tarde?
No Parque Dom Pedro II, no centro da cidade, tinha um parque de diversões chamado Parque Shangai. Ele levou a dona Maria para se divertir lá. E sabem que diversão escolheu para fazer com ela? Passear na montanha russa! Se ela teve dificuldade para andar na escada rolante, imaginem o pavor que teve na montanha russa.
Quando terminou o passeio, estava travada, tonta, não conseguia nem andar e até falava enrolado.
Desistiu de morar aqui, achando que teria que encarar aventuras como aquela de novo.
E ficamos sem a dona Maria. Ainda bem.
Escritor, geógrafo e contador de causos.
Livros do Mouzar Benedito pelas editoras Boitempo, Limiar e Terra Redonda.
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