Da reportagem
Grande parte – se não a maioria – de quem vive na região de Tatuí já comeu algum alimento melhorado ou desenvolvido a partir do trabalho do NRP (Núcleo Regional de Pesquisas), a antiga Estação Experimental de Tatuí, que voltou a levar o nome do engenheiro Armando Pettinelli.
Entretanto, poucas pessoas sabem que o feijão, principalmente, além do milho e da soja – que são comercializados regional e até nacionalmente – têm como ponto de partida as pesquisas agronômicas daqui.
“Muito provavelmente, quem consome, ou já consumiu feijão, consome ou consumiu um alimento que chegou ao mercado em forma de produto a partir de pesquisas do NRP. Sem sombra de dúvida, tem a contribuição da nossa unidade”, destaca o engenheiro agrônomo e diretor técnico do NRP de Tatuí, Marcelo Ticelli.
De acordo com ele, antes de serem lançadas, as novas linhagens de grãos que chegam à mesa dos consumidores – incluindo a dos tatuianos – são testadas pelos pesquisadores do NRP. Os resultados são divulgados em artigos de revistas, relatórios técnicos e em reuniões, congressos e simpósios científicos.
A meta do núcleo com as pesquisas é desenvolver trabalhos que tenham não só reconhecimento entre os pares (no meio científico), mas atendam regionalmente as deficiências de estudos dentro das cadeias produtivas. “Geralmente, nós fazemos muitos melhoramentos na parte de feijão e de milho”, conta o diretor técnico.
Os trabalhos consistem em avaliações regionais considerando as características agronômicas (chuva, estiagem, solo, altitude etc.). São análises voltadas tanto para a silagem (de forma a evitar perdas no período de estoque) como para a parte de grãos (melhoramento da produtividade, maior resistência às pragas, menor tempo de incubação e de germinação, entre outros).
Os resultados das pesquisas do NRP auxiliam a indústria de grãos a obterem registros e a desenvolverem produtos com mais qualidade, além dos produtores de cultivares a conhecerem os materiais que melhor se adaptam à região. Dessa forma, contribuem para os ganhos de produtividade e lucratividade.
“Nem todo material de milho que é plantado aqui vai bem em outra região. Então, quando os produtores têm esses dados, podem decidir melhor”, cita Ticelli.
Conforme o diretor técnico, as demandas por novas pesquisas de desenvolvimento nem sempre vêm dos produtores ou das indústrias do agronegócio. Elas levam em consideração, principalmente, a vocação regional.
No caso de Tatuí, as lavras são mais voltadas ao feijão, ao milho e à soja, estendendo-se ao trigo e cereais de inverno, por conta do clima. “Fora isso, na região, não há como fazer muita pesquisa de adaptação”, diz o engenheiro.
No momento, o NRP de Tatuí “Armando Pettinelli” realiza estudos com milho e inicia ensaios de feijão. Um deles, que avalia uma variedade da leguminosa, está prestes a ser colhido, mas teve os resultados comprometidos em razão das chuvas. “Infelizmente, a colheita coincidiu com o período chuvoso. E acredito que os dados não poderão ser utilizados”, antecipa Ticelli.
Segundo ele, as mudanças climáticas influenciam nos resultados, mas ajudam a equipe de pesquisa a entender o comportamento dos cultivares sob determinadas condições.
No caso do feijão, os estudos desenvolvidos no NRP são de melhoramento de linhagem para processamento de materiais. A linhagem é o termo utilizado para definir a semente de matriz pura selecionada pelo pesquisador em melhoramento genético para obter sempre o mesmo híbrido. A semente de linhagem é obtida pela autofecundação da planta.
O passo seguinte é verificar a adaptação dela na região para registro do material que vai virar uma cultivar. A finalidade do plantio – e das observações – é lançar essa nova linhagem. Em outras palavras, colocá-la à venda para os produtores.
Na cultura da soja, as pesquisas deste ano não puderam ser levadas adiante. Ticelli explica que a equipe perdeu o campo por causa da seca. “Plantamos, mas não conseguimos fazer a irrigação por falta de água”, conta. O ensaio que não pode ser analisado tinha 33 cultivares de soja. As cultivares são variedades de plantas destinadas à produção e que resultam de melhoramento vegetal.
Com isso, os pesquisadores ficaram sem dados para saber quais cultivares – ou qual – se destacariam em termos de produtividade. Essas informações, em geral, são repassadas aos produtores pelas empresas agrícolas.
E os agricultores conseguem, por meio dos dados, saber se determinado material produz mais, adapta-se melhor às condições climáticas ou é mais resistente a pragas.
“Infelizmente, nós perdemos todo ensaio por causa da seca. Não choveu e estávamos com déficit de água para irrigar. Os nossos açudes estavam com nível muito baixo e tivemos problemas com o afloramento das plantas”, conta o engenheiro agrônomo. Já em 2021, o NRP não teve contratempos com os ensaios.
Dos estudos desenvolvidos em Tatuí, o feijão é o único que utiliza cultivar comum. Os materiais utilizados nos ensaios que dão origem às pesquisas são lançados pelo governo e produzidos por melhoristas do estado que atuam no IAC (Instituto Agronômico de Campinas), ao qual o NRP é vinculado.
Já no caso do milho e da soja, as sementes utilizadas são enviadas por empresas interessadas em avaliar as cultivares para obter o resultado da produção, avaliar se não há o desenvolvimento de doenças e, com isso, obter autorizações.
“Para registrar o material junto aos órgãos competentes e poder lançá-lo no mercado, as empresas têm de ter esses dados locais”, conta Ticelli.
Conforme ele, as autorizações são concedidas a partir de informações fornecidas por mais de uma unidade de pesquisa. Pelo menos três são exigidas.
No NRP de Tatuí, a equipe de análise e desenvolvimento já perdeu as contas de quantas cultivares avaliou. “Além de feijão, nós temos trabalhos realizados com soja e milho de pipoca”, enumera o engenheiro agrônomo.