O sapateiro ia batendo
batendo batendo o martelo
com uma tal monotonia sem fim
Parecia um despertador
naquele seu constante tiquetaque
costurando o silêncio da madrugada
Os dias arrastavam-se vagarosos
quase em compasso de valsa de serenata…
Às vezes passava um cavaleiro
levantando novelos de poeira
para espanto de pardais distraídos
ou um caminhão carregado de toras
trincando o silêncio da avenida
Mas as batidas reiteradas do martelo
martelavam minha angústia de viver
no abismo daquela solidão…
Longe muito longe dos anúncios luminosos
que ornavam as noites de boemia
da cidade grande eu carpia
minhas tristezas pungentes e teimosas
E como doía!
Pois até hoje ainda bate forte
na veneziana de minhas lembranças
o martelo que ficou tão longe…
31/10/2017