304 pessoas cumprem penas alternativas





Amanda Mageste

Célia e Kelly acreditam que a CPMA é de extrema importância para prestadores e sociedade

 

A CPMA (Central de Penas e Medidas Alternativas), órgão da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária, já atendeu 1.152 infratores desde 2010, quando foi inaugurada na cidade, segundo a assistente social Kelly Bárbara Moreira Gonçalves.

Atualmente, a CPMA conta com 304 prestadores de serviço cumprindo pena na cidade. Desses, 146 cumprem penas e 158, medidas, que são derivadas de crimes mais leves.

O programa de penas e medidas alternativas abrange, além de Tatuí, as cidades de Cesário Lange, Capela do Alto e Quadra.

A CPMA foi instalada na cidade por iniciativa do juiz de direito Marcelo Nalesso Salmaso. “Ao longo de anos na magistratura, fui percebendo que os processos criminais só estavam aumentando, e, cada vez mais, as pessoas estavam entrando no mundo do crime. Os juízes, assim como eu, estavam condenando cada vez mais e, às vezes, aumentando as penas”.

Pensando nisso, Salmaso buscou trazer a CPMA para minimizar a situação. Segundo ele, foi uma “batalha” de um ano, em parceria com a Prefeitura, de um ano, junto à Secretaria de Administração Penitenciária, até que a unidade local fosse concretizada.

A CPMA busca a ressocialização do apenado, a partir de uma condenação seguindo o cumprimento de prestação de serviço à comunidade, e não no cárcere.

Salmaso disse que pessoas que cumprem penas carcerárias têm mais reincidências do que aquelas que prestam serviço. “Hoje, nós temos dados estatísticos que demonstram que o índice de reincidência no cárcere gira em torno de 70% a 80%”.

De acordo com o juiz, o Brasil é um dos países com a maior população carcerária do mundo, o que, segundo ele, mostra que o sistema punitivo não traz as respostas que a sociedade espera, que é impedir que as pessoas entrem no mundo do crime ou que as pessoas que cumprem penas não voltem a cometer delitos.

Kelly argumentou que a CPMA trouxe benefícios à cidade e que a reincidência de crimes, por pessoas que prestam serviços à comunidade como condenação, é de, aproximadamente, 5,5%.

A unidade local atende uma média de 30 pessoas por mês, em sua grande maioria homens. Há 57 entidades cadastradas para a distribuição dos beneficiários.

“Com relação às entidades que são conectadas à CPMA, nós fazemos reuniões para que não recebam essas pessoas como criminosos, com esse estigma. Pelo contrário, que reconheçam essas pessoas pelo bom trabalho que estão fazendo”, ressaltou Salmaso.

Ele afirmou, também, que os prestadores de serviço entram em contato com muitas realidades difíceis, de pessoas que são atendidas pelas entidades e começam a entender o sofrimento delas.

“Muitas vezes, aquela pessoa que comete o delito acha que é a grande vítima do mundo, e começa a ver que há outras pessoas que sofrem também. Então, ele começa se sentir útil por fazer algo, e, talvez, seja a primeira vez na vida que essa pessoa não é reconhecida como um transgressor, alguém violento, o que traz bons efeitos na central”, afirmou Salmaso.

O juiz argumentou que, com essa alternativa de penas, os prestadores conseguem enxergar outras possibilidades que não o crime.

Kelly explicou que a CPMA administra as penas e medidas alternativas do Poder Judiciário. “A gente encaminha e orienta, de acordo com o perfil de cada um”.

As penas variam de um mês a quatro anos. Há penas da Vara da Execução Criminal, que podem chegar aos quatro anos, e medidas alternativas e do Juizado Especial Criminal, que chegam a dois anos de prestação de serviço à comunidade.

As medidas alternativas são para pessoas que não foram condenadas por crime à pena privativa de liberdade e que não foram beneficiadas anteriormente por um período de cinco anos.

Penas alternativas são destinadas aos que cometeram crime sem violência, ou grave ameaça a pessoas, e que não tenham reincidido em crime doloso.

O tempo de prestação de serviços é definido pelo Judiciário. Os prestadores já chegam à CPMA com o tempo e dias de semana estipulados, os quais não podem interferir no horário de trabalho deles, caso estejam empregados.

O encaminhamento às entidades da cidade é função da CPMA. “A gente faz uma entrevista psicossocial e, de acordo com o perfil deles, encaminha para entidade que combine com os requisitos”, ressaltou Kelly.

Os prestadores fazem serviços gerais, de acordo com a aptidão deles, pois pessoas de diferentes áreas profissionais são destinadas a cumprir penas.

“A gente sempre tenta usar a habilidade deles para fazer com que sejam úteis para a entidade que foram destinados, não colocamos em qualquer área”, ressaltou Kelly.

A CPMA não trabalha com menores infratores, somente com pessoas acima de 18 anos, sendo que não há idade máxima. “Nós tivemos, inclusive, um senhor que não conseguiu cumprir a pena, porque era bem idoso e tinha bastante problema de saúde. Então, tivemos que devolver ao Judiciário”, contou Kelly.

A assistente social informou que, na cidade, não há muitos problemas referentes à falta de comprometimento de prestadores. De acordo com ela, 95% deles cumprem as penas corretamente.

Prestadores que não cumprem as determinações são devolvidos ao Judiciário, para decidir-se o que será feito com eles.

Se houver problemas que não sejam “sérios”, os membros da CPMA procuram conversar com os prestadores e tentar fazê-los entender que, se voltarem ao Judiciário, as consequências serão maiores do que a prestação de serviço à comunidade.

Kelly contou que membros da CPMA fazem visitas surpresas nas 57 entidades para fiscalizar como anda o cumprimento de penas e olhar as folhas de frequência.

Os prestadores não podem faltar das atividades sem justificativa. Mesmo quando há justificativas, as faltas não são abonadas, mas repostas em outras datas. Se a pessoa foi destinada a cumprir um determinado número de horas, não pode diminuir, mesmo que se prolongue o tempo na entidade.

Para Kelly, as penas alternativas só apresentam pontos positivos para a sociedade e às pessoas que cometeram pequenos delitos.

“Não consigo enxergar pontos negativos, porque ajuda as entidades, o próprio prestador aprende. Antigamente, as pessoas que cometiam delitos de menor potencial iam presas com criminosos mais violentos. Então, era uma oportunidade para elas entrarem nesse mundo”, ressaltou Kelly.

De acordo com a assistente social, a prestação de serviço é recomendada pela ONU (Organização das Nações Unidas) e aplicada mundialmente, trazendo bons resultados.

Kelly acredita que as atividades dos prestadores de serviço são importantes para a reintegração social, para fortalecer os vínculos familiares e uma forma de eles refletirem sobre as atitudes que os fizeram cumprir a pena.

“Nas entidades, por exemplo, eles vão conhecer pessoas que, muitas vezes, têm problemas sérios, e eles acabam, de alguma maneira, se sentindo úteis para ajudar a sociedade, o que faz com que reflitam sobre os atos cometidos”, ressaltou.

Salmaso acrescentou que há pessoas que terminam o prazo de cumprimento da pena e continuam no local, como voluntários.

“Isso tem sido bastante comum. No momento, há entidades que não querem receber mais, porque saturou o número de voluntários, pois os prestadores acabam ficando muito tempo além do prazo determinado”, afirmou Salmaso.

Lar São Vicente

Célia Holtz, segunda-secretária da diretoria do Lar São Vicente de Paulo, uma das entidades que recebem prestadores para serviços gerais, argumentou que a iniciativa é de extrema importância para o asilo, pois eles dão “uma força muito grande”.

“Tanto que cheguei aqui (CPMA) e já pedi mais prestadores, pois, no asilo, nós temos 90 internos. Então, é um trabalho intenso, o dia todo, com alimentação, lavanderia, deixar jardins, capela, limpos e em ordem”, explicou Célia.

No Lar, há, no momento, oito prestadores de serviço, mas, no ano passado, os encaminhados chegaram a 14. Célia disse que, quando eles chegam ao asilo, ela faz uma entrevista inicial e mostra as possibilidades de trabalhos dentro da entidade.

“Pode ser na horta, varrendo o Lar, ajudando na parte da lavanderia, cozinha, bazar, no que for necessário. A única coisa que os prestadores não fazem é tomar conta dos idosos, pois há pessoas específicas que fazem isso”, ressaltou Célia.

O asilo recebe prestadores desde 2010, e, de acordo com Célia, não houve casos de problemas sérios com prestadores. Pelo contrário: ela garantiu que muitas pessoas “interessantes” passaram pelo local.

Célia contou que houve poucas “devoluções” de prestadores – no máximo, cinco, que “não deram certo” no Lar.

“A pessoa começou a faltar muito, não se encaixou dentro das atividades que precisavam ser desenvolvidas, ou arrumou emprego e não conseguiu mais executar as atividades no horário combinado”, explicou Célia.

Kelly esclareceu que os prestadores devolvidos à CPMA por instituições recebem outra oportunidade de integração em outro local, pois é direito deles. Se não se adaptaram a determinada entidade, poderão tentar em outro lugar, para uma readaptação.

Célia disse que o caso de um homem “marcou-a”, pois, quando acabou a pena, ele foi se despedir dela e, até, se emocionou, dizendo que se sentia muito feliz pelo trabalho desenvolvido, que nunca pensara que seria tão respeitado e útil em um lugar e que isso o fizera pensar muito a respeito do que havia feito.

De acordo com Célia, ela faz questão de não saber o que a pessoa fez para precisar prestar serviços. “Para mim, independe o motivo de eles estarem cumprindo pena. Isso, inclusive, é uma orientação da própria central”.

Ela disse que orienta todos os voluntários e servidores do asilo a não questionarem o motivo de os prestadores estarem lá, “pois isso não é necessário, o importante é que cumpram as funções e horários que foram destinados a eles”.

De acordo com Kelly, as entidades podem colocar restrições quanto a tipos de delitos que elas não gostariam de receber.