Cadastro de violência doméstica cresce 313% em Tatuí em 1 ano

Atendidos pelo programa "Patrulha da Paz" vai de 53 para 219

Da esquerda para direita: GCM Rafael da Silva Paixão, comandante Vanderlei dos Passos e GCM Érica Rocha (foto: Diléa Silva)
Da reportagem

O número de vítimas de violência doméstica atendidas em Tatuí pelo programa Patrulha da Paz, mantido pela Guarda Civil Municipal em parceria com o Núcleo de Justiça Restaurativa, por meio de convênio com a prefeitura, cresceu mais de quatro vezes em um ano.

Conforme levantamento da GCM, em janeiro do ano passado, o cadastro das vítimas socorridas pela patrulha, especializada no atendimento e na proteção das vítimas de violência doméstica, contava com 53 mulheres; já no primeiro mês deste ano, o número chegou a 219.

Atualmente, além de mulheres que sofreram agressões ou se sentem ameaçadas pelos companheiros em relacionamentos heterossexuais, também estão cadastradas crianças vítimas de abuso, idosos vítimas de violência física no âmbito doméstico e casais homossexuais.

O crescimento dos atendimentos pelo programa, em um ano, corresponde a um salto de 313%. Contudo, o comandante da GCM, Vanderlei dos Passos, pondera que o índice não representa aumento no número de casos de violência.

Para ele, a partir do surgimento do programa Patrulha da Paz, as vítimas de violência doméstica foram encorajadas a denunciar os agressores em casos que, muitas vezes, já vinham acontecendo.

“Com a Patrulha da Paz, temos um cadastro e, consequentemente, há mais casos sendo acompanhados. Isso não quer dizer que houve aumento da violência; pelo contrário, mostra que aumentou o acompanhamento das vítimas”, afirmou o comandante.

O programa foi lançado em fevereiro de 2020, contudo, devido à pandemia, o início do cadastro das vítimas atrasou e a GCM precisou replanejar as ações junto com a Justiça Restaurativa, começando o trabalho em junho de 2020.

Passos ressaltou que a Patrulha da Paz conta com rondas específicas, além de suporte aos programas sociais já existentes no Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), na Justiça Restaurativa, na Polícia Civil e no CMDM (Conselho Municipal dos Direitos da Mulher).

Conforme o comandante, todas as famílias cadastradas no programa estão recebendo visita de viaturas do programa e são assistidas por uma equipe especializada, por meio do Núcleo de Justiça Restaurativa.

Com o programa, a partir das notificações de violência junto ao Judiciário e da emissão das medidas protetivas, é feito um cadastro da vítima e do agressor, e os guardas que atuam na patrulha passam a fiscalizar eventuais descumprimentos das ordens expedidas.

Entre as principais medidas protetivas urgentes estabelecidas pela Lei Maria da Penha, estão o afastamento do agressor do lar ou local de convivência com a vítima e as proibições de contato e aproximação entre vítima e agressor.

Passos apontou que todas as vítimas atendidas pelo programa ainda contam com o auxílio do aplicativo chamado “Botão do Pânico” – ferramenta que também faz parte do atendimento especializado às vítimas de violência doméstica.

A ferramenta é instalada no celular da vítima e, caso o agressor não mantenha a distância mínima garantida pela Lei Maria da Penha ou a pessoa se sinta ameaçada, ela pode acionar a GCM por meio do dispositivo.

Para usar o aplicativo, a interessada deve fazer cadastro por meio do atendimento da Justiça Restaurativa. A GCM é responsável pela instalação do aplicativo no dispositivo da vítima e, com isso, a ferramenta passa a fornecer informações à Patrulha da Paz.

O Botão de Pânico gera automaticamente uma ocorrência de risco à integridade física, pelos centros de operações da GCM. O atendimento é priorizado e a viatura utiliza as coordenadas geográficas da pessoa – entre outros dados do cadastro – para encaminhar a equipe policial mais próxima.

“A vítima aperta o botão e, imediatamente, aciona a GCM. Como os agentes já têm todos os dados em mãos, a viatura chega muito mais rápido no local da ocorrência, o que facilita muito o trabalho da Patrulha e dá mais segurança à vítima”, explicou o comandante.

De acordo com a guarda civil Érica Renata Vieira da Rocha (desenvolvedora do Botão do Pânico), tanto a visita das viaturas do programa quanto o uso do aplicativo devem ser consentidos pelas vítimas para que a GCM possa atuar.

Ela explicou que, além de contar com o dispositivo de acionamento da viatura do programa para os casos de emergências, as vítimas cadastradas também recebem, em média, duas visitas semanais da equipe, composta por uma GCM feminina e um GCM masculino.

Segundo Érica, somente no ano passado, os acionamentos do Botão do Pânico e os atendimentos diários realizados pela equipe resultaram em 71 ocorrências e 52 prisões por descumprimento de medida protetiva e outras situações de crime.

Érica disse estar satisfeita com o resultado do programa. Ela classificou a Patrulha da Paz como um “divisor de águas” para o atendimento à vítima de violência doméstica e apontou que o índice de reincidência da violência entre os assistidos pelo programa é de quase zero.

“Hoje, podemos dizer que ter um acompanhamento do caso com a presença e a proximidade da GCM ajudou a reduzir os casos de violência. Todas as pessoas atendidas pelo programa relatam se sentir mais seguras. Além disso, raras vezes vimos a violência se repetir nas casas das pessoas já atendidas pelo programa”, afirmou a GCM.

Tanto a vítima que recebe a medida protetiva quanto aquela que tem um processo contra o agressor, mas ainda sem a medida, são intimadas e comunicadas pelo Ministério Público e pelas varas criminais para que compareçam no Núcleo de Justiça Restaurativa.

Conforme Érica, a partir deste mês de março, todos os dias, um membro da Patrulha da Paz está na sede do serviço judicial para o acolhimento da vítima, explicando como funciona o Botão do Pânico e acertando como serão realizadas as visitas do programa – até então, as vítimas eram atendidas no NJR em dias específicos.

Para ser atendida pelo programa, existem dois caminhos: o formal, por meio de encaminhamento da Justiça, e o informal, das mulheres vítimas que se sentem ameaçadas ou foram agredidas e querem a proteção, mas não a denúncia formal.

Para ser cadastrada no programa, basta entrar em contato com a Justiça Restaurativa pelo (15) 99629-8316. O número é exclusivo ao atendimento de mulheres vítimas de violência doméstica. Ou, ainda, pelos telefones da GCM: 199 e 153.

Também é possível procurar o Núcleo de Justiça Restaurativa às quartas-feiras e sextas-feiras, das 9h às 17h, para atendimento presencial, à praça Paulo Setúbal, 71, centro, preferencialmente com atendimento agendado.

Érica também ressaltou como um diferencial do programa a prestação de atendimento psicológico e apoio aos agressores, principalmente, em caso de usuários de drogas e dependentes do álcool.

“O nosso objetivo é fazer com as pessoas consigam ter um convívio saudável e sem violência. Nosso primeiro foco é na vítima, mas também procuramos entrar em contato com o agressor e oferecer apoio. Em alguns casos em que já foi dado apoio ao agressor, não houve mais violência”, acentuou o GCM.

Segundo Érica, a NJR também deve iniciar, em março, uma roda de conversas. A ação estava prevista para ocorrer deste o lançamento do programa e acabou adiada devido à pandemia.

“A maioria dos casos de brigas envolve a falta do diálogo, então, essas rodas de conversas fazem muita diferença. Até porque, muitas vezes, o agressor já tem filhos com a vítima e outros vínculos que continuam, mesmo após o fim de um relacionamento, e é necessário haver entendimento entre as pessoas”, exemplificou a GCM.

O GCM Rafael da Silva Paixão também atua na viatura do programa e ressalta a importância da Patrulha da Paz para o enfrentamento à violência doméstica no município, salientando que poucas cidades contam com programas desse tipo.

Para o GCM, o programa acaba incentivando a denúncia e as visitas inibem outras violências. Ele disse acreditar que, se não fossem as visitas, os números da violência poderiam ter sido maiores neste ano.

As viaturas da Patrulha trabalham das 7h até a 1h. Segundo o comandante, o horário foi definido por meio de estudos que apontaram os horários de maior incidência de violência envolvendo famílias e mulheres. O trabalho usou estatísticas da Polícia Militar, da Polícia Civil e da GCM.

Passos enfatizou que o horário seletivo serve apenas para as viaturas caracterizadas da Patrulha da Paz. Contudo, fora desse período, as mulheres continuam amparas por toda a estrutura operacional da GCM, que funciona 24 horas por dia.

“O aplicativo também funciona 24 horas, então, em caso de acionamento do Botão de Pânico fora do horário de operação da Patrulha da Paz, nós continuaremos dando apoio às vítimas independente do horário”, concluiu o comandante.

Números da violência

As denúncias de violência doméstica apresentaram queda em Tatuí no primeiro mês deste ano na comparação com o mesmo período de 2021. Os dados são do relatório mais recente da SSP (Secretaria de Segurança Pública do estado de São Paulo) envolvendo esse tipo de crime.

De acordo com as estatísticas divulgadas pelo órgão de segurança, a DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) local instaurou 23 inquéritos por violência doméstica em janeiro deste ano. Em 2021, foram 35 denúncias, o que representa redução de 34,28%.

Já o número de flagrantes ficou estável no período, com quatro ocorrências no ano passado e outras quatro em janeiro deste ano. O mesmo aconteceu com o número de prisões efetuadas, com quatro em 2021 e quatro em 2022.