Sem rodeios ou frescura – colocando a situação de maneira muito clara: em janeiro deste ano, além de surpreendente, foi aterrorizante o resultado de enquete promovida pelo jornal O Progresso (entre os dias 9 e 15), a qual questionava sobre a intenção de se vacinar por parte dos tatuianos.
Naquela oportunidade, apenas 67% dos participantes responderam ter interesse em vacinar-se. A se ponderar o fato de que, para o alcance da chamada “imunidade de rebanho”, é necessária a vacinação de pelo menos 70% da população, a conclusão, pura e simples, é a de que a pandemia nunca teria fim.
Por mais incoerente seja a realidade de que somente a vacina pode garantir o retorno de uma rotina de vida “bem parecida” com a interior (dado nunca mais ser possível a “normal” novamente), havia, então, forte resistência à imunização.
A contradição é tão difícil de ser elucidada quanto a indisposição de parte dos empreendedores com relação às restrições das atividades comerciais e de serviços.
Isto porque, a se observar as partes do mundo com maior sucesso no combate à pandemia e onde a realidade já está voltando ao “menos anormal”, não se vai encontrar um único país onde não ocorreu lockdown “de verdade”.
Nesses locais, como Japão e Nova Zelândia, por exemplo, a receita para minimizar e, assim, “abreviar” o caos criado pela Covid-19 consistiu em um remédio bem mais amargo que este “abre e fecha” chocho do Brasil.
Esse remédio tem na bula, além do uso obrigatório de máscara e higienização “obsessiva”, um contundente isolamento social.
Agora, quando o Brasil ainda segue também sofrendo na área econômica, esses locais provaram estar certos e nós, para variar, errados – ou seja, de que mais vale o remédio doído para curar logo o doente que sustentar a enfermidade por tempo indefinido com chazinhos insossos de sumiço de gente – senão com a já tão mítica quanto ineficaz cloroquina.
Mas, por qual motivo tanta gente com condições de bem se informar – porque tem dinheiro para buscar informação de confiança, longe da porcariada de rede social -, se deixou levar pela mentira de que o isolamento só atrapalha? (Embora seja ruim mesmo, como qualquer medicamento).
Por que não reconheceram que o remédio indigesto do lockdown, na verdade, é necessário para derrotar a doença mais “rapidamente” e, assim, também curar a economia em menos tempo e de maneira mais concreta?
O negacionismo não tem sentido, salvo se as convicções políticas extremistas pesarem mais que a empatia pelo semelhante, mais até que a vida dos “outros”, desde que esses sejam de “outras famílias”, de “outros grupos”, gente “desconhecida”.
Por tudo isso, francamente, foi assustador o resultado daquela enquete, pela qual seria coerente supor que mais de três a cada dez tatuianos encontravam-se absolutamente alienados ou, pior, nada sensibilizados com a dor e eventual morte alheia.
Dois meses depois, contudo, quando a vacinação ganhava o país – apesar da velocidade muito aquém da ideal -, a opinião dos tatuianos já demonstrava mudança, dessa vez no sentido da coerência – e da esperança, vale ressaltar!
Naquele momento, por meio de outra enquete, que repetiu a mesma pergunta, realizada entre os dias 6 e 12 de março, foi possível certo otimismo, dado o fato de que, em apenas dois meses, o interesse pela vacinação em Tatuí atingiu cerca de 80%, partindo daqueles 67%.
Na semana seguinte, entre os dias 13 e 19 de março, o jornal insistiu em questionamento correlato, tendo como tema na pesquisa o “medo” da falta de vagas em UTI.
Como resultado, 90% dos participantes assinalaram temer precisarem de atendimento na UTI pública e não o conseguirem – cientes, portanto, acerca da possibilidade, trágica, de irem a óbito por falta de vaga em tratamento adequado.
A ocupação dos leitos de UTI da Santa Casa, destinados aos pacientes com Covid-19 ou suspeita da doença, seguem em 100% desde o dia 3 de março, aliás.
Percentualmente: na enquete anterior, 23% haviam respondido que não pretendiam se vacinar e, em seguida, 90% indicaram ter medo de dar com a porta da UTI na cara…
Daí decorre a conclusão de que, mesmo quem segue a política do “dou um tiro na sua fuça se você não concordar comigo em tudo”, quando diante da possibilidade da “própria” morte, já escorrega em contradição.
De certa forma, evidenciam mais um aspecto bem característico da atualidade: o de que parte da população (reitere-se, “parte”) dispõe-se a comprar armas e até a matar por um projeto de poder antidemocrático, mas, por outro lado, não quer se arriscar a morrer, não!
Outro ponto muito interessante, no momento, envolve justamente esse grupo de cidadãos extremistas, cujo contingente demonstra sensível debandada.
A afirmação também se baseia na enquete semanal deste jornal, cujo tema da semana, entre os dias 30 de abril e 7 de maio, buscou saber a opinião dos tatuianos sobre quem mais está obtendo sucesso no combate à pandemia.
Como opções, estiveram presentes: os profissionais da Saúde, o governo federal, o governo do estado e o governo municipal. O resultado – em mais um motivo de esperança e com cabal justiça – indicou o reconhecimento dos tatuianos pelos profissionais de saúde como os mais bem-sucedidos na luta contra a Covid-19.
Claro, propositadamente, a pesquisa “misturou” política com serviço de saúde pública, mais essencial neste momento.
Contudo, essa aparente “mistura” indevida, na verdade, é fundamental, exatamente porque as políticas públicas também são diretamente responsáveis pelo curso da pandemia – embora mais pela morte que pela vida.
Muito motivador, pois, que mais da metade dos tatuianos tenha indicado os profissionais de saúde como os mais eficazes, somando 52% das respostas. “Quase” tão expressivo quanto – com sinal trocado, entretanto – foi a soma dos votos ao governo federal, que atingiu 26%.
Levando-se em conta a votação em torno de 80% conquistada pela tendência autoritária nas eleições de 2018 em Tatuí, pode-se concluir que, em paralelo à pandemia, outra grande enfermidade, a do extremismo, está perdendo força em sua contaminação.
O remédio contra ela, além da confiança na ciência, soma um coquetel de virtudes, entre as quais, sensibilidade, empatia, humanidade e, sobretudo, fé nos verdadeiros preceitos cristãos – invariavelmente comprometidos com a vida, jamais com a morte.