Rir é o melhor remédio





Há dias em que algumas conversas servem para afastar qualquer nuvem que tenta obscurecer o humor. No entardecer, estava sozinho no bulevar, sentado em uma mesa do Café Canção, quando vi chegando por ali o José Reinaldo Pedroso de Mello, acompanhado, como sempre, pela sua famosa cachorrinha.

– Epa! Famosa por quê? – alguém pode perguntar.

A cadelinha tem verdadeira aversão pela palavra “Lula”, ficando enfurecida ao ouvi-la, a ponto de investir contra alguém quando dizem: “Esse é o Lula!”. Famosa, pois já apareceu até na TV.

Mas, é muito dócil. O animalzinho tem verdadeira adoração pelo Reinaldo. Companheira nas 24 horas do dia. Certa ocasião, ele comentou com umas moças que, se encontrasse uma mulher que gostasse tanto dele quanto a cachorrinha gosta, ele se casaria novamente.

– Então, pode esquecer! – as moças, rindo, sentenciaram.

Logo, chegaram mais alguns amigos e, claro, a conversa levou a diversos assuntos. O riso corria solto, cada um contando um caso, sempre dando destaque para as situações mais engraçadas. Só que, dessa vez, Reinaldo superou a todos.

Como ele é um homem livre e desimpedido, para não ficar sozinho, costuma namorar. Nada sério, apenas uma companheira para conversar, passear, almoçar ou jantar juntos, sem mais compromissos. Contou, então, uma passagem que ocorreu com uma dessas suas amigas, sem citar nomes, claro:

– Ela era bonita, mas meio bobinha. – contou. – Fomos um dia no shopping em Sorocaba e, na entrada, ao passar na cancela automática, quando a voz feminina computadorizada informou para apertar um botão e pegar o cartão, ao encerrar as instruções com um cumprimento, a minha amiga respondeu o cumprimento à cancela. Por brincadeira, disse-lhe que devia ser difícil para a moça da cancela ficar o dia todo repetindo a mesma coisa para todos os carros. Pois sabem o que ela respondeu?

– O pior é ficar um tempão dentro dessa caixa neste sol quente! – acreditando que havia alguém dentro da cancela.

Mas, a coisa não ficou apenas nisso. Em um final de semana, a moça dormiu em sua casa. No dia seguinte, Reinaldo tomou o café da manhã e sentou-se ao computador, pesquisando notícias na internet. A moça, prestativa, ficou na cozinha, lavando toda a louça.

– Ela caprichou – Reinaldo contou. Lavou toda a louça, limpou o fogão e enxugou a pia. Para completar, passou pano no chão da cozinha e ainda arrumou algumas coisas que estavam fora do lugar. Muito prestimosa! – comentou.

– Mas, olhando na lixeira, vi três copos jogados. Daqueles de requeijão. Perguntei se estavam quebrados. Sabem o que ela respondeu?

– Ah, Reinaldo, eu joguei esses porque estavam com a data vencida há um tempão! – explicou, pegando um dos copos e mostrando o seu fundo, onde estava marcada a validade do requeijão que um dia havia ocupado o copo.

A conversa continuou. Reinaldo contou que sua avó era prima de Bimbo Azevedo, mas, devido a um desentendimento familiar, as famílias estavam afastadas. Ele, porém, procurou contato com o Bimbo e acabou fazendo que a amizade entre eles fosse reatada.

Como estudava piano, passava sempre na casa do Bimbo para conversar e tocar, acompanhado pelo sempre presente violino dele. Quase todos os dias, pouco depois do almoço, em uma folga do horário das aulas do “Barão de Suruí”, ele dava uma passadinha por lá. Na maior parte das vezes, quem o atendia à porta era dona Julieta, esposa do Bimbo.

Em certa ocasião, ela, preocupada, chamou-o reservadamente para um comentário:

– Acho que o Bimbo está esclerosado. – disse dona Julieta. – Ele está apaixonado por uma moça que mora aqui perto – explicou. – Fez até uma valsa com o nome dela! – completou.

Reinaldo, curioso, perguntou quem era a tal moça.

– Ela mora em um sobrado aqui nesta rua mesmo. É a Marisa de Lima – contou dona Julieta.

– Ah, mas, então, ele não está caducando, dona Julieta. Quase todos os rapazes da cidade também estão apaixonados pela Marisa! – Reinaldo explicou.

Todos sabem que o seu Bimbo buscava sempre uma musa para se inspirar na composição de suas valsas.

Vi, um dia destes, uma foto do coral de estudantes do “Barão de Suruí” cantando, acompanhados pela orquestra do Conservatório, regida pelo maestro Spartaco Rossi.

Nessa foto, tirada no São Pio X, aparece Bimbo Azevedo tocando seu violino. Coincidentemente, o Reinaldo Pedroso havia contado mais uma passagem envolvendo o Bimbo, que deu vida a essa foto. O caso é o seguinte:

Os músicos, no meio de uma orquestra, muitas vezes, “pulam” algumas notas, simplificando sua execução, de uma maneira que quase ninguém percebe. Mas, Spartaco Rossi, com seu ouvido musical afinadíssimo, percebia na hora.

Então, em um ensaio, que talvez possa ter sido para a apresentação registrada nessa foto, o maestro chamou a atenção de todos os músicos, exigindo que tocassem todas as notas, sem simplificar a melodia. Foi enérgico nessa ordem.

Pois bem, todos tocaram direitinho e, ao final, depois dos gestos do maestro encerrando a execução da melodia, todos pararam de tocar, mas Bimbo, sozinho, tirou mais algumas notas de seu violino, chamando a atenção de todos. Antes que Spartaco Rossi chamasse sua atenção, Bimbo, rindo, explicou:

– Se tocar todas as notas fica bom, tocar umas notas a mais pode ficar melhor ainda! – rematou, arrancando risos de todos os presentes.