Remédio que não tem gosto amargo

Sempre haverá quem prefira resolver os problemas na base da violência, da cisão, da ostensividade unilateral, de tudo isso nada a ver com conciliação, harmonia, pluralidade, paz e igualdade de direitos – virtudes somente afeitas à democracia.

Por ora, contudo, vez que o clima de terror arrefeceu consideravelmente (já estando difícil negar ser menos ruim viver em paz que em conflito constante), a maior preocupação já não é mais se o país seguirá tendo eleições ou se parentes, amigos, colegas de trabalho ou vizinhos vão se socializar com navalhas ou tiros na cara.

A atenção precisa se focar em sequelas da desagregação, as quais ainda podem custar muito caro – inclusive, vidas. Entre as mais profundas infecções sociais, ainda contaminadas pelo extremismo, está o negacionismo quanto à vacinação.

Na semana passada, o jornal O Progresso de Tatuí publicou reportagem pautando essa realidade, a qual não atinge só a cidade, prejudicando todo o país.

A publicação lembrou que, em 1973, o Brasil deu grande passo no âmbito da saúde pública. Por determinação do Ministério da Saúde, foi criado o Programa Nacional de Imunizações (PNI), visando coordenar, padronizar e sistematizar as ações em vacinação em todo o território nacional.

Portanto, o programa chega aos exatos 50 anos em 2023, porém, sem ter muito a comemorar. Isso porque o PNI tem apresentado sistemática queda no Brasil, impondo iminente tarefa à Saúde pública.

Segundo a diretora da Vigilância em Saúde local, Rosana Oliveira, o grande desafio, atualmente, é aumentar a adesão ao PNI. Desde 2017, houve uma baixa na procura dos imunizantes, ela enfatiza.

“A população talvez ignore que a grande maioria das doenças contagiosas é ‘imunoprevenível’, ou seja, podem ser evitadas através das vacinas que o SUS oferece gratuitamente e em muitos locais de fácil acesso à população”, afirma.

De acordo com ela, o cenário tatuiano do momento “visa envolver a população numa intensa conscientização da necessidade da vacinação não só para as crianças, assim como adolescentes, adultos, idosos, gestantes e profissionais de diversos segmentos”.
Rosana conta que, na época do lançamento do PNI, o Brasil recebeu a certificação internacional de erradicação da varíola. E, há 50 anos, o PNI cumpre a ambiciosa missão de vacinar uma enorme população dispersa em um território continental como o do Brasil, profundamente marcado pela diversidade de culturas, cenários e desigualdade de condições de vida.

Apesar de ser considerado o maior programa de vacinação público e gratuito do mundo, com 20 vacinas que eliminaram doenças importantes como a poliomielite, o tétano neonatal e a rubéola congênita, o programa completa meio século de vida “lutando para reverter retrocessos que levaram as coberturas vacinais de volta aos níveis dos anos de 1980”.

Pesquisadores veem com otimismo o novo momento vivido pelo programa, mas apontam que há um longo caminho a ser percorrido.

“O PNI é uma das únicas políticas governamentais que nunca foi mudada ou tiradas as suas funções, pelo excelente funcionamento e desempenho. É parte fundamental do SUS e estabelecido pela Constituição de 1988”, informa a diretora.

Além da prevenção de doenças, o PNI contribuiu fortemente para o avanço do sistema de vigilância epidemiológica, exigindo, assim, um controle de qualidade das vacinas oferecidas pelo SUS.

De acordo com Rosana, Tatuí sempre esteve ativa, junto ao PNI, tanto na vacinação de rotina oferecida pelas unidades básicas como em outras ações.

Ela cita, como exemplos, campanhas periódicas de multivacinação para crianças e adolescentes, campanhas de sarampo com mobilização geral e vacinação nas residências, verificação de carteirinhas das crianças de todas as creches, assim como a vacinação contra a pólio para crianças em atraso na própria creche.

A diretora ainda lista a vacinação contra o vírus Influenza nas unidades, domicílios, praças e pontos estratégicos, a aplicação contra a meningite para trabalhadores da Educação e da Saúde e a vacina Influenza para empresas.

“No caso específico da vacina Influenza, no início da pandemia de Covid, ela foi administrada casa a casa por um grande mutirão de profissionais da Saúde”, lembra.

“Nessa mesma época, Tatuí recebeu a primeira remessa da vacina contra o novo coronavírus. Começamos com os grupos de risco e, depois, fomos para a população em geral, nos polos montados, atendendo a população em horários estendidos”, enumera.

“Essa batalha continua, pois a vacinação contra a Covid nunca parou; está disponível em todas as unidades de saúde urbanas e nas duas unidades rurais em nosso município”, informa.

“A Secretaria de Saúde, em parceria com a Vigilância Epidemiológica, mantém intensa atividade junto às unidades básicas e salas de vacina para o seguro atendimento de nossa população”, reforça a profissional.

“Aguardamos, num futuro bem próximo, novas ações que estão propostas pelo Ministério da Saúde, dando continuidade nas atividades de vacinação de alta qualidade”, finaliza ela.

O desafio das autoridades públicas é claro e vultuoso, mas, ainda que enfrentado com contundência e da melhor forma possível, depende do grau de conscientização das pessoas para surtir o efeito necessário.

Depende, basicamente, dos pacientes. Remédio para isto existe faz tempo: informação correta, cujo efeito colateral é diminuir a contaminação pelos sectarismos nos cérebros.

Pelo bem de todos – da saúde, da paz, de um futuro menos inóspito –, resta esperar que este santo remédio, a lucidez dos fatos, retome seu justo lugar, predominando, feito um princípio ativo básico, nas receitas do chamado debate público.