Luis Antonio Voss Campos
A vida no interior nos reserva momentos e uma proximidade com pessoas que, mesmo não sendo aqui nascidas, nos encontramos sempre, nos cumprimentamos sempre, e isso nos faz conhecermos e sermos conhecidos por pessoas que para cá vêm e vieram nas idas e vindas do mundo. Passam a viver entre nós, e vai surgindo um entrelaçamento de amizades e trocas de experiências e culturas.
Em cada profissão, em cada função, temos amigos que, pela seriedade com que trabalham, pela honestidade, pelo cuidado em todos os setores, conseguem seu lugar ao sol, e são bem aceitos por todos.
Neste texto de hoje, vou falar sobre um senhor que veio com a família nos anos 70 para Tatuí. Seu nome é Antonino Orso, porém, com esse nome ou sobrenome, poucos ou quase ninguém o conhece. Mas, se falarmos no Orsi Relojoeiro, aí a coisa muda de figura. Fui conversar com ele e saber um pouco da sua história, que tem curiosidades incríveis.
Ele nasceu em Tietê, na zona rural, no bairro São Joãozinho, em 5 de agosto de 1939, filho do senhor Antonino Orso e da senhora Elisa De Lucca Orso. Quando criança, começou a estudar e, quando estava no 4º ano do Grupo Escolar, após as aulas, ia aprender com o irmão José Orso a mexer e entender o universo mágico das peças minúsculas que compõem um relógio.
Em 1971, veio com a família para a nossa cidade, onde montou uma relojoaria bem no centro da Praça da Matriz. Já está nessa profissão há 60 anos e há 49 anos em nossa cidade.
É casado com a senhora Nadir Maria, com quem tem os filhos: Antonino Orso Filho “Tony”, que já trabalha com ele há 21 anos; o Fabiano e a Luciana, que foi quem descobriu que a ortografia do sobrenome estava errada.
Isso porque, em 1998, quando estava acertando a documentação para retirar o passaporte internacional para ir para à Inglaterra, e ainda requeria a cidadania italiana, descobriu que o sobrenome Orsi estava errado e que o correto seria Orso! Seu pai havia registrado no Cartório Civil de forma errada lá em Tietê, e aí o que fazer?
Então, tiveram que alterar todos os documentos, de Orsi para Orso!!! Nossa conversa foi muito animada e, quando falei dos relógios de bolso Roskoff Patent, muito antigos, e que eu possuía alguns, seu “Orso” me falou que hoje ninguém mais usa esses relógios. São muito disputados pelos colecionadores, e existe um mercado forte entre eles. Também, contou-me que os relógios automáticos agora estão saindo de cena, pois a grande maioria está optando pelos relógios de pilhas.
Na oficina dele, é um constante o entra e sai de clientes com relógios para consertar ou, então, buscar os já consertados. Eu pergunto sobre o fluxo de pessoas ali, e ele me falou que ainda existe um mercado grande chamado de “barganha”, onde um mesmo relógio passa pelas mãos de vários vendedores e compradores, que fazem com que ainda os lendários Citizen, Seiko, Orient, Condor, Cyma Watch, entre outros, continuem em circulação.
Ali é um universo mágico e vemos, pelas paredes, uma grande quantidade de carrilhões, relógios de paredes, cucos, entre outros. Inclusive, o carrilhão que é, praticamente, parte da história da nossa família.
Agora está comigo, e quero confessar que, a cada badalada, remete-me a uma infância rica e sonhadora, ao lado dos meus irmãos e pais, na rua Santa Cruz. De repente, fiz uma pergunta sobre o golpe do “o senhor pode consertar e eu venho amanhã buscar!!!”.
Aí, nessa resposta, surge o “Tony”, que trabalha com o pai há 21 anos, que diz: “Às vezes, movidos pelo impulso, mandam consertar, mas acabam, durante o tempo do conserto, comprando um novo em suaves prestações. E os que não são retirados, decorrido um certo tempo, eles podem ser desmontados, para que pelos menos algumas peças possam ser reutilizadas”.
Uma outra curiosidade que me chamou a atenção foi que são eles que dão manutenção no relógio da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição.
“Sim, somos nós, e agora quem sobe lá é o Tony, e acerta tudo. Eles também foram automatizados e assim não se usa mais corda para dar as badaladas; também lá é tudo eletrônico”.
Pergunto a eles sobre os relógios mais caros do mundo, como Rolex, Bulova, entre outros. Existe alguma diferença nos mecanismos? O senhor Orso fala serem muito diferentes, mas que também já estão sendo fabricados à pilha.
Quando perguntei sobre a paciência para se consertar um relógio, o Tony falou: “Temos que ter paciência, pois senão o relógio ganha de nós… rsrsrs”.
O Tony disse que, a cada dia, são novos clientes e relógios das mais variadas nacionalidades e que os japoneses estão surpreendendo. Também comentou que, a cada conserto e entrega, eles veem o olhar de felicidade e satisfação dos clientes.
Bem, há 49 anos entre nós, pedi ao senhor Orso (risos …) que deixasse uma mensagem para os amigos e clientes. Ele falou: “Procuro sempre fazer o melhor, me sinto muito bem e sou muito bem tratado e respeitado nesta cidade. Já me considero um tatuiano”.
E, como diz o poeta e cantor Cazuza em uma das suas músicas: “O tempo não para…”.
Forte abraço a todos