‘Nós já não temos a quantidade de água que precisamos’, alerta CBH





A expansão habitacional – com novos prédios e loteamentos – e industrial – com a vinda de novas unidades fabris – é fator de comemoração e preocupação. Ao mesmo tempo em que garante crescimento ao município, ela vem acompanhada de demanda que só aumenta: o fornecimento de água potável.

Como todas as cidades do país que passam pelo mesmo processo, Tatuí vem experimentando os efeitos dessa necessidade. O município é um dos 34 que compõem o CBH-SMT (Comitê da Bacia Hidrográfica dos Rios Sorocaba e Médio Tietê) e deverá estar, em médio prazo, atingindo sua “cota limite”.

O alerta é do vice-presidente do comitê e presidente da Associação Ecológica Icatu, Wendell Rodrigues Wanderley. Conforme ele, a preocupação é que, se nada for feito, a bacia como um todo possa experimentar problemas de abastecimento.

Wanderley disse que o comitê já está discutindo essa possibilidade, uma vez que parte da bacia está em “estado de atenção de quantidade de água fornecida”. “Ainda não é crítico, mas nós já não temos a quantidade de água que precisamos”, afirmou.

A preocupação do CBH-SMT é com a demanda a ser apresentada por novos empreendimentos (imobiliários e industriais). Na bacia, de modo geral, não há casos críticos de falta de água, mas Wanderley explica que o consumo desenfreado – sem planejamento – pode representar risco real.

“Não estamos morrendo de sede, ainda, mas, para se entender, não sobra mais água na bacia. Já é esse o problema”, comentou o vice-presidente.

De acordo com ele, a situação torna-se mais alarmante por conta do crescimento de cidades como Sorocaba, por exemplo.

“Isso não é só aqui, ocorre no país inteiro, mas na nossa bacia em questão a história é o relatório de situação. No plano de bacia, já estamos com a luz amarela”.

O assunto é tão polêmico que o mesmo relatório de situação gerou embate entre o comitê e entidades como o Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) e a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

Elas contestaram as informações apresentadas pelo CBH-SMT na época da instalação da Toyota, em Sorocaba, uma vez que elas poderiam inviabilizar o empreendimento, por conta de exigências.

Wanderley afirmou que a meta do comitê não é impedir o crescimento dos municípios, e, sim, garantir que eles cresçam com planejamento.

O vice-presidente disse, também, que o CBH-SMT não está afirmando que faltará água, mas que essa é uma possibilidade real, já que a expansão gera necessidade.

Tatuí faz a captação de água do rio Sarapuí para garantir o abastecimento de 114.314 habitantes. O serviço é fornecido pela Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), órgão que realiza estudos de expansão.

A companhia também é consultada para viabilizar novos empreendimentos. O estudo realizado por ela pode permitir, ou não, que a cidade receba investimentos que representem demanda, como ocorre nos demais municípios.

As decisões dependem de cada caso. Em Cerquilho, por exemplo, Wanderley disse que é preciso cautela redobrada, já que a situação lá é preocupante.

“Só tem água do rio Sorocaba. Nessa época do ano, então, estamos enfrentando estiagem, tanto que tem uma área na frente da usina que chamamos de ‘quebra pé’, onde se pode atravessar o rio pisando em pedras. Então, fazer um parque industrial lá precisa de cuidados, de avaliação”.

Em função disso, o comitê tem repercutido o princípio da “lei de cobrança pelo uso da água”. Ela tem por objetivo estimular o “consumo consciente”, estipulando valor a ser pago pelo usuário de acordo com o uso e não com o consumo. Em Tatuí, a taxa é paga pela Sabesp, que não repassa o custo ao consumidor.

Para o vice-presidente, a aplicação da lei de modo generalizado poderia reduzir os problemas relativos ao abastecimento e à contaminação dos lençóis freáticos. Segundo ele, as contaminações são “cada vez maiores”.

“As pesquisas em águas subterrâneas no Estado apontam que as águas do aquífero Tubarão, ao qual pertencemos, já estão contaminadas”, divulgou Wanderley.

As razões apresentadas pelo vice-presidente são inúmeras e “desenfreadas” por causa da abertura sem controle de novos poços artesianos.

As fiscalizações têm de ser feitas pelo DAAE (Departamento Autônomo de Águas e Esgoto) do Estado de São Paulo, que controla esse tipo de procedimento.

Wanderley explicou que os poços devem ser abertos somente com autorização e após o cumprimento de uma série de etapas.

A primeira é a solicitação e o pagamento de taxa. Na sequência, engenheiros analisam o pedido e podem conceder, ou não, autorização de outorga do uso da água.

“A coisa fica fora do controle, porque eles (o DAAE) têm cinco ou seis engenheiros que usam um ou dois carros e não dão conta de fiscalizar tudo”.

Segundo ele, os resultados são perfurações autorizadas que registram água contaminada. A mesma situação, porém, não é a realidade de empreendimentos imobiliários ou industriais, os quais têm de ser submetidos, primeiro, ao crivo das empresas que administram os serviços.

“É preciso cautela em tudo. A primeira coisa que se tem que saber é se vai ter água suficiente para os empreendimentos. Em Tatuí, quem sabe isso é a Sabesp”, apontou.

A companhia faz análise com base em testes de vazão do rio e de captação de água em metros cúbicos por segundo. Também por conta disso, prevê novos investimentos, como ampliação de redes de adutoras e de tratamentos de água e de esgoto.

Caso os estudos apontem risco, empresas como a Sabesp podem não autorizar os empreendimentos. É o que a cidade de Cerquilho está vivenciando.

Conforme Wanderley, o SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) do município vizinho não autorizou a construção de dois prédios (dois blocos de oito andares). “O serviço já ‘quebrou’ os engenheiros, que começaram a brigar”.

Além de promover a discussão sobre o tema, o comitê desenvolve ações que visam conscientizar as pessoas sobre o uso consciente da água nos 34 municípios que o integram.

Para tanto, patrocina – por meio de recursos do Fehidro (Fundo Estadual de Recursos Hídricos) – projetos como o curso de educação ambiental para gestão compartilhada, que está sendo realizado em Tatuí.

Iniciado em setembro, ele acontece durante três meses, sendo três dias por mês. No mês que vem, finaliza as atividades nos dias 7, 8 e 9.

O encerramento será no dia 23, quando os alunos farão um reflorestamento. “A ideia é pegar uma área degradada e fazer plantio de árvores”, afirmou.

Conforme ele, durante o curso, os participantes aprenderão o que é educação ambiental, o que é o comitê da bacia, qual é o papel da câmara técnica de educação ambiental e como usar a educação ambiental em recursos hídricos. Ele é voltado ao público em geral e a servidores e ecologistas.

Também neste mês, a cidade recebe nova edição de projeto realizado pela Fundação S.O.S. Mata Atlântica. O trabalho é desenvolvido em 12 cidades da bacia hidrográfica dos rios Sorocaba e Médio Tietê junto a crianças do ensino fundamental.

O projeto consiste no monitoramento da qualidade da água de rios. Em Tatuí, será desenvolvido com estudantes da Emef (Escola Municipal de Ensino Fundamental) “Professor José Menezes Bueno”, do distrito de Americana.

A coleta e a análise são realizadas por meio de kits distribuídos aos alunos. Grupos de estudantes receberão os materiais que poderão ser usados nos testes de água.

Esses são feitos com reagentes em amostras coletadas nos rios Sorocaba e Tatuí. As classificações da qualidade da água serão feitas com base em uma tabela colorida, com reagentes de Ph, oxigênio, nitrato e fosfato.

Além da S.O.S. Mata Atlântica, o projeto de monitoramento da qualidade de água conta com apoio da ONG (organização não governamental) Icatu e da Prefeitura.