Fundação Getúlio Vargas é cotada para auditar contabilidade pública





A FGV (Fundação Getúlio Vargas) pode auditar as contas da Prefeitura neste ano. O Executivo iniciou conversas com representantes da instituição para que ela embase os trabalhos da comissão de sindicância instalada pela prefeita Maria José Vieira de Camargo para averiguar “supostas irregularidades”.

Na semana passada, o Executivo nomeou o comitê responsável pela análise de atos e processos administrativos “sob suspeita”, praticados na gestão de 2013 a 2016. A comissão é formada por 14 pessoas, sendo presidida pelo advogado e secretário municipal de Negócios Jurídicos, Renato Pereira de Camargo.

O grupo de trabalho é composto pelos secretários municipais Walter dos Santos Júnior (Fazenda e Finanças) e Juliana Rossetto Leomil Mantovani (Planejamento e Gestão Pública); pelos assessores especiais Antonio Carlos Leonel Ferreira Junior e Mauro Edson Soares de Moraes; pela diretora de gestão pública, Tais de Oliveira; e por outros oito servidores efetivos (concursados).

São eles: Aline Pires de Camargo (advogada), Djalma Manoel de Oliveira (chefe de divisão de pessoal), Rogério Sobral de Oliveira (fiscal tributário), Agnaldo Soares Cardoso (fiscal), Rafael Menezes (motorista), Alessandra Caresia (escriturária), Cristina Sinisgalli (atendente) e Francisco Carlos Hoffmann (escriturário).

No decreto, a prefeita consta que, nos primeiros 30 dias de mandato, a equipe detectou ocorrência de “possíveis irregularidades em atos administrativos”.

Para isso, a comissão começou a analisar todos os contratos, licitações, convênios, concursos e nomeações feitos pela Prefeitura nos últimos quatro anos.

Também vai se debruçar sobre supostas concessões de vantagens indevidas, aprovações e confissões de dívidas, transferências de recursos e renúncias de receita.

Está encarregada, ainda, de verificar possíveis ocorrências de aumento de despesas sem dotações e reservas legais, existência de notas fiscais empenhadas e não pagas, cancelamento de empenhos, falta de recolhimentos de contribuições, restos a pagar e endividamento superior ao “permissivo legal”.

De acordo com a equipe de governo, há indícios de que as “práticas possam ter ocorrido de maneira contumaz” entre 2013 e 2016. As indicações teriam vindo de documentos obtidos junto aos “próprios órgãos públicos que compõem a administração direta” (secretarias, departamentos, divisões e setores).

Entre as situações irregulares mencionadas pela prefeita, está o pagamento dos chamados “supersalários”. Conforme Maria José, alguns dos funcionários comissionados (nomeados e de carreira) tinham “vencimento muito alto”.

“Nós classificamos isso de supersalários porque eles eram pagos sem critério definido”, comentou a prefeita. Segundo ela, a administração anterior manteve comissionários com salários maiores que os dos ex-secretários municipais.

O Executivo apurou, até o momento, que os aumentos teriam sido concedidos via portarias, prevendo mudanças da referência base. Entretanto, a prefeita disse que a alteração deveria ter sido feita por lei aprovada pela Câmara Municipal. “Os supersalários chegavam a R$ 10,3 mil em alguns casos”, declarou.

Analisando a folha de pagamento, Maria José disse que a equipe atual percebera que alguns servidores teriam sido “privilegiados”. De acordo com a prefeita, eles recebiam três tipos diferentes de gratificações, as quais, somadas, produziam rendimentos até 300% maiores que o salário-base. “Eram os apadrinhados. Em alguns casos, além das gratificações, pagavam hora-extra”, citou.

O Executivo também quer uma análise dos repasses relacionados ao TatuíPrev – Instituto de Previdência Própria do Município de Tatuí no ano passado. A razão é o débito avaliado em R$ 8,5 milhões relativo “à parte patronal” e que precisou ser reparcelado pela atual administração com anuência dos vereadores.

O montante diz respeito ao percentual de contribuição que a Prefeitura precisa repassar ao instituto. Em geral, a administração envia 11% para o fundo, do qual saem as aposentadorias, benefícios e pensões por morte. O TatuíPrev recebe, ainda, mais 11% descontados da folha de pagamento dos servidores.

“Dentre tantas outras barbaridades que encontramos, o que mais me deixou preocupado foi o instituto, que não tinha CRP (Certidão de Regularidade Previdenciária) para receber recursos”, disse o vice-prefeito Luiz Paulo Ribeiro da Silva.

Para resolver a questão, a Prefeitura encaminhou à Casa de Leis projeto de reparcelamento. Com isso, o Executivo conseguiu renovar o certificado, vencido no dia 4 de janeiro.

Entretanto, durante a discussão do assunto, a equipe da prefeita verificou outro débito junto ao instituto. Luiz Paulo disse que o Executivo descontara os 11% dos funcionários, mas não os repassou ao TatuíPrev.

Para conseguir renovar o CRP, a Prefeitura precisou quitar, ainda em janeiro, R$ 769 mil em parcela única. O valor incluiu a dívida de R$ 687 mil, mais multa de R$ 68 mil e juros de R$ 13 mil.

“A conta deveria ser paga no final do ano passado, mas acabou sendo paga por nós. Aonde foi parar o dinheiro descontado do servidor? É uma situação que a Justiça deve esclarecer”, ressaltou.

No entendimento do vice-prefeito, o desconto do salário dos funcionários sem o devido repasse configura “crime de apropriação indébita”. “Isso é muito, mas muito preocupante. Além da parte patronal, tivemos que pagar a parte do empregado. Empregamos quase R$ 1,5 milhão para o TatuíPrev”, falou Luiz Paulo.

A sindicância deve, ainda, ater-se a mais “atos administrativos” relacionados ao instituto, antecipou o vice-prefeito. Ele citou que o fundo da previdência – instituído na administração do ex-prefeito Luiz Gonzaga Vieira de Camargo – foi mal gerido em 2013. De acordo com ele, há registros de perda de mais de R$ 5 milhões em função de aplicações incorretas.

“Quiseram (os responsáveis pelo instituto) ser agressivos, aplicando em fundos de ações e outras modalidades que fizeram que perdesse dinheiro. Se tivessem colocado em poupança, ou em fundo de renda fixa, teriam mais dinheiro. Quiseram outras coisas e acabaram perdendo dinheiro”, sustentou.

Situações “de maior gravidade” também serão avaliadas pela comissão de sindicância. Luiz Paulo frisou que os encarregados pelo trabalho também analisarão supostos desvios do salário da merenda escolar, da cota do salário educação.

“Tudo isso vai ser analisado e, nos próximos meses, iremos mostrar o resultado para todo mundo, mas com transparência”, ressaltou.

Caso a Prefeitura contrate a FGV, os resultados poderão ser repassados para a entidade. A fundação ficaria responsável por analisar todo o processo de sindicância. “É uma auditoria que nós vamos, depois, levar a público. Vai dar um ‘check-up’ de como está Tatuí financeiramente”, acrescentou.

A expectativa é que a FGV também possa auxiliar a administração a “colocar a casa em ordem”. “Nós pegamos uma cidade cujo custo total é maior que a receita. Está tão inchada de contratos e com uma folha tão grande que o que arrecadamos se gasta nos primeiros dias do mês”, alegou Luiz Paulo.

Sob orientação dos profissionais da fundação, a Prefeitura quer elaborar um “plano futuro” de trabalho. A meta é estabelecer um “fluxo de caixa” que permita à municipalidade normalizar o processo de compra e pagamentos.

Com isso, o Executivo pretende recuperar a confiança dos fornecedores e reduzir os custos. Em função da insegurança (se terão os serviços já prestados pagos), o vice-prefeito disse que muitas empresas “inflam” os preços.

De acordo com Luiz Paulo, um retentor (peça metálica usada para vedação) de R$ 200 chega a ser ofertado à administração por R$ 800. “Os fornecedores não se sentem seguros. Precisamos voltar a ter credibilidade para que consigamos um preço melhor e coloquemos as contas em dia”, concluiu.