Depois do Carnaval!





Se a única coisa de que o homem terá certeza é a morte; a única certeza do brasileiro é o carnaval no próximo ano.
(Graciliano Ramos)

Depois do Carnaval!

Em todo o Brasil e em várias instituições públicas e privadas, várias decisões são deixadas para depois do carnaval, mostrando que a festa influencia no comportamento das pessoas. Parece mesmo que em nosso País o ano só começa depois do Carnaval.

Agora, nesta época, que tivemos o feriado de carnaval. Em alguns lugares perde-se mais de uma semana de trabalho. É o festejo da alegria num País de quase 40 milhões de desafortunados.

Desde o início de janeiro a mídia vem explorando as folias de Momo, como se fosse o acontecimento mais importante do ano.

Fala-se em alegria, festa, colocar para fora as angústias contidas durante o ano passado. Infelizmente os caminhos propostos nada têm a ver com alegria ou alívio de tensões.

Ligamos a televisão e ouvimos a batida repetitiva das escolas de samba, cujo valor folclórico e cultural foi lentamente sendo perdido. Há muita gente que busca fazer do carnaval um momento de esperança, oportunidade para um novo emprego.

Entretanto, o grande saldo da festa se resume em duas palavras: ilusão e sensualidade. Referimo-nos à ilusão das drogas e o excesso de bebida alcóolica.

A ilusão de grandeza, que falsamente produz um imenso contraste entre a beleza da avenida e a subvida dos barracos.

Falamos da sensualidade que se torna material de venda, nos corpos desnudos e aparentemente felizes por fora, mas muitas vezes profundamente infelizes por dentro.

As emissoras não cansam de exibir os bailes, os concursos de fantasias, os desfiles, levando-os a todos os que se comprazem em observar a loucura.

Mas, ao longo do caminho, multiplicam-se os novos casos de Aids, os abortamentos, a pobreza e o abandono, a violência.

Com o risco de sermos taxados de moralistas, num tempo em que se perdem as noções de moralidade, não podemos deixar de analisar criticamente esses disparates do mundo brasileiro.

Em nenhum momento nos colocamos contra a alegria. Porém, será justo confundir euforia passageira com alegria real?

Alegria de verdade seria viver num lugar onde não houvesse fome, violência, tráfico de drogas e tráfico de influências.

Não podemos nos colocar contra o alívio de tensões. Entretanto, alívio real seria encontrar um caminho para os graves problemas pelos quais o País atravessa.

O carnaval é bem típico da alienação espiritual que a sociedade se permite. De um lado, as falsas aquisições sociais de alguns, negadas pela agressividade de muitos; de outro, a falsa felicidade de quatro dias de folia, e 361 dias de novas e renovadas angústias.

Vale a pena? Nestas horas, pessoas embriagadas, perdidas, usam um segundo de falso prazer, em troca de um enorme tempo de arrependimentos. Por quê? – Perguntamos.

Enquanto a sociedade agir desta forma, sem personalidade digna, dando valores justamente aos desvalores, as pessoas continuarão sofrendo as consequências de seus próprios atos.

Segurança, saúde, social. Certamente não encontraremos respostas convincentes para essas velhas questões. Porém, “Depois do Carnaval” vêm outros carnavais, por isso, cabe aqui, a frase de Cecília Meireles. Esta frase, por si só, nos dá uma noção da realidade vivida e contestada pelos menos favorecidos: – Mas, agora que o Carnaval passou, que vamos fazer de tantos quilos de miçangas, de tantos olhos faraônicos, de tantas coroas superpostas, de tantas plumas, leques, carros alegóricos? Mas os homens gostam da ilusão. E já vão preparar o próximo Carnaval.