Munícipio não realiza evento para comemorar a ‘Consciência Negra’





O Dia da Consciência Negra, comemorado na quarta-feira, 20, foi promulgada em janeiro de 2003, pelo governo federal, com o intuito de incentivar a reflexão para questões referentes à inclusão do negro na sociedade e à discriminação. Cabe aos municípios aderir ou não às comemorações e estipular a data como feriado.

No mesmo dia, em 1695, morria Zumbi dos Palmares, criador do maior quilombo da então colônia brasileira (onde escravos fugitivos recebiam abrigo), a qual alojava aproximadamente 30 mil pessoas. Pela luta contra a escravidão, tornou-se símbolo na história nacional.

Em Tatuí, até o fechamento desta edição (terça-feira, 17h), não houve divulgação de atividades relacionadas ao Dia da Consciência Negra.

De acordo com a presidente do CMICN (Conselho Municipal dos Interesses do Cidadão Negro), Michele Rolim Pinheiro, 34, este ano não haverá evento relacionado à data. Ela relatou que, por conta de problemas pessoais, não conseguiu fazer o planejamento necessário para a organização.

Michele lembra que a consciência negra “não é apenas levar um grupo de samba na Praça da Matriz”, e adiantou que, em 2014, organizará um evento grande, “com danças, comidas, indumentárias, cabelo e maquiagem”.

“Eu tenho um ano para pensar no que eu quero fazer. Minha intenção é falar de tudo sobre o negro. Sempre que tenho uma ideia, pego uma caneta e a coloco no papel”, contou Michele.

Ela ressalta que a consciência negra tem que ser praticada durante todo o ano. “Eu posso não fazer nenhum evento agora, mas acho que a qualquer momento você pode lembrar que o negro existe”, destacou.

Para Michele, o dia 20 de novembro tem o mesmo significado que o aniversário dela. “É a comemoração da liberdade, porque é mais um ano que eu estou na luta, apesar de ser triplamente rejeitada pela sociedade – por ser mulher, negra e estar acima do peso”, afirmou.

Michele questionou o fato de Tatuí ainda não considerar como feriado o Dia da Consciência Negra. Ela argumenta que cidade menores, como, por exemplo, Boituva, já apresentaram projetos de lei que regulamentam a comemoração.

A presidente do Conselho dos Negros considera que o preconceito no Brasil é camuflado. Porém, em Tatuí, diz que é mais fácil viver do que em outras cidades.

Michele entende que os tatuianos aceitam melhor e interagem mais com os negros. “Porém, a gente ainda vê pequenas coisas, como brincadeiras que podem ser tidas como discriminação”, opinou.

Ela ressaltou que ainda sofre preconceito racial. “Eu estou trabalhando com a educação (monitora de alunos), e teve um pai de aluno que, quando me viu pela primeira vez, porque eu estava com dread (penteado africano), percebi que o assustei. Considero esta atitude preconceito, pela maneira com a qual ele me olhou”.

A presidente acredita que o racismo contra os negros está distante de acabar. “Você só saberá quando sentir na ‘pele’ o que é ser negro”.

Segundo ela, atualmente, também é possível imaginar que o negro “está na moda”, visto a evidência de artistas e jogadores de futebol. Mas, Michele relata que a fama “atinge” apenas essa parcela da sociedade.

“A realidade é muito difícil. Existem várias propostas de trabalho, por exemplo, mas algumas pessoas acham que nós ainda somos escravos. Costumo dizer que apenas a educação nos diferencia”, argumentou.

Michele ainda aponta que a história do negro relatada nos livros escolares é contada equivocadamente. De acordo com ela, os símbolos relacionados à imagem do negro são correntes e chicotes.

“Se conversarmos com uma criança do ensino fundamental, ela não sabe a história completa dos negros. Ela entenderá apenas que fomos escravizados, pois é isso que consta nos livros. Essa é a visão que cresce na cabeça do negro”, ressaltou.

Para tentar mudar esse panorama, a presidente do CMICN pretender entrar numa faculdade de história no ano que vem. Mas, ela afirma que a atuação na sala de aula abrangeria diversas raças, além da negra, como a judaica ou a indígena.

“Continuar com esse preconceito não dá. Precisamos nos aprofundar na história, por isso eu quero ser professora. No conselho municipal, sempre trazemos essa discussão para a cidade”.

Porém, Michele conta que a participação de “outras pessoas” nos debates da causa negra é muito pequena. Ela acredita que esse aspecto deverá mudar quando o assunto chegar às escolas “de uma forma simples, didática, para crianças e adolescentes”.

Ela relatou que a atuação do conselho está em um “meio termo”, pois haverá, até o final do ano, mudanças nos membros do órgão e eleição para a escolha de nova diretoria.

“Algumas pessoas já não estão participando ativamente. Mas, também, temos outras que gostariam de entrar, principalmente jovens. Isso é muito bom, porque eles vêm com muitas ideias”, esclareceu Michele.

Ela informou que, em 2014, o CMICN terá “boas novidades”, inclusive para a época do Carnaval. Michele ainda não sabe se permanecerá na presidência, mas garante que nunca abandonará o combate pelos direitos do negro.

“Independente do conselho, eu sempre fui militante do movimento. Faço porque eu gosto, não porque sou presidente. Quero ensinar as pessoas sobre a nossa (dos negros) história. Eu luto pela minha comunidade”, finalizou.