Moradores do Inocoop cogitam ir ao MP





Cristiano Mota

Márcia Martins Toledo aguarda providências e diz que não vai ficar ‘de braços cruzados’ até que consiga obter laudo e resolver problemas de rachaduras e fendas

 

Com problemas de vazamento no quintal, num dos muros e no piso da cozinha, Andréia Sinhorin diz que já perdeu o sossego e não consegue dormir em casa há quatro meses. A vizinha dela, Márcia Martins Toledo, também conta que está apavorada. A residência da família apresenta fissuras no solo, marcas de afundamento do terreno e “sons ocos” em várias partes do terreno.

Moradoras do bairro Inocoop, as duas cogitam abrir representação no MP (Ministério Público) por temerem explosão por suposto vazamento de gás metano, ou desmoronamento. Andréia e Márcia possuem casas nos números 64 e 82 da rua Erasmo de Campos Sá, e estão em busca de solução.

Elas se juntaram a outros moradores do bairro na tentativa de obter uma declaração oficial sobre o que está ocorrendo naquela região do Inocoop. O terreno onde as mais de 400 moradias foram construídas já abrigou um antigo “lixão”.

Por essa razão, as famílias de três residências temem um vazamento de metano e, por consequência, uma explosão. O gás não tem cheiro, é altamente inflamável quando em contato com oxigênio e produzido por bactérias que consomem o lixo nas camadas subterrâneas, onde não há oxigênio.

No bairro, o primeiro indício de vazamento apareceu na residência de Andréia. O quintal da casa dela apresenta bolhas quando molhado. Também há barulho semelhante a um vazamento. “Acredito que isso seja gás”, disse ela.

Andréia adquiriu a casa há seis anos e pretende vendê-la. Ela quer deixar o bairro para se mudar com a família para a casa da mãe, que vive no Sul do país. Entretanto, a dona de casa está desempregada e não quer “passar o problema adiante”.

Conforme ela, todos os imóveis de numeração par, localizados na rua Erasmo de Campos Sá, apresentam rachaduras e afundamentos. A maioria possui fissuras que apareceram nas calçadas, nos quintais, muros e cômodos.

“O meu começou assim, mas eu fiz uma reforma e melhorou por mais de um ano”, relatou. Andréia relatou que precisou refazer um dos muros laterais da casa porque ele estava cedendo. A parede estava ligada por uma estrutura de telhado a um dos cômodos da residência, danificando o imóvel.

Já em 2013, a dona de casa disse que procurou a Prefeitura para se informar sobre o que poderia ter causado o problema. “Falaram que o bairro tinha sido construído em cima de um aterro sanitário e que a tendência era afundar”, disse.

Temendo ser vazamento de gás natural (a residência dela é atendida por empresa do setor), Andréia chamou o serviço especializado da empresa.

A moradora alegou que um funcionário descartou a hipótese de vazamento, mas teria feito um alerta. Conforme ela, o técnico declarou que o espaço entre a calçada e o quintal da casa (separados por um muro) estava oco.

“Não tenho condições, estou desempregada, senão quebrava um pedaço da calçada para que alguém pudesse verificar o que está havendo”, comentou a dona de casa.

Andréia disse, ainda, que recebeu recomendações para tampar as fendas abertas no cimento do quintal e da garagem. Contudo, ela teme que se houver o fechamento, o suposto gás metano possa represar e causar uma explosão.

Até que obtenha um laudo, a dona de casa disse que não poderá vender o imóvel. O receio dela é que quem comprar a residência possa vir a sofrer algum desastre. “Eu, por exemplo, não deixo mais minha filha ficar no quintal”, disse.

Durante o processo de reforma do muro, Andréia afirmou que ela e o marido precisaram fazer um aterramento, para nivelar o solo na altura que estava. “Usei o entulho da parede de casa e do muro para refazer o nível”, comentou.

Na época, ela alegou que não sabia que o conjunto habitacional havia sido construído sobre um aterro sanitário. “Depois é que eu fiquei sabendo que o proprietário anterior vendeu porque sabia dos problemas”, sustentou a moradora.

O medo de que haja desmoronamento fez com que a moradora adiasse o projeto de comprar um carro. “Não tem como colocar um veículo aqui”, comentou.

“Meu marido fala que precisamos de um carro por causa da nossa filha, mas eu não deixo ele comprar sem antes resolver o problema da casa, porque podemos ficar sem casa e com um carro para pagar”, adicionou a dona de casa.

Além do quintal, a residência dela apresenta trincas no piso da cozinha. O problema teria sido atribuído à temperatura. “Um engenheiro falou que isso vai estourar, mas ele alega que não tem nada a ver com o terreno ceder”, afirmou.

Em relato, Andréia afirmou que outra moradora do bairro teria caído em uma cratera aberta no solo, no quintal de casa, há quatro anos. “Ela ficou pela metade”, disse.

A dona de casa também afirmou que um dos postes de energia elétrica localizado do outro lado da rua afundou 6,5 metros. Conforme ela, a fiação está próxima de uma das residências que também estaria com problemas. O proprietário desse imóvel – de número 88 –, no entanto, teria saído com medo de uma tragédia.

“Eu não sabia que o problema era tão sério. Estava tranquila, com a casa à venda, só que, na semana passada, o vizinho abandonou a casa dele”, comentou.

Mais que o medo, o problema descrito pela moradora tem afetado todo o bairro. Andréia disse que as imobiliárias têm registrado dificuldades em oferecer casas tanto para venda como para aluguel, por conta da divulgação da situação.

A dona de casa afirmou, ainda, que está impossibilitada de fazer negócio, uma vez que não quer repassar o problema para outra família. “Eu quero que esclareça de quem é a responsabilidade”, comentou. A moradora afirmou que quer que as autoridades competentes tomem providências para evitar que uma tragédia possa vir a ocorrer.

“Estamos morrendo de medo. A qualquer momento pode explodir tudo”, declarou Márcia Martins Toledo. A dona de casa é uma das primeiras moradoras do Inocoop. Ela adquiriu a residência há 17 anos e disse que a anomalia ocorre desde 2003, quando houve o surgimento de um buraco no final da rua.

Segundo ela, os moradores ouviram uma explosão e, ao verificarem o que havia acontecido, encontraram uma cratera. “Nós estávamos num tempo quente como este. Deu uma explosão que parecia um botijão de gás. O barulho foi tão grande que abalou todas as residências”, descreveu.

Com medo de que o fato se repetisse, ela afirmou que uma das moradoras vendeu a propriedade. Na época, a dona de casa disse que quem morava próximo do local sentiu um “cheiro forte”. “Era um cheiro de lixo podre”, relatou.

Também na ocasião, o caso chegou ao conhecimento de autoridades locais. “Acontece que, de lá para cá, as casas foram cedendo e o cheiro forte – e que é insuportável – voltou à noite. Quando eu falo, as pessoas não acreditam”, alegou.

Márcia disse que um dos engenheiros da Defesa Civil, enviado pela Prefeitura e que visitou o imóvel, teria dito que a propriedade dela corre risco de ceder.

A afirmação diverge de nota divulgada à imprensa pela assessoria de comunicação da Prefeitura, assinada pelo coordenador interino da Comdec (Coordenadoria Municipal de Defesa Civil), João Batista Alves Floriano.

Conforme ele, o órgão realizou vistoria nos imóveis 64 e 88 (de Andréia e Márcia), que “supostamente apresentavam afundamento de solo”. Floriano citou que o engenheiro civil José Antonio Alquezar, que integra equipe técnica da Comdec, após vistoria no terreno, “não observou qualquer indício de ‘afundamento de solo’”. Ele divulgou, também, que as residências vistoriadas pelo profissional “não apresentavam riscos em suas estruturas”.

O coordenador interino destacou que as propriedades do Conjunto Habitacional “Amaro Padilha” foram construídas “há mais de 20 anos e com a devida aprovação de todos os órgãos competentes”. Por fim, relatou que o locatário da casa de número 82 afirmou desconhecer “tal problema” (afundamento de solo).

A moradora do imóvel 88 discorda. “Falaram para mim que minha casa está segura só pela laje, porque embaixo parece haver um túnel”, disse. Márcia declarou, ainda, que a Defesa Civil recomendou que ela abandonasse o imóvel ao menor sinal de deslizamento ou de vibração. “Está a ponto de ceder”, adicionou.

Ela também disse ouvir barulhos à noite, como se o solo embaixo da casa estivesse ruindo. O som teria sido atribuído pelos engenheiros da DC ao calor. “Disseram que é a telha quebrando, mas não é. No inverno, ou quando chove, nós todos aqui em casa sentimos que há um movimento”, comentou.

Ao falar sobre o problema, a moradora mostrou o muro do fundo do quintal do imóvel. Márcia frisou que o alicerce está exposto e pode ser visto acima do nível do terreno. Isso porque, conforme ela, todo o imóvel está afundando.

Como as casas do Inocoop foram construídas sobre uma base de laje, a explicação para que não haja rachaduras nelas é o fato de que o afundamento ocorre de maneira uniforme. Deste modo, o desnível ficaria visível a partir do alicerce dos muros. Um deles precisou ser refeito pela família.

Para evitar que os terrenos afundem ainda mais, as moradoras disseram que precisaram aterrar os imóveis. Márcia comentou que o marido teria tampado as primeiras fendas de modo a evitar que elas abrigassem bichos peçonhentos.

Conforme ela, a ação surtiu efeito por somente alguns dias, uma vez que mais buracos surgiram durante a ação de aterramento. O uso de terras, no entanto, é considerado custoso para os moradores. Márcia relatou que precisou utilizar cinco caminhões de terra somente para nivelar o quintal do imóvel.

Como as moradoras afirmam não terem obtido solução junto à Prefeitura, declararam que acionarão o Ministério Público. O objetivo é que um engenheiro ou técnico responsável possa emitir laudo sobre o problema. Em caso de haver riscos, elas querem garantias de que terão direito a outra moradia.

As donas de casa já quitaram os imóveis e, em função disso, não têm direito ao seguro oferecido pela financiadora. “A casa é o de menos. Morar, nós moramos em qualquer lugar, mas e a vida da gente, como faz?”, questionou Márcia. Apesar de ter emitido comunicado, a Defesa Civil não entregou às moradoras um laudo oficial.

Andréia ainda pediu atenção para as autoridades, citando que a casa dela não apresenta danos aparentes. “Olhando para a minha residência, à primeira vista, a pessoa não vê nada de anormal, mas e o vazamento?”, perguntou.

Conforme a moradora, há resistência da maioria dos proprietários com relação à busca por providências. A dona de casa disse que muitos relutam em não tornar público os problemas porque não querem ter os imóveis desvalorizados.

“Tem gente que só quer vender e sair. Se divulgar, atrapalha. Só que eu penso diferente, o que eu não quero para mim, não quero para ninguém”, concluiu.

Problema antigo

A questão da condição do terreno é “velha conhecida” dos mutuários das casas do Inocoop. Em abril de 1991, o engenheiro fiscal do Inocoop, Marcos Simões Elias, chegou a ser detido pela acusação de “falsa afirmação”.

Conforme notícia divulgada em O Progresso, muturários solicitaram reunião com representantes da Caixa Econômica Federal e Prefeitura. Os mais de 400 proprietários queriam esclarecimentos com relação à segurança das casas. Na ocasião, a obra ficou a cargo da Construtora Apoema S/A.

Em dado momento, um mutuário perguntou ao engenheiro fiscal se a construtora havia obtido laudo de aprovação da Cetesb (Companhia de Saneamento Tecnológico do Estado de São Paulo). Elias confirmou a informação, sendo interrompido pelo promotor e curador do Meio Ambiental João Carlos M. Ortiz, que o acusou de falsa afirmação e deu voz de prisão.

O engenheiro foi ouvido pelo então delegado de plantão, José Roberto Xavier da Silva, que procedeu ao boletim de ocorrência e indiciou-o com base no artigo 50 da “Lei de Loteamentos”. Elias permaneceu detido até às 19h do dia 5 de abril.