Com os termômetros marcando temperaturas mínimas abaixo de 10° C, o frio ao longo da semana tem castigado os moradores de Tatuí. Os mais afetados pela massa polar são os que “moram nas ruas”.
A segunda-feira, 13, teve a madrugada mais fria do ano. De acordo com a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), o termômetro da estação meteorológica registrou 3,3° C às 6h. A temperatura máxima daquele dia foi de 20° C, às 15h.
O frio fez com que órgãos de assistência social, como o Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), o Fundo Social de Solidariedade e a Casa de Apoio aos Irmãos de Ruas “São José” se mobilizassem em prol de moradores de rua e famílias carentes.
A presidente do Fundo Social, Ana Paula Cury Fiuza Coelho, afirmou que o órgão adiantara a Campanha do Agasalho deste ano tendo em vista que o frio chegaria mais cedo que o habitual, no mês de julho.
“Adiantamos a campanha porque achamos que o governo do Estado começa muito tarde. A ação deles vai até julho, quando, para nós, aqui, o frio já está no fim. Daí, perde o sentido de ajudar as pessoas”, justificou.
O FSST realizou, no mês de maio, uma mobilização na Praça da Matriz, para anunciar o lançamento da ação. Caixas para recolhimento de donativos foram distribuídas em escolas, postos de saúde e lojas.
Conforme as doações foram recolhidas, o Fundo Social já fez a distribuição ao Cras (Centro de Referência de Assistência Social) e ao Creas, que distribuíam para as famílias carentes e moradores de rua.
“Invertemos o que fazíamos até o ano passado, que era juntar todas as doações e dividir entre as entidades. Neste ano, vamos distribuir para os carentes, e o que sobrar irá para as entidades”, explicou.
Antes da entrega das roupas de frio e dos cobertores, a equipe do FSST realiza uma triagem nas peças, separando as que não têm condições de uso. O trabalho é realizado no Polo da Construção Civil.
“O frio está demais. Estamos acelerando a reciclagem e a distribuição das roupas”, disse. Segundo a primeira-dama, neste ano, as doações de roupas aumentaram, entretanto, ela afirma que o Fundo Social não realizou balanço.
Um problema, porém, é o número baixo de cobertores recebidos. Até o ano passado, empresários locais realizavam doações de cobertores, o que não aconteceu neste ano. O Fundo Social de Solidariedade do Estado, que também distribui mantas, ainda não enviou os donativos a Tatuí.
“Temos certeza de que vão nos enviar. Todos os anos, a Lu Alckmin (primeira-dama e presidente do fundo estadual) manda cobertores não só para Tatuí, mas para todas as cidades do Estado”, contou.
As famílias carentes, que necessitam de roupas de frio, são atendidas pelos quatro Cras da cidade. Os moradores de rua são abordados pela equipe do Creas e da Casa de Apoio, que os convidam a ir para o abrigo se proteger do frio.
De acordo com a coordenadora do Creas, Nativa Quedevez de Souza, a maioria dos moradores de rua recusa-se a ir para o abrigo. A equipe não pode obrigá-los.
Segundas-feiras e quintas-feiras são os dias em que os assistentes sociais vão às ruas para tentar conscientizar os moradores de rua a procurarem o abrigo.
“A Casa de Apoio tem algumas regras, é lógico. Lá dentro, não pode levar bebida, por exemplo. Mas, está totalmente aberta para receber os moradores em situação de rua”, disse.
Apesar da baixa temperatura e o risco de morte por hipotermia (diminuição excessiva da temperatura corporal) dos moradores de rua, a assistente social se colocou contra a doação de cobertores e roupas de frio aos sem-teto.
A capital paulista, por exemplo, registrou cinco mortes de moradores de rua nesta semana. Em Tatuí, até o momento, não houve nenhum caso, segundo o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência).
“Na verdade, ele (morador de rua) vai morrer de qualquer jeito. O que está matando eles é a situação que estão vivendo, que é o uso abusivo de álcool e de drogas”, opinou.
Nativa afirmou que as doações de roupas, cobertores, comida e dinheiro “reforçam” aos mendigos que a vida na rua “compensa”. A coordenadora afirmou que a maior preocupação do Creas é tentar a reinserção deles na sociedade.
“Não estamos preocupados em tirá-los das ruas. A nossa preocupação é reinseri-los na sociedade de forma digna. Quando a população faz isso (doações), ela reforça (que eles podem viver nas ruas)”, explicou.
O número de moradores de rua em Tatuí é estimado entre 15 e 20, e “não passa disso”, segundo a coordenadora. Nativa afirmou ter feito levantamento no qual a maioria é do sexo masculino. Outro dado é que o alcoolismo e a dependência química foram os principais fatores que os levaram a sair de casa.
A temperatura baixa fez com que moradores procurassem o Samu para atendimentos de problemas respiratórios e cardiovasculares, mais decorrentes no frio.
Segundo a coordenadora do serviço, Roberta Lodi Molonha Machado, os problemas respiratórios pioram na estação fria e são mais frequentes em idosos e crianças.
“O frio afeta a circulação do corpo, e isso não é bom para quem tem predisposição a problemas cardiovasculares. O número de atendimentos aumenta por causa disso”, explicou.
Na sexta-feira da semana passada, 10, as equipes do Samu e do Medical Doctors, empresa de prestação de serviços médicos, distribuíram sopa aos moradores de rua e aos abrigados na Casa de Apoio. A ação social dos médicos, enfermeiros e motoristas beneficiou 65 pessoas – cinco delas estavam nas ruas.
“Na verdade, não tinha muitos moradores de rua naquela noite, a maioria estava na Casa de Apoio. Acho que o trabalho social valeu a pena”, disse a chefe do Samu.
Perdas na agricultura
Não é só na cidade que o frio tem prejudicado a população. O campo também foi atingido pelas temperaturas baixas dos últimos dias. Produtos como leite, verduras e frutas podem ter os preços aumentados devido ao clima, segundo o chefe da Casa da Agricultura de Tatuí, Wisner Castilho.
As perdas podem chegar a 30%, dependendo da cultura. Parte das pastagens, que cobrem grande parte da área agrícola do município, foi queimada pelas geadas.
Com menor área de pasto à disposição, as vacas produzem menos leite, fazendo aumentar o preço do produto no mercado. Além disso, os pecuaristas precisam comprar forragem e ração para suplementar a alimentação, encarecendo o custo.
“A questão das pastagens é a mais importante por representar a maior área de cultivo da cidade”, disse Castilho. Ele afirmou que a olericultura (hortaliças) deve ser afetada, principalmente juto aos produtores que não dispõem de estufa para o cultivo.
“Nesse caso, podemos ter perda da produção, principalmente nos casos das hortaliças folhosas. A oferta tende a diminuir e o preço, a aumentar para o consumidor”, declarou.
As outras culturas disponíveis na cidade, como fruticultura e o plantio de milho safrinha, poderão sofrer problemas na produtividade menos severos.
“A bananeira pode perder folhagem e, com isso, diminuir a produção, pela menor fotossíntese. Isso afeta a formação dos cachos e o peso deles, além da qualidade do fruto”, explicou.
Entretanto, o frio intenso não traz somente notícias negativas para o campo. A boa nova é que, para a citricultura, a temperatura baixa é favorável, por eliminar insetos, fungos e bactérias que disseminam doenças fatais para o citros, como o “greening”.
A doença, conhecida também como “amarelão dos citros”, aterrorizou os citricultores na década de 1990 e é classificada, por engenheiros agrônomos, como a mais destrutiva delas. As árvores afetadas pelo greening precisam ser arrancadas e queimadas, para evitar a proliferação da bactéria causadora da doença.
“Os agricultores estão mais preparados para as mudanças no clima, por conta das informações que temos hoje em dia. Com isso, ele pode fazer o manejo e diminuir as perdas, mas tem coisas que ninguém consegue escapar”, concluiu.