Ética e Corrupção!

RAUL VALLERINE

O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que me preocupa é o silêncio dos bons.

Martin Luther King Jr

Todos os dias nos deparamos com escandalosos casos de corrupção, ativa ou passiva, tanto no Brasil quanto no exterior, praticados especialmente nas relações promíscuas entre políticos e empresários.

A corrupção é definida como o ato de solicitar ou receber alguma vantagem indevida, segundo a “lei de Gérson”: “levar vantagem em tudo”, não importando o meio para se alcançar o que se almeja.

Tanto o corrupto como o corruptor praticam algo ilícito, passível de reprovação jurídica, em notório conflito com os princípios: viver honestamente, não lesar ninguém, dar a cada um o que lhe pertence.

Sob o ponto de vista legal, há a previsão de uma série de sanções para os casos da conduta corrupta. Mas não apenas o Direito recrimina a corrupção; também a reflexão ética reprova tal conduta.

A Ética é a área da Filosofia que tem a ver com o estudo das normas, princípios que norteiam o agir humano.

A palavra, de origem grega, significa etimologicamente hábito, costume e é objeto de reflexão filosófica há mais de vinte e cinco séculos. Já em Sócrates, Platão e Aristóteles, encontramos profundas reflexões sobre temas éticos.

Sócrates afirma ser preferível sofrer uma injustiça a cometer algo injusto. Em sua visão, é necessário respeitar as leis da cidade e cumprir sempre os termos de um acordo justo.

Por isso, considera inadmissível que seus amigos cometam algo ilícito para reparar a injustiça que Atenas praticara com ele, recusando qualquer vantagem indevida.

Exemplo disso é o diálogo de Platão intitulado “Críton”, em que a seguinte situação é relatada: Sócrates foi acusado, julgado e condenado à morte.

Críton, um amigo de Sócrates, tenta persuadi-lo de fugir da prisão, dizendo, inclusive, que ele e seus amigos providenciariam meios para o suborno dos guardas.

Apresenta vários argumentos que justificariam a fuga, mas Sócrates refuta o plano de Críton. Ainda que considere infundada sua condenação, Sócrates afirma ser preferível sofrer uma injustiça a cometer algo injusto.

Em sua visão, é necessário respeitar as leis da cidade e cumprir sempre os termos de um acordo justo. Por isso, considera inadmissível que seus amigos cometam algo ilícito para reparar a injustiça que Atenas praticara com ele.

Assim, Sócrates, na Antiguidade, dá uma resposta clara a tentativas de corrupção, ao recusar qualquer vantagem indevida. Essa negação categórica da corrupção apresenta-se também na Ética do filósofo Immanuel Kant, muitos séculos depois.

Para ele, o ser humano terá de agir corretamente “por dever”, não meramente “conforme o dever”. Isso quer dizer que a ação verdadeiramente moral é aquela que é motivada pelo dever e não a que tem a mera aparência de dever.

Se um comerciante, num exemplo, devolve o troco certo ao cliente, não porque tem a convicção de que essa é a atitude correta, mas apenas por medo de perder a clientela, não está agindo moralmente, pois, para o filósofo, o ser humano deve agir corretamente sem fazer um cálculo das consequências.

Segundo Kant, no entanto, o ser humano deve ser sempre tratado como fim em si mesmo, e nunca como mero meio do meu proveito pessoal.

A corrupção não provoca apenas descrença nas instituições, quando praticada por agentes públicos. Não apenas traz grandes prejuízos à coletividade, ao desviar recursos vultosos que deveriam ser aplicados, por exemplo, na saúde e na educação.

Além desses enormes malefícios, espero ter mostrado, com os exemplos de Sócrates e Kant, que a corrupção é o resultado da violação de elementos morais basilares que possibilitam a nossa convivência em sociedade.