Crise expressa





A edição anterior do jornal O Progresso, de quarta-feira, 15, apresentou reportagem que bem representa a crise nacional, a qual ainda segue em via rápida e expressa, abalroando indistintamente tanto o índice de empregos formais quanto os empreendimentos de toda sorte.

Em tela, a condição dos mototaxistas de Tatuí, os quais enfrentam algo – guardadas as sempre oportunas proporções – tal os taxistas paulistanos frente ao Uber (aplicativo que permite ao usuário o acesso ao serviço de transporte prestado por motoristas alheios aos regulamentados junto às empresas do setor).

Lá, as possíveis vantagens ao “cliente” seriam o menor valor das corridas – benefício supervalorizado em tempo de crise – e a condição dos veículos, normalmente, bem mais novos e, portanto, confortáveis.

A maior desvantagem seria com relação à segurança (lembrando já terem ocorrido assaltos e, em alguns locais mundo afora, até sequestros relâmpagos por “falsos” motoristas do Uber).

Para o taxista regulamentado, por sua vez, os prejuízos são enormes, vez que os “ubers”, a princípio, estão isentos dos custos correspondentes aos altos encargos impostos tanto a trabalhadores quanto a empregadores no país.

Diante do impasse, cada localidade busca suas próprias soluções, nem sempre concretizadas conforme as mesmas regras.

Em Tatuí, o serviço de táxi não é utilizado em grande escala, ao menos se comparado com o mototáxi – e o motofrete -, que já chegou a levar sobre duas rodas uma parcela muito significativa da população.

As razões para a preferência a esse serviço seriam a velocidade e o custo, considerado bastante competitivo em comparação ao transporte público urbano.

Ocorre que até mesmo o serviço de mototáxi não está sendo poupado pela crise. A reportagem identificou que o maior problema seria algo que lembra o principal argumento contra o Uber: a “clandestinidade”.

Não chega a ser novidade, vez que a clandestinidade afeta de maneira generalizada toda a economia e cresce na mesma medida em que a crise se agrava.

O aperto da atividade começou há cerca de um ano, segundo os proprietários de agências. O movimento caiu drasticamente, entre 70% e 80%. Com o número de corridas baixo, os motoqueiros têm duas opções: sair da agência e tornar-se clandestino também ou trocar de profissão.

A primeira opção tem incomodado os donos de agência. Sem regularização, os mototaxistas clandestinos não pagam impostos e não têm custos como aluguel e telefone, de acordo com a proprietária da agência Concha Ivone, Ivone Mariano.

“Eles atrapalham que vocês não fazem ideia. Eles ficam nas ruas principais, onde tem bastante movimento, e usam coletes iguais às das agências, o que pode confundir o cliente”, reclamou.

Os pontos onde os mototaxistas clandestinos ficam, segundo a empresária, localizam-se no Mercado Municipal e na rua 11 de Agosto. “Só na vila Angélica, aqui perto da minha agência, tem umas três agências clandestinas”.

A proprietária reconheceu que o incômodo com os clandestinos aumentou à medida que o mercado esfriou. “Antigamente, tínhamos mais de 1.300 corridas por dia. Conforme foi aumentando o número de agências, a divisão foi diminuindo. Hoje, não passa de 300 corridas diárias”, disse Ivone.

Nos tempos de maior atividade, o número de motos na agência de Ivone era de 60, sendo que 45 delas rodavam durante o dia e as outras 15, à noite. Atualmente, o número total é 25, dia e noite.

Mas, como se não bastassem os atuais desafios econômicos, a profissão ainda não consegue escapar de outra preocupação constante: a violência.

O mototaxista Rubens Dario Paiz, por exemplo, conta ter sido vítima da criminalidade. Há dois anos, ele atendeu a uma corrida noturna, de um homem que queria ir para a cidade de Bofete, município distante 66 quilômetros de Tatuí.

O cliente afirmou morar na zona rural, próximo à rodovia Castello Branco. “Andamos em uma estrada de terra e, nisso, percebi que ele estava tramando algo, pois nunca chegava ao lugar onde ele morava, sempre pedia para andar mais”, contou.

Em determinado momento, Paiz e o passageiro pararam no meio do canavial, para que o cliente fizesse uma ligação à mãe. Foi quando o ladrão anunciou o assalto. “Percebi que estava armado com uma faca. Chegamos a lutar no meio do escuro, ele conseguiu pegar a moto e foi embora”.

A viagem de volta foi difícil. Sem moto e no escuro, o motociclista caminhou por alguns quilômetros até à SP-280, quando conseguiu sinal da rede de telefonia móvel e ligou para a mãe.

Algum tempo depois, quando Paiz estava em Tatuí registrando boletim de ocorrência, chegou a notícia da delegacia de Bofete: o ladrão havia sido pego com a motocicleta.

“Minha irmã tinha ligado para a Polícia Militar de lá, para avisar sobre o roubo. Os policiais pegaram o ladrão negociando a minha moto por R$ 500. Levaram ele e o comprador para a cadeia”.

Como se observa, há situações mais críticas que as impostas pela crise nacional. Contudo, a despeito dos desafios inerentes a cada profissão, todas ainda estão sendo muito fustigadas.

O resultado disso, por sua vez, é outra perda generalizada, resultante da crescente informalidade. Os “clandestinos”, ainda que atuando, muitas vezes, por pura falta de outra opção, não recolhem impostos e, por consequência, contribuem com a perda de recursos públicos.

Com a arrecadação em queda, ainda menos as administrações podem agir, tanto para tentarem minimizar a crise quanto para cumprirem com suas obrigações básicas, em prejuízo à Saúde, Educação etc., etc., etc…

Ladeira abaixo, o país rola em meio a uma bola de neve que parece não parar mais de engolir empregos, empresas, patrimônios (grandes e pequenos) e, finalmente, as tão propagandeadas “conquistas sociais” somadas nos últimos anos.

Somente quando essa avalanche chegar ao fim, no fundo do poço da crise, será possível avaliar o tamanho do desastre causado ao Brasil pela política populista exercida durante esse suposto período de conquistas.