Brasil sufoca seu empreendedorismo

As empresas mais valiosas no mundo hoje não são mais as de petróleo, e nem a Coca-Cola ou GM, ou grandes conglomerados financeiros, mas as Amazon, Apple, Google e AliBaba do mundo, inexistentes há poucos anos.

A riqueza no século 21 depende do empreendedorismo e do conhecimento, e não mais de uma fábrica ou de um bom ponto de comércio, ou no passado distante, da mais forte Armada. A Apple é emblemática: o seu valor vem do design, do marketing, da inovação “made in America” por muitos cérebros estrangeiros, e não mais das fábricas que, por sinal, estão na Ásia.

Empreendedorismo gera empregos e impostos, e é encontrado em todo lugar. Faz parte do espírito brasileiro, está no sangue dos barraqueiros da praia, na Embraer, nas minúsculas fábricas de lingerie ou de doces, na Natura, nos sojicultores, nas pousadas e seresteiros em Conservatória (RJ). Ou nos músicos e estúdios de gravação de Goiânia e de Tatuí, de onde um dia talvez saia uma Spotify brasileira. Por que não?

Aliás, música e turismo são indústrias do futuro que o Brasil não explora como poderia.

O empreendedorismo floresce mais sob o liberalismo econômico, facilmente comprovável na história mundial, mas somente aplicado no Brasil em 7 dos 129 anos da nossa República, ou seja 5% do tempo.

O liberalismo econômico só teve vez mesmo em 1899-1902 (com Joaquim Murtinho, no governo Campos Salles) e em 1964-1967 (com Roberto Campos, Otávio Gouveia de Bulhões, e Eugênio Gudin). O curto governo Collor, por ter começado com um confisco, não deve ser considerado liberal. A privatização de 20 anos atrás do sistema Telebrás foi uma reversão inevitável na tendência estatizante de 30 anos, protagonizada pela social democracia brasileira, governo por definição não alinhado com o liberalismo econômico com redução de impostos, como Thatcher no Reino Unido e Reagan nos EUA.

A criação de empregos gera muito mais arrecadação que um aumento de impostos. Um gerente com salário de R$ 10 mil leva para casa no máximo R$ 7.500, mas sabe-se que custa ao empregador pelo menos R$ 20 mil. Assim, para cada R$ 1 que esse gerente pode gastar com plano de saúde, seguro, aluguel, IPTU, supermercado e posto de gasolina (pagando um imposto sobre vendas entre os maiores do mundo), outros R$ 1,67 ele não tem a sensação que recebeu. Parte desses R$ 1,67 vão para o governo se financiar: INSS, FGTS (devolução lá na frente com juros reais negativos) e Imposto de Renda na fonte. Ou seja, ao invés do dinheiro circular, fica na mão do governo, impedindo que a economia empreendedora gere mais empregos.

Analisar significa “estudar as partes de um todo”.

Assim, na leitura abaixo foquemos apenas no puro aspecto econômico, e esqueçamos a devida, e inacabável, discussão política e social sobre os governos militares.

Com a “morte” de Castello Branco em 1967 e a assunção da linha dura, a coisa desandou, iniciando-se o período ditatorial mesmo, incluído aí o estatismo, que se demonstrou ineficiente, vide o nosso sistema Telebrás. Chegou-se a pagar por uma linha o valor de um carro, criando até um mercado único, jabuticaba, no mundo: aluguel de linhas. Empreendedorismo brasileiro.

Há 54 anos, Gudin, Bulhões e Campos fizeram uma reforma liberalizante para valer. Em consequência, houve um boom econômico nos anos seguintes, exemplificado pelos incontáveis prédios dos anos 70 em São Paulo.

Criaram um sistema de crédito digno do nome, o Banco Central, o FGTS, o Estatuto da Terra, o Banco Nacional da Habitação, o salário-educação, a reforma fiscal e um novo Código Tributário. Liberalizaram a lei de remessas de lucros e escreveram artigos da Constituição de 1967, que, nas palavras de Campos, foi “a constituição menos inflacionista do mundo”, controlando os gastos públicos da União.

Pelas criações acima, vê-se que quando o liberalismo imperou por uns anos, não houve destruição do suporte assistencialista do Estado, mas uma racionalidade que permitiu o Estado se manter sem déficit, e assim desempenhar suas funções sociais essenciais, e criar as bases para o crescimento dos anos seguintes.

Mas, a partir de 1968 remamos, nesta grande canoa chamada Brasil, com o remo só do lado esquerdo da embarcação, com a utopia de que o grande (e ineficiente) Estado é capaz de tudo, uma ideia sabidamente ultrapassada, vide a semifalência das economias soviética, cubana, norte-coreana e chavista, e das “nossas” empresas controladas pelo governante de plantão Sete Brasil e Petrobrás.

Remando a canoa só de um lado, ela dá volta e quase não sai do lugar, e incrivelmente, a gente fica surpreso. Os tributos, como percentagem do PIB, só aumentaram, até o limite em que chegamos.

Não houve uma real e saudável alternância de política econômica nessas últimas décadas. Remamos somente com o remo esquerdo.

Há 30 anos, Campos sentia-se como o único Constituinte a defender a economia de mercado.

Esperemos que o novo Congresso esteja atento e recupere parcialmente o atraso dos últimos 50 anos em que o Brasil perdeu várias posições em termos de produtividade, empregos e crescimento.

Que descentralize as receitas para os municípios, onde podem ser melhor acompanhadas pelo cidadão, e ajude o empreendedor brasileiro, aquele ente realmente capaz de gerar riqueza, impostos e os tão necessários e urgentes empregos neste país.

Acreditemos no empreendedorismo do brasileiro! Alternemos! Liberalismo econômico, mas claro, com responsabilidade social!

* Cursou engenharia de produção (Poli-USP), direito (Cidade, RJ) e mestrado em administração (FGV-Eaesp e Stern/New York University). Ex-diretor, gerente ou consultor para empresas multinacionais e nacionais, e ex-professor de estratégia da BSP-Business School São Paulo.

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