Apodet sedia encontro dos 27 anos de atuação da associação na cidade

Coordenador projeta crescimento do número de atendidos para este ano

Encontro comemorativo na sede da associação (Foto: Juliana Jardim)
Da reportagem

Na manhã de quinta-feira, 11, a Apodet (Associação das Pessoas com Deficiência de Tatuí) comemorou 27 anos de atuação na cidade com um encontro na sede da instituição.

Com direito café da manhã e bolo, os assistidos pela entidade, familiares e funcionários souberam um pouco mais sobre a história da associação, das dificuldades e das conquistas ao longo desses anos.

O coordenador da associação, Vade Manoel Ferreira, definiu as décadas de trabalho da instituição como “um milagre”.

Ele contou que, no final de 2020, quando assumiu o cargo de coordenador, as então presidente e vice anunciaram que, “do jeito em que a associação se encontrava, ela iria fechar”.

E foi a partir desse diagnóstico que, segundo Ferreira, a equipe foi em busca de ajuda, mesmo sem recursos.

“Deus ia abençoando, e as pessoas foram aparecendo e ajudando. Então, podemos descrever isso como um milagre”, acentuou Ferreira.

“Este momento de hoje é importante, principalmente pelo número de pessoas que nós tínhamos aqui, demonstrando a credibilidade que passamos a ter dentro da nossa cidade”, acrescentou.

Ele sustentou, também, ter sido por meio da visibilidade e dos trabalhos realizados pela entidade que a sociedade “mudou a percepção diante das pessoas com deficiência”.

“Antes, as pessoas não queriam mais saber da gente. A Apodet passou por uma porção de problemas, muitas dificuldades, questões administrativas. Então, hoje, podemos falar que é um milagre chegarmos até aqui”, salientou.

Francelina de Fátima Martins foi uma das responsáveis por insistir na permanência da Apodet em Tatuí. Ela relatou ter sido “uma luta para que a instituição não fosse fechada há quatro anos”.

E, mesmo sem condições financeiras, Francelina foi muito além do alcance dela na época. Deficiente visual, ele sobrevive com recursos da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas) e contou que, mesmo não tendo dinheiro para sustentar-se, chegou a pagar os custos da entidade, como aluguel, água e luz.

Ela ainda relembra ter dormido, por diversas vezes, na sede da associação, por não ter dinheiro para voltar para a casa. Além disso, sustenta, as dificuldades “ultrapassaram as portas da entidade”, dizendo não ter sido bem aceita nos pedidos de ajuda.

“Não fomos bem-vistos. Havia uma turbulência em cima da Apodet. Então, não tínhamos muito êxito. Foi muito difícil para nós”, reiterou. No entanto, garantiu que nunca pensou em desistir, mesmo após ter recebido propostas do poder público para desistir do trabalho junto à entidade.

“Sempre me apegava a Deus, e não iria desistir. Iria lutar para ela (Apodet) não fechar as portas, porque, se fechasse, não abriria mais”, enfatizou.

Atualmente, segundo ela, é “uma alegria e honra ver a Apodet de pé”. “Hoje, sou apenas visita da Apodet, mas com a sensação de dever cumprido”, emendou.

A assistida Cieusa Maria Arruda relatou que ter perdido a visão há sete anos foi o momento mais difícil da vida dela. E que só encontrou um “novo sentido” quando conheceu a entidade.

“Saí daquele quadro de coitadinha ouvindo os testemunhos de cada uma das pessoas que conseguiu continuar vivendo, e feliz. Comecei a pensar a vida de uma outra forma e a me adaptar”, relatou.

Ela contou que, frequentando os cursos promovidos pela associação, já aprendeu braile (sistema de leitura por meio de pontos em relevo) e a usar bengala, mesmo que, segundo ela, de “forma não profissional”, por orientações dos próprios assistidos.

Entretanto, os encontros semanais com os integrantes contou ser o que mais lhe agrada. “A amizade, conversar e colocar o papo em dia, além da troca de experiência, é muito bom”, comentou.

Conhecendo a Apodet pela primeira vez, Renato Picoli ainda se emociona ao falar sobre a esclerose múltipla que o deixou em cadeira de rodas há dez anos.

Ele conta que tenta disfarçar a deficiência com bom-humor. Logo ao chegar no evento, ao tentar subir a rampa de acesso da calçada, ele caiu da cadeira de rodas motorizada, mas não se abalou.

Depois, ao tentar manobrá-la, “atropelou” uma pessoa atrás dele. “Viu só? Ainda não me adaptei na direção dela. Só nesse pouco período, já causei dois acidentes”, comentou, rindo da situação.

Picoli se autodefine como “sarrista”, e contou ter de se policiar para não brincar demais com pessoas que não estão acostumadas com o jeito dele. “Se eu não for expulso daqui (da Apodet), começarei a frequentar os encontros”, acrescentou.

Ex-motorista do resgate da cidade de Capela do Alto, Picoli contou que a resiliência é lema de vida dele. “Deus enviou-me para salvar vidas para que eu pudesse conhecer de perto uma realidade difícil e, a partir dela, preparar-me para o que viveria anos mais tarde”, relatou.

Apodet

A Apodet atende atualmente 60 pessoas com algum tipo de deficiência e, segundo Ferreira, é uma associação que tem como objetivo a não segregação. “Aqui, temos o propósito de atender todos os tipos de pessoas com deficiências”, contou.

Com um número cada vez maior de assistidos, ele projeta o desejo de que a entidade tenha sede própria e maior, por necessidade. E pretende, para este ano, dobrar o número de assistidos.

“Hoje, nosso espaço está se tornando pequeno pelo número de pessoas que temos trazido para a associação e pelo número de pessoas com deficiência que temos também dentro da cidade”, relatou. Além dos 60 integrantes, a entidade atende cerca de 43 pessoas sem deficiência, em palestras e grupos de apoio.

“Nosso pensamento a médio e longo prazos é ter uma sede própria, um lugar bem mais amplo, onde possamos ter um salão de eventos e tudo o que precisar para podermos fazer com que a pessoa com deficiência venha a se envolver e ser capacitada para ter uma vida de qualidade, voltar ao mercado de trabalho, terminar os estudos e, também, é claro, constituir família”, reforçou.

A Apodet, atualmente, sobrevive de ajuda por meio de doações, campanhas e de um bazar permanente, o qual Ferreira diz “ajudar demais” nas contas mensais.

Qualquer pessoa pode ajudar na manutenção da entidade, por meio da campanha “Vista Esta Camisa”. Nela, os interessados podem realizar doação mensal de no mínimo R$ 20, e todos que doam recebem de presente a camiseta alusiva à campanha.

“Aumentamos muito a nossa despesa no ano passado.  Não digo nem despesa, mas investimento, porque, quando você fala da questão de recursos humanos, nós vemos como investimento”, salientou. O resultado, porém, é que a associação tem gastado mais do que arrecada, gerando déficit nas receitas mensais.

“Estou indo até os empresários, comerciantes, pessoa física também, para que nos ajudem, tornando-se um patrocinador, e, assim, consigamos nos manter. Nosso pensamento ainda é profissionalizar outras áreas da associação. Por isso, precisamos muito de novas pessoas para contribuir”, concluiu.

A presidente da Apodet, Sandra Lya Fiori da Silva, apontou a associação como um “instrumento especial na participação da vida das pessoas, levando a elas uma nova maneira de viver”.

Ela contou que, por ser cadeirante, sabe da importância de as pessoas com deficiência serem assistidas pela entidade. “Nós temos palestras que são motivadoras, conhecimento voltado às pessoas que precisam arrumar emprego. As ações dão um horizonte para cada pessoa com deficiência”, sustentou.

Ela contou, ainda, que muitas delas chegam “meio para baixo”, entretanto, quando começam a participar ativamente das ações, notam a mudança e assumem uma “nova maneira de enxergar a vida”.

“Eles (os assistidos) vão abrindo novos horizontes. Notamos que vão tendo desenvolvimento e começam a se desenvolverem na vida, completamente. Falo por mim mesma também”, relatou.

Sandra reiterou a necessidade de engajamento da associação em políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência. E comemora, embora de forma ainda pequena, a acessibilidade dada a esse público.

“Nós queremos que Tatuí seja conhecida como uma cidade que tem acessibilidade. Sei que não é de uma hora para outra, mas é preciso um novo olhar para a pessoa com deficiência, fazendo com que visitantes de outras cidades venham para cá sabendo que temos acessibilidade”, salientou.

Ela concluiu dizendo que, embora as dificuldades enfrentadas ainda sejam muitas, é preciso focar nas ações que estão acontecendo.

“Sempre falo aqui na Apodet que o carvão é diamante que não desistiu. Se ele aguentar o processo de aquecimento pelo qual passa, ele vira um diamante. Então, nós precisamos lutar todos os dias para que as coisas aconteçam”, concluiu.