A tática das desomenagens

José Renato Nalini *

Já escrevi mais de uma vez sobre a “tática das homenagens”. O costume brasileiro de conceder diplomas, medalhas, condecorações. Muitas são válidas. Mas o exagero é algo que tira o mérito. Pois basta alguém assumir um cargo e lá vem a pletora de eventos para prestar reverência…não exatamente à pessoa, mas ao cargo.

Por isso é que as cerimônias se repetem a cada troca de guarda. É aquilo que em França eles fazem questão de contar para os futuros juízes, na Escola Nacional da Magistratura. A fábula do asno que carrega relíquias.

Ele se impressiona com a genuflexão das pessoas enquanto passa na procissão e pensa que ela se faz para ele e por ele. Quando volta ao estábulo e é espancado, estranha. Não atinou que o afago era para as relíquias. No nosso caso, o agrado é para o cargo. Para a função. Não propriamente para quem a exerce – a função – ou o ocupa – o cargo.

Mas agora entrou na moda também a “desomenagem”. Nem existe essa palavra. Mas, depois de entregar o título de Doutor honoris-causa a um Ministro da Educação – enquanto ele era Ministro – resolve-se voltar atrás e desconsiderar a outorga. É uma revisão da história. O Ministro teria apoiado o AI5, um ato bem arbitrário, violento e ditatorial.

Qual o sentido desse ato? Esquecem-se os detratores de que os romanos nos legaram, entre outros brocardos, o “mors omnia solvit”. A morte põe fim a todas as futilidades e mesquinharias humanas.

É a mesma tolice de se queimar Borba Gato, de se derrubar estátuas, proibir a leitura de Monteiro Lobato porque é racista e de todas as formas usuais de se aplicar a cultura presente a uma era em que ela era outra.

Concordo com Elio Gaspari quando, no texto “Valentia incompleta” sugere que se apure quem teve a ideia de outorgar o título, para impor igual sanção. Quem teria a coragem de suspender – se estiver ainda em atividade – ou de cassar a aposentadoria dos responsáveis por essa láurea?

Tanto a fazer para que o Brasil retome o rumo de uma Nação civilizada, deixando de extinguir nossas florestas, oferecendo saúde e educação de qualidade para os milhões de crianças e jovens sem perspectiva e perde-se tempo com desomenagens. A quem não pediu que ela lhe fosse prestada e que está morto há tempos.

* Reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e presidente da Academia Paulista de Letras – 2021-2022.