Nomofobia: o medo de “ficar sem o celular”

Em artigo divulgado à imprensa nesta semana, o professor Wilson Candido Braga, especialista em transtornos mentais em crianças e adolescentes, apresenta questões urgentes a serem observadas, debatidas e virem a pautar medidas práticas para, em resumo, buscar redirecionar as crianças e os adolescentes a um futuro “presencial” menos obscuro.

Sim, é redundante há tempo reconhecer que a tecnologia trouxe avanços incalculáveis, mas também impôs desafios na mesma proporção, principalmente no ambiente escolar.

A recente decisão do Ministério da Educação (MEC) de proibir o uso de celulares nas escolas, nesse sentido, é uma medida necessária para conter o impacto negativo que esses dispositivos vêm causando na aprendizagem e no desenvolvimento social dos estudantes

Embora essa transição exija adaptações, não há dúvida de que ela representa um avanço na busca por um ambiente escolar mais saudável e produtivo.

Braga é um dos que reforçam a urgência desse debate. Ele alerta para um problema cada vez mais presente: a nomofobia – o medo irracional de ficar sem o celular.

Essa dependência, além de prejudicar o aprendizado, tem consequências emocionais severas, tornando os jovens cada vez mais ansiosos, impacientes e desconectados do mundo real, aponta o estudioso.

Não é novidade que o uso excessivo de celulares em sala de aula prejudica a concentração dos alunos. Distraídos com redes sociais, jogos e mensagens, muitos deixam de absorver o conteúdo lecionado. Mais grave ainda, a exposição constante às telas altera a forma como o cérebro processa informações, tornando a leitura prolongada e a análise crítica mais difíceis.

Como também lembra o professor Braga, a luz azul emitida pelos dispositivos ativa áreas do cérebro responsáveis pelo prazer imediato, criando um ciclo vicioso semelhante ao observado em dependências químicas.

“Essa estimulação constante reduz a capacidade de atenção e aumenta a necessidade de gratificação instantânea, fatores que dificultam o aprendizado e a assimilação de conteúdos mais complexos”, acentua.

A escola deve ser um espaço de aprendizado e socialização, e não um prolongamento das distrações digitais que já dominam a vida dos jovens fora das salas de aula.

A proibição dos celulares oferece uma oportunidade para se restaurar a atenção plena ao ensino, resgatando o papel central da educação na formação de cidadãos críticos e preparados para os desafios da vida adulta.

Os efeitos do uso desenfreado de celulares, entretanto, vão além do desempenho acadêmico. O professor Braga observa que a nomofobia está diretamente relacionada ao aumento dos níveis de ansiedade e estresse entre os adolescentes.

Jovens que passam horas conectados a seus dispositivos apresentam maior dificuldade em lidar com frustrações e tendem a ser mais intolerantes à espera e ao esforço prolongado. A proibição do celular nas escolas também pode ser vista como uma medida de saúde pública, portanto.

Atualmente, não são raros os casos de adolescentes que enfrentam crises de abstinência digital, manifestando sintomas como sudorese, irritabilidade e até taquicardia quando afastados de seus dispositivos.

“Essa situação exige um acompanhamento psicológico dentro das instituições de ensino para auxiliar na transição para um ambiente escolar mais equilibrado”, defende o professor.

Além disso, o uso excessivo de celulares contribui para o isolamento social. Os momentos de intervalo, que antes eram dedicados à conversa, ao convívio e à construção de relações interpessoais, passaram a ser dominados por “interações digitais superficiais”.

Ao limitar o acesso a esses aparelhos dentro do ambiente escolar, há a possibilidade de se resgatar a interação genuína entre os alunos, reforçando habilidades socioemocionais essenciais para o futuro deles.

Por outro lado, o educador argumenta que a proibição do uso de celulares nas escolas pode ser ineficaz se não for acompanhada por uma mudança de mentalidade também dentro das famílias

Braga aconselha que os pais devem estar atentos à forma como a tecnologia é utilizada em casa. “Se a escola proíbe o celular, mas em casa os pais permitem que os filhos passem horas seguidas diante das telas, estamos criando um paradoxo”, alerta.

A escola tem um papel fundamental nesse processo, mas a família é peça-chave para consolidar novos hábitos. Os pais devem incentivar atividades que promovam o desenvolvimento cognitivo e social dos filhos, como a leitura, os esportes e a convivência presencial.

Somente com essa parceria entre escola e família será possível minimizar os impactos negativos da transição e garantir que os alunos desenvolvam uma relação mais saudável com a tecnologia, reitera o professor.

A resistência inicial à proibição dos celulares é compreensível, mas é preciso enxergar essa mudança como uma oportunidade de reestruturação do ambiente escolar.

As instituições, segundo o educador, poderão reforçar metodologias de ensino mais dinâmicas, explorando o uso de materiais didáticos impressos, promovendo atividades que estimulem o pensamento crítico e incentivando a participação ativa dos alunos nas aulas.

Além disso, é essencial que as instituições contem com psicólogos e pedagogos capacitados para lidar com o impacto emocional da retirada dos celulares. Como enfatiza Braga, “a transição precisa ser acompanhada de suporte adequado, garantindo que os alunos desenvolvam habilidades para lidar com a ansiedade e a necessidade de gratificação imediata”.

O avanço tecnológico é irreversível, mas isso não significa que a escola deva se submeter incondicionalmente às distrações digitais. A proibição do uso de celulares no ambiente escolar representa um passo crucial para valorizar a qualidade do ensino, proteger a saúde mental dos alunos e fortalecer as interações sociais dentro das unidades.

A medida exige comprometimento de educadores, pais e alunos, mas seus benefícios serão concretos. Ao limitar o uso de celulares, cria-se um ambiente mais propício ao aprendizado, ao desenvolvimento de habilidades cognitivas e ao fortalecimento de laços interpessoais – aspectos fundamentais para a formação de cidadãos preparados para os desafios do mundo contemporâneo.

A sociedade precisa compreender que a educação de qualidade não pode ser refém da tecnologia. O equilíbrio entre o mundo digital e o real deve ser ensinado desde cedo, e a escola é o espaço ideal para iniciar essa transformação.

“Se queremos um futuro com indivíduos mais críticos, resilientes e socialmente engajados, o primeiro passo é garantir que o conhecimento e a convivência prevaleçam sobre a distração e o imediatismo”, aconselha o estudioso.

Braga é graduado em terapia ocupacional, biologia e pedagogia. Especialista em saúde mental, atendimento educacional especializado (AEE), e, entre outras várias capacitações, possui mestrado em psicologia infantil e adolescente, em ciências da educação e educação especial.

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