Crise para empresas familiares





Neste momento em que a crise nacional envolve economia, política, negócios, moral e valores, no meio empresarial, o maior desafio de ajuste e sobrevivência é o das empresas de controle e gestão familiar. A perenidade de uma empresa depende de como seus acionistas lidam com três fatores: valores, capital e gestão, cada um com seus desafios próprios. Valores devem ser cultivados, transmitidos e constantes; já capital e gestão, adequados, estruturados, capacitados, profissionais e mutantes.

Aí começam os problemas. A empresa familiar tende a olhar os três fatores pelo espelho retrovisor da história, quando só o primeiro – valores – deveria ser objeto disso. Os outros dois mudam pela tecnologia, pelo mercado, pela concorrência, pelo custo do dinheiro, enfim, pelo inexorável andar da vida e do mundo.

Manter adequadamente sólida a estrutura de capital dessas empresas não é fácil. Com o tempo, a inexorável pulverização do capital dificulta o aporte de recursos pelos acionistas. Por outro lado, hábitos, visões antigas e barreiras culturais tendem a bloquear a alternativa de atração de novos acionistas externos. Ajustar a gestão é outro campo minado. Requer visão e definições estratégicas e de objetivos, separação entre propriedade e gestão, consideração e avaliação de perfil e capacidade dos executivos, em uma realidade mutante, que pode tornar obsoletos profissionais, estruturas organizacionais, modus operandi, produtos etc. Demanda ainda isenção, profissionalismo e determinação realística nas decisões, um somatório raro na cúpula das empresas familiares.

As inevitáveis sucessões de patrimônio, capital e de gestão, salvo quando feitas com a devida tecnicidade aplicável a esses temas, tendem a dispersar interesses e focos societários e empresariais, prejudicando ou até impedindo uma unicidade e afinidade estratégica e tática imprescindíveis em cenários de crise. Isto torna necessária a separação entre família, propriedade e gestão – o tripé das empresas familiares. No almoço de domingo, se trata da gestão, cuja má performance respinga na sociedade e no patrimônio, fontes de desconfortos ou litígios que desestruturam a família, redundando num verdadeiro círculo vicioso da dor, cujo final é a dilapidação de seu patrimônio ou morte da empresa.

Em contrapartida, as empresas multinacionais e as profissionalizadas, que têm processos de sucessão definidos e consolidados, sofrem menos em uma crise. Não sofrem a interferência do fator emocional “família” e, por outro, nas dimensões societárias e de gestão, geralmente possuem mecanismos de ação e controle compatíveis com os princípios e práticas de governança corporativa, tais como conselho, comitês, auditoria, planejamento etc. O acesso a novos recursos, creditícios ou acionários, também é normalmente mais fácil.

Já nas empresas públicas, a crise é notoriamente pouco levada a sério ou mesmo considerada, pois seus efeitos pouco ou nada as afetam. Nem os gestores que as dirigem, bem como a entidade teórica, etérea e intangível chamada Estado que as abriga. Suas contas são repassadas aos verdadeiros mas inconscientes acionistas com pouca ou nenhuma capacidade de opinião, ação ou reação: os contribuintes e cidadãos.

* Fundador e presidente da Strategos – Consultoria Empresarial e da Orchestra – Soluções Empresariais.