Marcelo Válio *
Recentemente, o prefeito Orlando Morando, da cidade de São Bernardo do Campo, durante a transmissão de uma live nas redes sociais, defendeu que “pessoas que se recusam a tomar a vacina no dia serão submetidas para o fim da campanha de imunização, ou seja, depois do último adulto de 18 anos na fila”.
Assim como o prefeito de São Bernardo, chefes do Poder Executivo de outras cidades também adotaram o mesmo procedimento.
Orlando Morando alegou ainda que “não se vacinar é um direito seu, ninguém faz nada obrigado. Mas também é um direito nosso te colocar no fim da fila porque tem a vacina, você não vai tomar porque não quer. Escolher vacina nós não vamos permitir. Tem tanta gente esperando a vacina, ansioso, e aquele que tem o direito simplesmente fala: não vou tomar vacina, essa eu não quero. Então, se você não quer tomar vacina, é um direito seu.”
Respeitosamente ouso discordar em parte do digníssimo prefeito.
O posicionamento do chefe do Poder Executivo da cidade de São Bernardo do Campo de “não tomar vacina” é o direito do indivíduo é equivocado, pois quando falamos de uma pandemia, em regra, o interesse público se sobrepõe ao particular e, assim, um indivíduo quando se recusa a se imunizar coloca a coletividade em risco.
Assim, é possível impor medidas a esse infrator pela não vacinação e não pela opção de escolha da vacina. A recusa em se vacinar é uma forma de afetar a sociedade e, assim, não proteger seus pares, podendo ser punido no caso.
Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em dezembro de 2020 deu aval para que os governos locais estabeleçam medidas para vacinação compulsória da população contra a Covid-19 e que a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios estabeleçam medidas legais pela obrigatoriedade, mas sem poderem determinar a vacinação forçada.
Assim, observa-se que não foi autorizada punição aos indivíduos quando desejam escolher a vacina a tomar.
Se negarem expressamente a se vacinar, independente da vacina, aí é possível a eventual punição.
Mas quando a pessoa não se recusa e tenta ser imunizada pela vacina de sua escolha não está se recusando, mas tentando optar por aquela que mais confia.
A opção não é equiparada a recusa, e não pode ser objeto de punição.
Assim, a punição do optante da vacina ao final da fila de vacinação é equivocada e está em desacordo com a referida decisão do Supremo Tribunal Federal.
Tentar se vacinar no seu período de vacinação através da vacina de sua escolha é um direito do indivíduo, mas não uma obrigação do poder público.
Entendemos que, se passado o prazo de sua vacinação ou prioridade, é possível o indivíduo só poder se imunizar após os demais em seus respectivos momentos.
Enfim, se vacinar é uma obrigação e optar pelo tipo da vacina é um direito de opção, não de exigência do indivíduo frente ao órgão público, bem como, se ultrapassado o lapso temporal de vacinação daquela faixa etária ou prioridade, aí sim poderá o indivíduo ser deslocado para o final da fila de vacinação.
* Professor pós-doutor, especialista em direito constitucional, em direito público, mestre em direito do trabalho, doutor em filosofia do direito, pós-doutor em direito pelo Universidade de Messina (Itália) e pós-doutorando em direito pela Universidade de Salamanca (Espanha), e referência nacional na área do direito dos vulneráveis.