Há exatos dois meses (entre os dias 9 e 15 de janeiro), a enquete promovida pelo jornal O Progresso em seu portal de notícias (www.oprogressodetatui.com.br) apontou um resultado tão alarmante quanto absurdo para a questão: “Você pretende se vacinar contra o novo coronavírus?”.
Naquela ocasião, 32% dos participantes assinalaram a resposta “não” – o que, se levada a efeito, implicaria na ineficácia da campanha de vacinação, vez que, para se alcançar a tal imunidade de rebanho (ou coletiva), é necessária a vacinação em pelo menos 70% da população.
A se considerar esse resultado, seria natural a conclusão de que, simplesmente, Tatuí “está perdida” – tanto em doença quanto em desinformação, seguindo na procissão macabra de mortes desenfreadas, desemprego crescente e falências generalizadas (lembrando, no país todo, estas pestes estarem atreladas umas às outras).
A ignorância não tem e nunca teve nada de santa, a despeito da ingênua expressão tradicional. Neste momento, com fé cega no negacionismo e inabalável em insensibilidade, está é sendo fiel – ainda que inocentemente – a um rosário golpista que, já de forma indisfarçada, pouco se importa com a vida da população.
Portanto, “graças a Deus” e a certa onda de conscientização, promovida pela informação confiável, pela revalorização da “ciência” e, com certeza, pelo medo da morte, a alienação suicida parece estar arrefecendo rapidamente.
Evidência disto pode ser percebida pelo significativo decréscimo da rejeição às vacinas contra Covid-19, segundo a enquete desta semana. A pesquisa (enfim!) apurou que perto de 80% dos tatuianos já pretendem se vacinar quando tiverem a oportunidade.
A pergunta fora propositadamente repetida, claro, com o objetivo de comparar os resultados e na esperança de que, ao menos diante do nítido agravamento da pandemia, a população já estivesse mais consciente e sensibilizada. E está! Ótimo!
Esse afastamento à estultice a sustentar tanto as teorias conspiratórias quanto, por consequência, o oportunismo político, carrega a capacidade de, sim, não apenas salvar muitas vidas, mas garantir a sobrevivência da própria democracia no Brasil.
Neste último particular, porque, em meio às disputas já antecipadas às próximas eleições nacionais, o oportunismo pesando na balança a favor do negacionismo é o mesmo a negar a importância da democracia – o mesmo a desprezar o Estado democrático de Direito e a transparecer o apreço fanático pela desagregação, pelo autoritarismo e pela morte como solução para tudo.
Ao passo que a iminência da morte não assusta esse naipe de figura pública, tampouco a comove, a foice da Covid-19 avança implacável país afora na mesma velocidade com que se atrasa a vacinação tardia e atabalhoada – por responsabilidade das autoridades federais que, no futuro, ainda pode ser julgada como criminosa.
Não é exagero! Nesta semana, novamente, o país bateu recorde de mortes por Covid-19 em um único dia, na quarta-feira, 10, quando faleceram 2.349 brasileiros.
As seguidas marcas fatais destas semanas elevaram definitivamente o Brasil ao topo de mortes diárias no planeta e consolidou-o como uma nação pária, com a qual não se quer contato (inclusive para “investimentos”, obviamente).
Mais e mais fronteiras, dia a dia, estão sendo fechadas a brasileiros – cuja imensa maioria não se dá conta do problema, claro, porque precisa se preocupar em pagar contas, não em saber se será impedida de viajar para a Disney.
No entanto, a questão maior não é o desfrute dos mais abastados, senão o fato de que todos perdem, pois a nação por inteiro está sendo vista pelo mundo como um imenso laboratório a céu aberto de proliferação de vírus. E quem quer se aproximar disto?
E mais dramático ainda, enquanto a disseminação da doença e as mortes são reais e seguem adiante sem freio, a resposta do governo é a seguinte: “Chega de frescura, de mimimi”…
É aquela velha história: seria cômico se não fosse trágico… Ou seja, se você perdeu algum familiar ou amigo querido, “não seja maricas”!
Seria esta profunda ponderação de supermacho algo como um conforto para a dor? Ou seria indicação de atitude megamáscula, como, por exemplo: “Aproveite a flexibilização (das armas), compre uma pistola 765 e saia às ruas para matar algum bandidinho ‘pé de chinelo’. De repente, isto pode deixá-lo mais consolado”.
Por tantos absurdos e irracionalidades vivenciados pelo país, submeter-se à vacinação e apoiá-la de maneira contundente, neste momento, não apenas significa integrar um movimento a favor da vida – dos outros e da própria -, mas do bom senso, da educação e dos direitos individuais e coletivos que só a democracia garante.
Claro, ainda implica em mostra de humanidade – algo avesso ao grotesco avanço incivilizatório ainda a afetar parte da população; implica em zelo, preocupação de que doentes não venham a morrer necessariamente pela doença, que poderia ter sido tratada, mas por falta de leitos e oxigênio em UTIs.
Muitos sabem disto, por mais que ainda não o admitam. A realidade é cruel e alheia às opiniões – sobretudo às ideológicas -, jogando na cara de todos a superlotação dos hospitais no Brasil. E Tatuí não escapa à regra, mantendo sua única UTI pública com 100% de ocupação desde a metade da semana passada.
Em época tão terrível, quando uma pandemia devastadora impõe a necessidade de mudanças radicais no convívio entre todos, nos hábitos e nos cuidados pessoais, já se perdeu a esperança no aprendizado pelo amor.
Ao menos, agora, parece que, além da dor, a conscientização ganha força pelo medo – da morte! É triste, mas se isto servir para salvar vidas e a democracia brasileira, já podemos nos considerar no lucro.