Da reportagem
A escritora, artista plástica, pedagoga e professora aposentada Theresinha de Oliveira Pinto sugere que a realização de uma “experiência” para ocupar o tempo livre e a mente durante o período de isolamento social.
Em quarentena, devido à pandemia, a artista de 88 anos conta ter ficado “zanzando” pela casa dela, pensando na atual situação. Ela arrumou gavetas, colocou livros e revistas em ordem e, depois, recorreu à culinária, preparando cuscuz e doces de fruta para diabéticos.
O período na cozinha possibilitou que ela começasse a realizar um projeto, o qual denominou de “Covid-19 Versus Lazer”, dando início a um microjardim. “Sempre que encontro algum legume brotando, principalmente os usados diariamente, descasco-o e, depois, lixo!”, afirma.
“Porém, em meio à pandemia, peguei uma cebola começando a brotar e não a destinei ao lixo. Arrumei um copo de vidro e passei a observá-la, para acompanhar seu desenvolvimento”, completa.
Theresinha alojou o copo em espaço da área de serviço. Além da cebola, ainda havia um vaso de rosas e outro, de antúrio, candidatos ao lixo. Porém, ela resolveu cuidar dos três.
“As três plantinhas, bem cuidadas, pareciam retribuir com lindo crescimento, enquanto a pandemia já se alastrava em várias regiões do Brasil”, aponta.
Conforme a artista, a cebola deu um broto, crescendo quase um centímetro por noite. Após 15 dias, despontaram outros brotos. “Me parece ser uma família feliz, um casal e dois filhos. A cabeça de cebola parece ser a avó de todos, dando lição de consumir-se para que a família cresça saudável e feliz. É muito lindo ver essa cena de todos os dias, várias vezes por dia!”, destaca.
Em relação ao antúrio, “que ficara com apenas um galho, as folhas verdes, parecendo veludo, cresciam sem pressa de desabrochar”. Theresinha torce pelo nascimento de um antúrio vermelho.
“Confesso que ficarei tremendamente feliz, mas a natureza sabe o momento de nascer e crescer. Enquanto a cebola se desenvolve em um ritmo acelerado, as folhas de antúrio descansam placidamente”, indica a escritora.
O vaso de rosas foi adquirido em uma floricultura, há cerca de quatro meses. Após todos os botões murcharem, o vaso foi deixado em um canto. Durante a quarentena, ela conta que resolveu retomar o cuidado, porém, com pouca esperança.
A artista cortou os galhos secos, deixando somente um, que estava verde. Segundo ela, os cuidados e a água possibilitaram novas folhas e botões de rosa. “Durante o crescimento, fiquei atenta aos mínimos detalhes”, garante.
Por pelo menos três horas por dia, um vitrô com telas protetoras permanece aberto. Conforme Theresinha, “os minúsculos botões se desenvolveram em dois botões de rosas vermelhas e, após o crescimento total, em um espetáculo de beleza”. Os botões foram batizados com os nomes de Ana e Maria, a primeira lembrando a mãe de Maria e a segunda, a mãe de Jesus.
“É lindo! Em minha vida ‘superpreenchida’, nunca tivera chance de observar qualquer plantinha nascendo e se desenvolvendo. Era como um filme rodando lentamente! Tudo ia contribuindo ao minúsculo galho, demonstrando o mundo vegetal tão maravilhoso e extraordinário”, ressalta.
Ao lado do microjardim e horta, ela deixou uma batata-doce alojada em uma panela de ágata. A escritora garante que a raiz tuberosa correspondeu bem ao tratamento dela, ao crescer em um velho fogão de fogo de ferro, que também estava em uma “lista de descartáveis”.
“Pensei muito se deveria me desfazer do fogão ou esperar mais um pouco. Agora, posso repetir o velho ditado popular: ‘Nunca se perde por esperar’”, brinca.
“É maravilhoso o suporte da caçarola com o ramo da batata-doce brotada. Quebra a monotonia do ambiente, esbaldando folhas a granel”, destaca a artista.
Para ela, “a natureza oferece milhões de surpresas, contudo, o ser humano perde todo o espetáculo pensando em ganhos materiais, que causam um relâmpago de prazer e enormes frustrações. Quanta dor de cabeça inútil!”, reforça.
Theresinha sustenta que todos podem aderir ao projeto. “Se for possível, façam essa pequena experiência. Parece incrível que, deste mundo material, nos desperte para a imensidão do universo e de como somos imensamente ricos de tesouros que desconhecemos. Mergulhe e maravilhe-se com a natureza”, salienta.
“Quem diria, que neste tempo tão cheio de imprevistos devido à pandemia, esqueço-a por grandes espaços do tempo e quanto me volto totalmente àquele galho de roseira com dois botões abertos esbanjando vida e beleza”, expôs.
De acordo com ela, a experiência permite momentâneo distanciamento da pandemia e terá continuidade como projeto. Contudo, Theresinha ressalta a importância do esforço para conter o coronavírus e o respeito ao trabalho desempenhado pelos profissionais da área de saúde.
“Enquanto a natureza oferece vida, o coronavírus mata. É preciso muita colaboração e cuidado para extirpar o caos que assola nosso planeta. Viva a vida e guerra à pandemia!”, finaliza Theresinha.