PL 6.159: um perigoso retrocesso

João Raposo *

Praticamente tinha desistido de falar publicamente de política, pois infelizmente é um assunto que acaba gerando confusão, mas dessa vez não podemos de forma alguma ficar em silêncio, dadas as ameaças e consequências do projeto de lei 6.159/2019, assinado pelo ministro da Economia, Paulo Roberto Nunes Guedes.

Independentemente da sua posição política, aconselho a não deixar de se manifestar contra o PL 6.159, que retira a obrigatoriedade das empresas de contratar pessoas com deficiência.

O cidadão brasileiro pode inclusive demonstrar sua insatisfação publicamente, respondendo a uma enquete no site da Câmara dos Deputados, que trata do assunto, inserindo, também, sua própria opinião. Naquela página há a íntegra do projeto: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2230632

O fato concreto é que o Brasil é um país, de acordo com a história, bastante injusto socialmente, com grande concentração de riquezas e um profundo abismo social. Só as pessoas que têm, por exemplo, problemas físicos ou que convivem com elas sabem como é difícil a inserção de uma Pessoa com Deficiência” (PCD) no mercado de trabalho.

Até mesmo conseguir uma escola particular inclusiva é uma tarefa extremamente árdua (mesmo a lei obrigando a inclusão). Eu pessoalmente sofri com essa situação, quando constatavam que meu filho, João Victor, de sete anos, era autista, após visitarmos dezenas de escolas, onde sempre comunicavam cinicamente que “não tinham mais vagas”.

No mundo há algumas coisas que, lamentavelmente, só funcionam porque a lei obriga, e não se enganem, a contratação de PCD é uma dessas situações.

Um parecer da procuradora do Ministério Público do Trabalho, Janilda Guimarães de Lima, interpreta que a proposta em tramitação no Legislativo infringe convenção da ONU, principalmente porque a ideia prejudica substancialmente a vida das pessoas com deficiência, inclusive sem qualquer participação no projeto de lei de suas entidades representativas.

Entre outros pontos negativos, o texto suprime a cota de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, criando situações que dificultam a fiscalização do Ministério Público do Trabalho e dos Auditores Fiscais. O conteúdo impõe aos deficientes, mesmo que não tenham condições para tal, a obrigatoriedade de se reabilitarem ou habilitarem para suas atividades profissionais, e caso não consigam trabalhar de acordo com o interesse do empregador, podem não conseguir mais atuar no mercado de trabalho e perder seus benefícios.

Há também mais uma série de outras implicações no caso de o PL ser aprovado. As mudanças prejudicarão sobremaneira esses indivíduos, mas também as respectivas famílias das pessoas com deficiência. Na hipótese de que a lei seja assinada, esse universo de brasileiros ficará condenado a voltar a viver numa espécie de prisão domiciliar, como era no passado.

Seja você de direita, de esquerda, comunista, anarquista, liberal, enfim, seja lá o que você for, não fique a favor de um retrocesso absurdo desses. Esse projeto não pode passar em hipótese alguma!

* Advogado, pós-graduado em direito penal pela Universidade Mackenzie, com especialização em crimes financeiros pela FGV e curso intensivo de negociação pela Harvard Law School.