Em abril de 1992 aconteceu o primeiro ensaio. Em junho do mesmo ano, a primeira apresentação. Nascia o conjunto musical que, a partir dos resultados alcançados desde então, tornou-se único no Brasil.
Em seu 25º aniversário, a Banda Sinfônica do Conservatório de Tatuí comemora principalmente a continuidade de sua missão original: unir em um trabalho de ritmo profissional alunos e professores do Conservatório de Tatuí.
Inicialmente chamada de “Banda Sinfônica Semi Profissional do CDMCC” e regida pelo então diretor da escola, Antonio Carlos Neves Campos, o conjunto estreou nos palcos no dia 14 de junho de 1992, em um concerto no teatro “Procópio Ferreira”. A apresentação era em prol da Santa Casa de Misericórdia.
Na ocasião, itens como pratos, talheres, xícaras e aventais podiam ser trocados por ingressos. Conforme o programa daquele concerto, a primeira música apresentada formalmente pela banda foi “Deep River Rhapsody”, de Harold Walters.
Dos 49 instrumentistas que integraram o grupo na estreia, muitos eram alunos. Até então, o convite para tocar ao lado dos professores era algo inédito no Conservatório de Tatuí.
“Nessa formação pedagógico-artística, com remuneração, a Banda Sinfônica foi a primeira do Conservatório. A partir dela, a escola foi fazendo o mesmo com outros grupos”, relatou por meio de assessoria o trompetista e professor João José Xavier da Silva, integrante da primeira formação.
Acolher os estudantes e não só manter o padrão de excelência, mas buscar a evolução, tem sido o norte da Banda Sinfônica nos 25 anos. Dario Sotelo, responsável pelo conjunto desde 1993, afirma que ele vem evoluindo muito em virtude do repertório executado.
“No início, era desenvolvido um programa popular, a exemplo das outras bandas brasileiras. A ideia de expor o conjunto ao repertório internacional foi construindo essa evolução técnico-musical”, explicou.
Marcelo Afonso toca requinta na Banda Sinfônica desde a fundação e guarda boa memória dessa época de transição no conjunto. Ele lembra que a primeira obra escolhida por Dario Sotelo era uma sinfonia de Morton Gould.
“A gente não tinha muita noção do que era um repertório sinfônico, porque antes das mudanças, no passado, a banda tinha um cunho mais popular. O Dario veio com um trabalho mais sinfônico, porque ele estava em Londres, em contato com orquestras e bandas de lá”, comentou.
Pouco depois, o novo regente executou a “Terceira Sinfonia”, de Alfred Reed. “Foi uma coisa doida. É uma sinfonia difícil, mas de uma exuberância fantástica. A banda já começou a ter outra cara”, acrescentou Afonso.
A exigência que até os dias atuais aparenta ser dificuldade é tratada desde 1992 como oportunidade para os alunos. Segundo João José, ela ajuda muito no desenvolvimento dos instrumentistas.
“Temos passagens extremamente fortes, explosivas, para logo em seguida fazermos passagens líricas. Para tanto, o músico tem que ter um domínio de técnica instrumental muito grande”.
O foco sinfônico introduzido por Sotelo não significa que o conjunto tenha abandonado a música popular. São justamente as possibilidades sonoras mencionadas pelo trompetista João José que permitem à Banda Sinfônica do Conservatório de Tatuí transitar com muita liberdade e desenvoltura entre os dois gêneros.
Tecnicamente, a Banda Sinfônica é um conjunto de sopros e percussão. A característica principal é a presença dos naipes de madeiras, na qual se destacam a flauta, o oboé, o clarinete, o fagote e o saxofone; e do naipe de metais, com trompete, trombone, trompa, tuba, eufônio, entre outros. Aos instrumentos de sopro, somam-se os aparelhos de percussão, um universo variado que cresce ou diminui conforme a obra executada.
Sotelo ressalta que, como um conjunto completo, a Banda Sinfônica pode permear todos os estilos musicais, tanto o sinfônico quanto o popular. “A grande diferença de se fazer isso com um conjunto sinfônico e uma formação menor é exatamente a diversidade de sons que nós encontramos”, explicou.
Desta forma, dos mais de dez concertos anuais da Banda Sinfônica, dois costumam ser exclusivos do repertório popular. No dia 20 de abril deste ano, o conjunto executou programa com obras do compositor argentino Astor Piazzolla, obtendo excelente aprovação do público que lotou o “Procópio Ferreira”. “Ainda neste ano teremos um concerto só com música latina”, antecipou o regente.
Protagonismo
Muitos são os aspectos que colocam a Banda Sinfônica do Conservatório de Tatuí em posição de destaque nacional. Uma das principais faces do protagonismo é a encomenda de obras de compositores brasileiros – também preservando o equilíbrio entre os gêneros musicais.
De acordo com Dario Sotelo, em 25 anos houve mais de 120 encomendas, o que coloca o conjunto da escola como um dos principais incentivadores da produção de obras originais para bandas no país.
Dentre as encomendas, destaque para a “Sinfonia Nº 1”, de Edmundo Villani-Côrtes e a “Sinfonia Nº 1 (Sinfonia Anõia)”, de Sergio Vasconcelos Correa. “São duas obras icônicas. Mas há ainda Edson Beltrami, Hudson Nogueira, Ricardo Silva e tantos outros que escreveram obras originais para a Banda Sinfônica do Conservatório de Tatuí”, comentou o maestro.
Muitas das músicas encomendadas de compositores brasileiros foram documentadas, através da gravação de oito CDs e um DVD. “Isso também é importantíssimo. Existe no Brasil uma grande tradição das bandas militares, mas poucas gravaram música como nós fizemos”, ressaltou Sotelo.
Fora do Brasil a Banda Sinfônica também é reconhecida, tendo executado cerca de cem estreias brasileiras de repertório internacional. A mais recente é “Korn Symphony”, do inglês Peter Meechan, cuja estreia latino-americana aconteceu no dia 8 de abril, em Tatuí.
A próxima será “Menu”, do espanhol Carlos Pellicer, que a Banda Sinfônica executará no dia 1º de julho. “Alguns poucos conjuntos, de diferentes partes do mundo, apresentarão essa obra pela primeira vez e nós estamos entre eles”, explicou Sotelo.
Ainda no cenário internacional, o conjunto tatuiano tem notoriedade por ter se apresentado com alguns dos mais importantes regentes do mundo. É o caso de Frank Battisti, que trabalhou com Henrique Autran Dourado nos Estados Unidos.
Considerado o grande regente dos conjuntos de sopros, ele esteve em Tatuí como convidado de honra da Banda Sinfônica do Conservatório em 2011. Já em 2016, o conjunto recebeu Felix Hauswirth, tido como principal regente da Europa Central. “Assim haveria 20 ou 30 nomes de maestro consagrados que poderiam ser citados”, orgulha-se o titular da banda.
Vocação de ensinar
Na época da criação da Banda Sinfônica, o integrante mais jovem era Gerson Brandino, com apenas 13 anos. Dois anos antes, ele havia ingressado como aluno do Conservatório e, diante da oportunidade de integrar o novo conjunto, encontrou uma forma prática de aprendizado.
“Eu era o mais novo e tinha um pouco de medo de tocar. Ficava sentado lá na ponta, olhando para os professores das primeiras estantes e tentando tocar junto com eles”.
O trompista Rafael Proença é outro integrante do conjunto desde a primeira formação. Ele reforça o papel da Banda Sinfônica, desde o surgimento dela, como referência para os estudantes, inclusive para os que ficavam na plateia. “Naquela época, era difícil para os estudantes de Tatuí irem para a capital e assistir apresentações de grupos musicais”, contou.
Para o trompetista que ingressou com 13 anos, a oportunidade de estar no palco sustentou uma carreira profissional. “Na época, eu era aprendiz e hoje eu sou líder de naipe”, comentou ele, que se tornou professor do instrumento no Conservatório. “Eu acredito que esse sistema de trabalho seja o melhor para o aluno que está iniciando a carreira como músico profissional”, apontou.
Único clarone (clarineta baixo) da atual formação da Banda Sinfônica, Edevandro Bernabé tocava clarinete quando da criação do conjunto. “Logo no início eu comprei um clarone e o regente se interessou. Eu achei que fosse só para um repertório, mas estou tocando clarone até hoje”.
Da história de 25 anos, ele destaca o resultado proporcionado pela presença de alunos avançados e a orientação dos professores instrumentistas. “É muito bom ver esse encaixe que a banda proporciona”.
“No início foi uma fase de experiências. Era a primeira vez que a gente estava iniciando um grupo grande. Nós começamos do zero mesmo. Hoje a palavra é gratidão, por tudo que eu aprendi na banda como músico e como pessoa”, relatou o percussionista Agnaldo Francisco da Silva.
Assim como Brandino, Proença, Bernabé e Silva, Rafael Palaes (o popular Rambinho) integra o conjunto desde o início. Ele também começou como aluno e permanece até hoje na condição de músico profissional e professor.
Palaes afirma que um trabalho como o da Banda Sinfônica é muito difícil de ser encontrado em outro lugar do Brasil. “Hoje o nosso repertório é bem difícil e exige muito dos alunos e mesmo de nós profissionais. É realmente uma experiência profissional”, comentou.
“Muitos alunos saíram daqui prontos para sentar em qualquer grupo”, acrescentou Marcelo Afonso.
A continuidade do modelo de trabalho que marcou os primeiros 25 anos é o que o regente almeja para o futuro. “Além disso, espero que a Banda Sinfônica esteja sempre ligada à formação. Somos parte do Conservatório de Tatuí”, ressaltou o maestro.
O terceiro ponto que ele defende são os projetos ligados às escolas públicas. Neste sentido, também há resultados para se comemorar nos primeiros 25 anos.
As ações didáticas com o objetivo de aproximar a música clássica de crianças e adolescentes têm resultado em projetos de grande importância, tais como “Guia Para Banda”, “Villa-Lobos encontra Guarnieri”, “A Vinda da Família Real ao Brasil”, “Momo Precoce”, “Sonho de Criança”, “Stravinsky e seu ballet Petrushka”, “As Estórias de Tião”, entre outros. “São projetos em que há um trabalho prévio em sala de aula e posteriormente os alunos vêm ao teatro para assistir a um de nossos concertos”, explicou Sotelo. Uma nova ação do gênero acontecerá em setembro.
Em outra linha didática, a Banda Sinfônica consta como conjunto residente de diversos eventos nacionais e internacionais no Conservatório de Tatuí. Entre os mais importantes, as conferências latino-americanas em 2002 e 2004, com as principais bandas do Brasil.
Em 2014, dentro das atividades dos 60 anos da escola, realizou o Concurso Nacional de Composição para Banda, reunindo a estreia de 21 obras brasileiras. “Temos ainda o Seminário de Regência, que é um serviço técnico que a Banda Sinfônica oferece ao Brasil inteiro. Em 2016 houve 160 inscritos”, acrescentou Sotelo.
“Quer dizer: a dimensão daquilo que se ensina na Banda Sinfônica está em muitos estratos. Desde a atuação do aluno dentro do conjunto, no aprendizado dele ao lado dos profissionais e ainda na formação de plateia. A partir do momento que nós selecionamos repertório e o apresentamos, forma-se todo um ambiente musical em que a música de banda sinfônica será cada vez mais apreciada”, finalizou o maestro.