Em um século, Tatuí tornou-se (e o planeta) irreconhecível em muitos aspectos, sobretudo em sua urbanização; contudo, em outros, parece inalterada – da mesma forma que se observa no restante do mundo. E, certamente, porque a tecnologia pode evoluir, mas o ser humano segue o mesmo.
Grande parte desta realidade poderá ser reconhecida na publicação mais especial já realizada por O Progresso de Tatuí ao longo de sua história, a qual marcará justamente um século de existência do jornal, um dos mais longevos do país em atividade sem nenhuma interrupção.
Já naquela época, havia as corriqueiras disputas políticas, interesses cruzados e, como não poderia deixar de ser, até aquilo que, atualmente, veio a ser popularizado como “fake news”.
O jornalismo “profissional”, então uma semente buscando seus próprios contornos e fontes de sobrevivência independentes, já sofria com determinadas dificuldades bem antes das redes sociais, embora com estas também relacionadas, como o desafio de se manter “equilibrado”, “isento”, “imparcial” em meio a tanta desagregação e extremismos.
Fato é que o jornal O Progresso de Tatuí nasceu, efetivamente, como um dos veículos de comunicação pioneiros a pautar com seriedade a função maior de informar a população com a “verdade dos fatos”.
Sim, o jornal, que se aproveitou de um “Progresso” anterior, do século 19, para ser recriado em 30 de julho de 1922, teve a iniciativa de um político: Laurindo Dias Minhoto.
Registra a “lenda” que ele se inspirou no “Progresso de Tatuhy”, que havia circulado em 1878 sob o pioneirismo de Antônio Moreira da Silva.
Contudo, ainda com esse “Tatuhy” da grafia antiga, circulou por, praticamente, dois meses sob a direção não do político, mas de Cândido de Souza Freire.
É ele quem escreve o primeiro editorial e esclarece as diretrizes de trabalho do novo veículo. Souza Freire critica fortemente o propósito das publicações antecedentes, cuja função era compartilhar ideais políticos.
Para reforçar o princípio do jornal que comandou por curto período, mas que abalou as estruturas da época, o jornalista destacou que o nome da publicação falava por si só.
Pela grafia da época: “Adaptando o titulo acima, teríamos publicado, em resumo, tudo quanto pretendemos: trabalhar pelo progresso de Tatuhy, nosso berço, pelo qual temos feito tanto quanto as nossas forças têm permitido”.
A decisão de batizar a nova folha com o nome do primeiro jornal da cidade veio do desejo de homenagear Moreira da Silva e garantir que a publicação não se desviasse dos princípios do “mestre do jornalismo” local e das metas propostas. “Como Antonio Moreira da Silva publicou o seu ‘Progresso de Tatuhy’ e se notabilisou nas pugnas ingentes que o seu patriotismo e devotamento impulsionavam, nós procuramos imita-lo”, diz Souza Freire.
A luta obstinada pelo interesse público fez emergir, de uma vez por todas, a “verdadeira imprensa” em Tatuí, aquela dirigida com a finalidade de informar os cidadãos, auxiliando-os e conscientizando-os sobre fatos que mudam o cotidiano.
“Procuraremos, com independencia e altivez, tratar do interesse publico, sem que nos inclinemos a disvirtuar o caracter da verdadeira imprensa, dirigida com fins nobres e promettedores por homens educados e que têm posições socieaes definidas e todo o conflicto pela sociedade em que vivem e cuja defesa se orgulham de cooperar”, argumenta Souza Freire sobre o papel do jornal.
Introduzida a ideia, ele deixa a direção da empresa em outubro de 1922, após adoecer. Passa a direção, então, a Fernando Paes, depois de fazer circular um total de 11 edições.Paes assina como “redactor”, contudo, apenas as edições de 22 e 29 de outubro, desligando-se do jornal em 1924.
Em 6 de janeiro desse mesmo ano, José Ortiz de Camargo, o conhecido “Zé Marinheiro”, assume o semanário dominical, permanecendo na direção até a morte, em 1944.
Zé Marinheiro, nascido em 1º de maio de 1882, seis anos antes da abolição da escravatura no Brasil (em 13 de maio de 1888), consolidou “O Progresso de Tatuhy” como um dos jornais mais respeitados do interior paulista, a custo de muito suor, determinação e amor à profissão.
Tatuiano “pé vermeio”, ele se tornou patrão e dono do próprio veículo de comunicação décadas depois de conhecer (e dominar) a arte da tipografia.
O primeiro contato com o ofício aconteceu aos 15 anos, com o ingresso como aprendiz nas oficinas do jornal “Cidade de Tatuhy”. Naquela época, a folha estava sob a direção de Antônio Pereira de Almeida.
Quando assumiu o jornal, apesar das divergências existentes, Zé Marinheiro tinha trânsito livre entre as autoridades, porque havia atuado tanto no jornal dos guedistas como no dos laurindenses.
O relacionamento respeitoso- embora jamais servil – teve sequência a partir de 1945, quando aconteceu o fim da 2ª Guerra Mundial e O Progresso de Tatuí passou para as mãos, na prática, de Vicente Ortiz de Camargo (filho de Zé Marinheiro) e do primo José Nascimento.
Com essa família, seguiu até dezembro de 1980, quando a publicação acabou adquirida pela família Camargo Gonçalves, os atuais proprietários, a qual já tem trabalhado há décadas para sustentar aqueles princípios originais de 1922, agora a completarem um século.
Para marcar esta data verdadeiramente histórica e relevante, o jornal lança em agosto, junto às festividades de aniversário da cidade, a sua edição mais especial de todos os tempos, intitulada “Um Século de Progresso”!
Serão 124 páginas inteiramente em cor e no formato tabloide, em que estarão presentes não apenas a própria história do jornal, mas as personagens e notícias mais significativas que figuraram as páginas do periódico durante estes cem anos.
Mais que isso, estarão presentes e relembradas as contribuições do jornal para o efetivo “progresso de Tatuí”, como o título “Cidade Ternura”, a proposta de criação da Semana Paulo Setúbal e o maior concurso artístico e literário local para estudantes.
Mais importante que qualquer assunto, não obstante, é que O Progresso de Tatuí, apesar do tempo e de suas mudanças administrativas – além dos eternos ataques injustos e chororôs -, ainda sustenta a máxima marcada em seu primeiro editorial:
“Procuraremos, com firmesa, seguir o nosso programma: empregar o maximo dos nossos esforços em beneficio do nosso municipio e do nosso povo, sem magoar, sem que o nosso jornal se confunda com pasquim”.