Trabalho do cenógrafo tatuiano Jaime Pinheiro chega à Quadrienal de Praga

Cenografia de peça foi selecionada para principal evento internacional da área

Cena de “Contestado”, com cenografia de Jaime Pinheiro, selecionada para a Quadrienal de Praga
Da reportagem

O artista plástico, cenógrafo e professor tatuiano Jaime Pinheiro teve trabalho selecionado para a Quadrienal de Praga (Prague Quadrennial – PQ), evento mundialmente conhecido que acontece, por duas semanas, a cada quatro anos na capital da República Tcheca. O trabalho de Pinheiro é a cenografia de “Contestados”, montagem da Cia. Mútua, de Santa Catarina.

A Quadrienal foi criada em 1967, para reunir o melhor do design da performance, cenografia e arquitetura teatral à linha de frente de atividades culturais a serem vividas por profissionais, artistas emergentes e, também, pelo público em geral.

A peça “Contestados” apresenta um recorte sobre a Guerra do Contestado, conflito de terras ocorrido no início da década de 1920, envolvendo os estados de Santa Catarina e Paraná, além do Exército Brasileiro, a empresa norte-americana Brazil Railway e a população local.

A montagem utiliza a técnica da figura plana para contar uma história considerada genuinamente catarinense, embora pouco conhecida.

Em cena, duas atrizes, uma brasileira e uma argentina, utilizam cem quilos de terra crua que, espalhada sobre uma mesa, sustenta figuras, cenários e adereços criados por Pinheiro.

“O elemento terra compõe a geografia da história que vai sendo narrada, convertendo-se em planícies e vales, sendo o símbolo dramatúrgico da obra o conflito por terras”, explica Pinheiro. A sonoplastia, também original, tem base nos instrumentos e melodias caboclas.

Pinheiro conheceu o diretor da Cia. Mútua, William Sieverdt, em meados de 2010, quando foi a Santa Catarina apresentar um trabalho em teatro de bonecos. “Ele gostou e me chamou para trabalhar com eles”, lembra. Era também uma montagem com bonecos, “Um Príncipe Chamado Exupéry”.

Em 2018, durante a concepção do projeto de “Contestados”, o diretor sugeriu novamente o nome de Pinheiro para a cenografia. “Fiquei indo e vindo para lá durante um bom tempo, porque foi uma produção longa”, conta.

A estreia aconteceu em 2019, mas, logo depois, veio a pandemia e a montagem acabou “acontecendo” somente mais tarde. “Foram feitas algumas apresentações online, mas teatro não é para ser visto em vídeo, não funciona direito”, observa o cenógrafo.

“Para mim, é um reconhecimento muito grande estar na Quadrienal de Praga. Tanto o diretor quanto os demais integrantes da companhia são muito competentes e criativos. Digo a eles que deveriam assinar a cenografia comigo, porque o processo foi muito rico e interativo”, sustenta Pinheiro.

“Estar entre os selecionados para Praga é muito bom, pois se trata de um reconhecimento oficial, que nos coloca no circuito internacional. Mas, para mim, além dessa chancela, é importante demais o retorno que tenho do público”, assegura.

Atualmente, Pinheiro trabalha com dois projetos de teatro de animação, um voltado para o público com deficiência intelectual e outro para a plateia em geral. “Estou negociando, mas este deve ir para fora do país, com estreia na Alemanha”, adianta.

A PQ

A cada edição, a PQ vem modificando-se e, atualmente, cada vez mais designers a entendem como uma plataforma: atividades e colaborações que vão acontecendo em todo o mundo com diversos parceiros, profissionais criativos, artistas, pesquisadores e teóricos.

Neste ano, o Brasil recebeu o prêmio de melhor trabalho em equipe na Mostra dos Países e Regiões da 15ª edição da Quadrienal.

A láurea foi para a exposição “Encruzilhadas: Acreditamos nas Esquinas”, uma instalação imersiva e interativa composta por sete esculturas sonoras, chamadas “oferendas sonoras”, criadas de forma colaborativa por artistas de todos os estados do país.

Mais três oferendas foram criadas pela curadoria, em parceria com artistas selecionados. Não é a primeira vez que o Brasil foi premiado no evento, realizado em junho. O país já ganhou três medalhas de ouro e duas “Trigas de Ouro”, premiação máxima, nos anos de 1995 e 2011.

Para contemplar a pluralidade das cenas do país, a curadoria da exposição fez um levantamento das obras cênicas apresentadas entre 2019 e 2022 em todos os estados brasileiros.

Foi selecionado um artista da sonoridade da cena de cada unidade da federação para o trabalho coletivo. Em dois estados, formaram-se duplas, totalizando 29 artistas.

Organizados em sete grupos com quatro a cinco artistas, eles trabalharam em modo online por aproximadamente um mês para a criação das sete oferendas sonoras.

No mês de abril, partes das criações e elementos de cada oferenda foram levadas a São Paulo e ganharam corpo, com a colaboração de alguns artistas e técnicos, que, juntos com membros da curadoria, fizeram pré-montagem da exposição apresentada em Praga.

A representação brasileira foi coordenada pelo movimento PQBrasil e organizada pela associação Grafias da Cena Brasil.

Sobre o cenógrafo

Jaime Pinheiro iniciou trabalhos cenográficos em 1979, paralelamente às atividades na área de artes gráficas e como designer. Em 1997, instalou a oficina de cenografia no Conservatório de Tatuí, instituição na qual atua como cenógrafo e professor.

Entre seus principais cenários, estão os dos programas “Prelúdio”, “Prêmio Carlos Gomes” e “Sinfonia Fina”, da TV Cultura. Desenvolveu trabalhos para o Festival de Inverno de Campos do Jordão e para o Festival de MPB de Tatuí.

Realizou a cenografia dos espetáculos “Morte e Vida Severina”, “O Pequeno Príncipe”, “Esparrama”, entre outros. Dedica-se ao teatro de animação, à preservação da cultura popular e folclore, tendo sido coordenador de várias edições do Torneio Estadual de Cururu, evento para o qual também desenvolve cenário.