Da reportagem
Cerca de seis meses após deixar o Chicago White Sox, da MLB (Major League Baseball) – a liga norte-americana de beisebol – e acertar a transferência ao Yomiuri Giants, o tatuiano Thyago Vieira deve estrear oficialmente no país asiático.
Quarto atleta nascido no Brasil a atuar na MLB, Vieira deixou a liga norte-americana em dezembro do ano passado. A apresentação dele na equipe japonesa aconteceu no fim de janeiro, ao som da canção infantil “Baby Shark”.
Desde então, o tatuiano participou somente de treinos e partidas amistosas. A equipe de Vieira é a mais vencedora da Liga Central da NPB (Nippon Professional Baseball), com 46 títulos.
A temporada de 2020 começaria no dia 20 de março, mas, devido à pandemia de coronavírus, os organizadores adiaram a abertura para 24 de abril. Contudo, o início do campeonato foi novamente suspenso.
Entretanto, conforme a NHK Nippon Hōsō Kyōkai (em português, Corporação de Radiodifusão do Japão), o primeiro-ministro do país, Shinzo Abe, anunciou nesta segunda-feira, 25, que o estado de emergência será suspenso, após o controlo da propagação da Covid-19 em menos de dois meses.
No mesmo dia, segundo a Associated Press, o comissário da liga japonesa, Atsushi Saito, informou que o retorno da NPB está agendado para 19 de junho, uma sexta-feira, embora sem a presença de torcedores nos estádios.
Até a manhã desta terça-feira, 26, com 16.628 testes positivos, o Japão era o 40º país com mais casos confirmados de coronavírus, dos quais 13.612 pacientes estão recuperados e 851 faleceram pela doença.
O Brasil é o segundo país com mais casos de Covid-19, atrás somente dos Estados Unidos. Até esta segunda-feira, eram 376.669 casos confirmados, 153.833 recuperados e 23.522 mortes. As vítimas totais no Japão, portanto, equivalem aos falecimentos diários no Brasil.
No mundo, o coronavírus já havia infectado 5.495.061 pessoas, das quais 2.232.593 já se recuperaram e 346.232 foram a óbito.
Durante os treinamentos, Vieira pôde ter contato com os torcedores, antes de o Japão decretar a quarentena. Ele informa que o elenco continuou treinando internamente durante o período.
O tatuiano afirma que, no Japão, somente os ambientes que geram aglomerações, como shoppings e parques, além de estádios e ginásios esportivos, foram fechados, enquanto os locais que atraem público reduzido seguiram em funcionamento, seguindo as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Conforme Vieira, todos os estabelecimentos oferecem álcool em gel e os japoneses estão sempre utilizando máscaras de proteção e respeitando o distanciamento social. “Apesar da quarentena, aqui (no Japão) nunca parou, pois a população é disciplinada”, aponta o tatuiano.
“O respeito e a educação do povo japonês se diferenciam muito da cultura brasileira. Tanto é que o Brasil enfrenta essa situação atualmente e, no Japão, se eliminaram quase todos os casos de coronavírus”, complementou.
Para o tatuiano, “seguir as regras e disciplinas” foram essenciais para que ele se adaptasse ao país asiático. O jogador iniciou no beisebol através da cultura japonesa, o que o auxiliou na nova mudança de país. “Eles são bastante educados, respeitosos e organizados com tudo”, reforça.
De acordo com Vieira, a dificuldade com o idioma é normal, porém, já está acostumado após atuar na Venezuela e nos Estados Unidos. “Quando fui jogar na Venezuela, não sabia espanhol e aprendi. Nos Estados Unidos, aprendi o inglês. Acredito que tudo tem a sua fase, o tempo certo para acontecer e, em breve, aprenderei a língua japonesa”, assegura.
Vieira garante que os melhores atletas de beisebol atuam na MLB e na NPB. Para ele, as diferenças entre a liga japonesa e a norte-americana são o número menor de jogadores estrangeiros e que se treina mais.
Sem poder estrear oficialmente e em quarentena no país asiático, o tatuiano criou um canal no YouTube. Através da plataforma online, Vieira publica vídeos dentro de um apartamento, em Tóquio, demonstrando os treinos e explicando aos internautas como consegue arremessar bolas em velocidade superior a cem milhas – equivalentes a 160 quilômetros por hora -, além de lances da carreira.
O tatuiano criou o canal no dia 11 de abril e, em quatro dias, já contava com mais de mil inscritos. Atualmente, ele possui mais de 1.760 “seguidores” na plataforma. Somando os oito vídeos “no ar”, Vieira possui 16.164 visualizações.
Para assistir aos vídeos, basta pesquisar por “Thyago Vieira Négs” ou acessar o link: https://bit.ly/2VzHG4L .
Com o tempo livre durante a quarentena, Vieira decidiu criar o canal para responder inúmeras mensagens de atletas que recebia em redes sociais, perguntando sobre a rotina dele e como praticava os treinamentos.
“A vida de um atleta de beisebol, assim como a vida de outros atletas profissionais, é bem corrida. Não tenho muito tempo para ficar respondendo um por um e, com os vídeos, posso atender a todos”, declarou.
Para Vieira, o canal na plataforma online permite que ele possa ajudar o beisebol brasileiro a crescer. Além do tatuiano, o jogador Vitorito, que também atua no Japão, criou um canal com a intenção de auxiliar os brasileiros amantes da modalidade.
“Percebemos que o beisebol está acabando no Brasil. De alguma forma, os jovens não têm em quem se espelhar. Nós, que estamos em um nível um pouco mais alto, tentamos fazer com que esse amor pelo beisebol não se perca”, justifica Vieira.
“Estamos tentando passar algumas informações que já temos, por estarmos jogando fora do país, para dar uma ‘atualizada’. Infelizmente, o Brasil está bastante atrasado em relação a informações atuais e futuras do esporte”, observa.
O tatuiano deseja que as técnicas que ele ensina nos vídeos ajudem outros amantes do beisebol a “correr para realizar os sonhos”. “Hoje, o YouTube é uma maneira mais fácil de se comunicar com um maior número de pessoas simultaneamente. Depois de criar o canal, outras pessoas também começaram a divulgar trabalhos e exercícios para poder ajudar o beisebol”, reforça.
Em 2020, Vieira completa dez anos atuando profissionalmente fora do país. Segundo o atleta, a cada ano que passa fica mais difícil, pois a filha dele está crescendo e a saudade da família é inevitável.
A tecnologia é aliada para “diminuir” a distância com os familiares, apesar de existir certa dificuldade – o Japão está 12 horas à frente do horário de Brasília. “Existe uma pequena dificuldade por conta do fuso horário, mas sempre mantenho contato pelas redes sociais ou por chamadas de vídeo”, conta.
“É muito difícil ficar longe da família, sem um suporte próximo. É complicado passar sozinho, mas temos de saber tirar de letra. Porém, acredito que todo esse esforço vai ter uma recompensa, e eu sempre deixo Deus à frente de tudo, pedindo força, orientação e agradecendo a Ele”, finaliza Vieira.