Tatuí recebe espetáculo documental ‘Os Três Sobreviventes de Hiroshima’

Peça reúne em cena sobreviventes de bomba atômica da 2ª Guerra Mundial

Cena do espetáculo que será apresentado em Tatuí (Foto: Joelma do Couto)
Da reportagem

O Teatro “Procópio Ferreira”, do Conservatório de Tatuí recebe, neste sábado, 20, às 20h, a apresentação do espetáculo “Os Três Sobreviventes de Hiroshima”. A peça de teatro documental reúne em cena pessoas que sobreviveram ao lançamento da bomba atômica naquela cidade, em 1945.

Conforme o diretor e roteirista Rogério Nagai, no palco, dois sobreviventes do primeiro ataque nuclear da história fazem depoimentos “de um dos piores genocídios da humanidade”. São contados os momentos da explosão nuclear na cidade de Hiroshima, no Japão, os dias seguintes e a imigração para o Brasil.

“Os Três Sobreviventes de Hiroshima” reconstrói a história do jovem Takashi Morita (interpretado pelo ator Ricardo Oshiro) – na época, com 21 anos – e das crianças Kunihiko Bonkohara – com cinco anos – e Junko Watanabe – com dois anos -, que estavam em Hiroshima no dia do bombardeio.

Em cena, eles atuam no formato de teatro-documental, também conhecido como biodrama. Fotos originais e canções da época executadas pelos sobreviventes compõem o clima da apresentação.

Conforme Nagai, o espetáculo deu origem ao projeto “Sobreviventes Pela Paz”. A ideia surgiu em 2012 com pesquisas sobre a comunidade nipo-brasileira e a imigração japonesa no Brasil. Foram 12 meses de pesquisa e quatro para a criação do roteiro e ensaios.

Nagai conta que, inicialmente, a pesquisa consistia em estudar toda a temática da imigração japonesa no Brasil, com histórias pouco conhecidas da população. A partir desse projeto, foram desenvolvidos dez espetáculos, sendo que um deles é este teatro documental sobre Hiroshima.

“Hiroshima é a cidade natal da minha avó. A ideia era colocar filhos e netos dos sobreviventes, até que acabei descobrindo uma associação de sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki e coloquei os três em cena”, contou o diretor.

Nestes dez anos de circulação, o projeto já foi visto por mais de 15 mil pessoas e passou por cidades como São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro, Campinas e Ribeirão Preto, entre outras, com sessões lotadas e muitos espectadores para fora do teatro.

Nagai ressalta que o texto, ainda que trate de uma tragédia, “leva uma reflexão sobre a paz por onde passa, com uma mensagem forte de resiliência, perdão e superação”.

“Colocar os sobreviventes em cena é uma maneira que o projeto encontrou de mostrar a importância de propagar e manter a paz, para que acontecimentos como esse nunca mais se repitam”, acentua.

Hiroshima

Em 6 de agosto de 1945, no estágio final da 2ª Guerra Mundial, os Estados Unidos lançaram uma bomba na cidade de Hiroshima. Três dias depois, atingiram também Nagasaki.

Foram milhares de mortos e feridos, além de sobreviventes que buscaram retomar suas vidas depois da tragédia. Os números oficiais informam entre 130 mil e 240 mil mortos como resultado destes que foram os primeiros e únicos ataques nucleares contra civis em toda a história.

No Brasil, há 67 sobreviventes das bombas de Hiroshima e Nagasaki. O espetáculo é realizado pela Nagai Produções Artísticas e Culturais, através do Edital ProAC de Circulação do governo do estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa.

Os sobreviventes

Conforme informado pela assessoria de comunicação do espetáculo, Takashi Morita tem 99 anos, nasceu em Hiroshima, em fevereiro de 1924. Aos 20, entrou para a Academia Militar e foi transferido para Tóquio, onde sobreviveu ao bombardeio incendiário que ocorreu em maio de 1945.

“Para estar perto da família, voltou para Hiroshima e chegou à cidade uma semana antes do ataque com a bomba atômica. No dia da explosão, marchava com um pelotão pelas ruas a cerca de 1.200 metros da explosão”.

Após a bomba, sofreu com problemas da radiação, desenvolvendo uma espécie de leucemia. Em busca de condições de vida melhores e um clima mais favorável para a saúde, partiu para o Brasil em 1956 junto da família, esposa e um casal de filhos.

Em 1984, teve conhecimento da ajuda que o governo japonês oferecia aos sobreviventes da bomba atômica e fundou a Associação dos Sobreviventes da Bomba Atômica no Brasil, que depois passaria a se chamar Associação Hibakusha Brasil pela Paz, para reivindicar os direitos dos hibakushas que viviam no país.

Morita também passou a ser um importante porta-voz dos sobreviventes da América do Sul junto ao governo japonês. Em 2008, fez parte do grupo que viajou no Peace Boat e participou de um congresso na ONU.

Em 2015, recebeu o título de cidadão paulistano pela Câmara Municipal de São Paulo, e em abril desse ano lançou o livro “A Última Mensagem de Hiroshima”, pela Universo dos Livros.

Desde 2013, protagoniza o espetáculo de biodrama “Os Três Sobreviventes de Hiroshima” dentro do projeto Sobreviventes pela Paz, atuando com mais dois sobreviventes.

Em 2019, recebeu o “Colar de Honra ao Mérito” da Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), pelos relevantes serviços prestados à comunidade em prol da paz.

Kunihiko Bonkohara tem 82 anos, nasceu em Shizuoka e mudou-se para Hiroshima quatro meses antes do lançamento da bomba, por causa do trabalho do pai, engenheiro civil, que havia sido transferido para a cidade.

Tinha cinco anos no dia da explosão. Ele estava no escritório do pai, que ficava a dois quilômetros do epicentro da explosão. Ao ver o clarão, o pai empurrou-o embaixo de uma escrivaninha e o protegeu com o corpo. Os dois foram feridos com estilhaços de vidro. Voltaram para a casa deles, que estava destruída, e foram atingidos pela chuva negra.

A mãe e a irmã mais velha de Bonkohara, que haviam sido convocadas para trabalhar no centro da cidade, morreram. Bonkohara foi levado pelo pai para o interior, onde já estavam seus outros dois irmãos, e cresceu com a saúde muito frágil.

Aos 11 anos, teve tuberculose e, na adolescência, sofria os efeitos da radiação, como feridas pelo corpo, tontura e fraqueza.

Aos 20 anos, foi diagnosticado com um problema cardíaco, e o médico recomendou-lhe que não fizesse esforço e nem trabalhos pesados. Depois desse diagnostico, partiu para o Brasil. Trabalhou na lavoura no Paraná, como locutor de rádio em São Paulo e em cooperativas.

Em 1988, casou-se com uma brasileira descendente de japoneses. Em 2000, entrou para a Associação Hibakusha Brasil pela Paz e, a partir de 2005, começou a fazer palestras contando sua história.

Em 2010, embarcou no Peace Boat e, atualmente, é vice-presidente da Associação Hibakusha Brasil pela Paz. Desde 2013 e até hoje, atua no espetáculo de biodrama e, em 2019, também recebeu o “Colar de Honra ao Mérito” da Alesp.

Junko Watanabe tem 80 anos, tinha apenas dois em 6 de agosto de 1945 e estava a 18 quilômetros do ponto zero. Ela foi atingida pela chuva negra (chuva radioativa) enquanto brincava com o irmão no pátio de um templo e não tem memória do que aconteceu nesse dia.

A família escondeu-lhe o fato de ser hibakusha (vítima da bomba atômica), só teve conhecimento da condição aos 38 anos. Aos 24 anos, veio para o Brasil depois de se casar por correspondência com um japonês que aqui vivia. Teve dois filhos e dedicou-se à educação deles até que concluíssem os estudos.

Nos anos de 1980, retornou para o Japão e lá permaneceu trabalhando por seis anos. Aos 60 anos, depois de se aposentar, conheceu o trabalho da Associação Hibakusha Brasil pela Paz e começou a participar das atividades.

A partir do trabalho na associação, obteve mais conhecimento sobre os horrores da bomba atômica e suas consequências. Desde 2005, faz palestras em escolas contando sua história.

Em 2008, fez parte de um grupo de 103 hibakushas que embarcaram no projeto Peace Boat e viajaram pelo mundo contando suas histórias e divulgando a cultura de paz.

Ela também atua no espetáculo desde 2013 e, em 2019, recebeu o “Colar de Honra ao Mérito” da Alesp.

O espetáculo tem participação especial do grupo Nisshindaiko, de Itapetininga. Os ingressos custam R$ 20 (ou R$ 10 meia-entrada) e podem ser adquiridos de forma antecipada pela plataforma Sympla, ou na bilheteria do teatro 60 minutos, antes do início do espetáculo.

Parte da renda da bilheteria será doada para instituição filantrópica da cidade e 20% da capacidade do teatro está sendo destinada a entrada franca para estudantes de escolas públicas.