Santa Casa pode ser ‘novo alvo’ de CEI





A Santa Casa de Misericórdia pode ser novo alvo de CEI (comissão especial de inquérito) da Câmara Municipal. O vereador Ronaldo José da Mota (PPS) cogita apresentar requerimento solicitando a abertura de investigação nos próximos dias.

O parlamentar quer explicações a respeito de proposta apresentada pela provedoria a um administrador e consultor de seguros.

Osmar Donizete Costa, diretor comercial da Cosfer e que representaria quatro operadoras de saúde com interesse em Tatuí, recebeu comunicado da diretoria do hospital no dia 30 de abril.

Nele, constam lista de valores de serviços hospitalares a serem prestados e duas contrapartidas das empresas dispostas a se credenciar. Conforme o vereador, essas exigências inviabilizaram as negociações com as operadoras.

Mota afirmou que não há mais interesse por parte das empresas. “Elas jogaram a toalha”, iniciou. Ele alegou que o hospital teria dificultado a vinda das operadoras para o município por “pressão” e que estaria “abrindo mão de receita”.

As condições apresentadas pelo hospital ao diretor comercial foram divulgadas pelo vereador na noite de terça-feira, 5, e repassadas a O Progresso. Mota também entregou cópia de e-mails trocados entre ele e o representante.

O parlamentar é um dos responsáveis pelas negociações entre o hospital e a Cosfer. Ele intermediou a vinda do representante por conta de exigências apresentadas por indústrias.

Mota é presidente do Sindmetal (Sindicato dos Metalúrgicos de Tatuí e Região) e afirmou que mais de 80% delas têm dificuldades em encontrar um plano de saúde que não impacte na folha de pagamento.

Para credenciar as operadoras, a Santa Casa elaborou proposta na qual pede dois aportes em dinheiro. Um deles corresponde aos contratos firmados pelas operadoras com os usuários do plano de saúde; o outro, a uma taxa mensal fixa no valor de R$ 30 mil para a utilização do pronto atendimento do hospital.

Conforme Mota, a primeira exigência é que cada operadora repasse percentuais do valor do primeiro pagamento de cada contrato a ser firmado com usuários diretamente para a Santa Casa. Os valores são de 40% para contratos com mais de cem vidas e de 100% para contratos com menos de cem.

No documento repassado ao diretor comercial, a provedora Nanete Walti de Lima cita que o aporte é necessário para que o hospital possa manter uma estrutura mínima de atendimento e em função da “falta de volume inicial de vidas”.

Para o vereador e sindicalista, a exigência gera um impacto que inviabiliza a vinda de planos de saúde, especialmente nas empresas. Segundo ele, a maioria das indústrias negocia planos sempre para um grupo de funcionários.

Uma empresa com 120 funcionários resultaria em 360 “vidas capitalizadas” (a contagem leva em conta que, para cada um empregado, há pelo menos dois dependentes). No valor de R$ 100 por pessoa, os contratos seriam de R$ 36 mil. Com aporte de 40%, a Santa Casa receberia R$ 14,4 mil.

Multiplicado por quatro (número de operadoras), o hospital receberia R$ 57,6 mil por mês – no caso de todas elas capitalizarem mais de cem vidas.

O montante é considerado inviável, uma vez que, segundo o parlamentar, as operadoras teriam de repassar “todo o lucro do primeiro mês para o hospital”.

Mota também reclamou do fato de que a proposta não especifica quem seria responsável pelo pagamento, se as empresas para as operadoras, ou os usuários.

“Essa proposta não é a prática de mercado. As operadoras fazem captação de vidas, e todo o trabalho e o primeiro mês vai para a Santa Casa?”, questionou.

Segundo ele, existe a possibilidade de os corretores oferecerem uma parte da corretagem para a Santa Casa. “Isso acontece porque, depois, os corretores vão receber, mês a mês. Mas, nenhuma operadora de praxe faz isso”, falou.

Conforme o parlamentar, o custo extra teria de ser repassado ao consumidor. Além disso, as operadoras teriam de arcar com mais R$ 30 mil por mês para fazer uso do pronto atendimento da Santa Casa. No entanto, o documento consta que a negociação para a instalação do PA “fica em aberto”.

Nanete especificou que não haverá esse custo mensal “se a operadora contar com seu próprio pronto atendimento”. Nesse caso, a Santa Casa disponibilizaria somente a equipe médica de retaguarda, para o pós-internação.

Caso a operadora não tenha o próprio PA, o hospital cobrará os R$ 30 mil mensais como taxa para utilização do ambulatório. Segundo o documento, o pagamento deveria ser feito “sem prejuízo das taxas ambulatoriais” e “até que o usuário atinja um mínimo de 600 atendimentos ambulatoriais por mês”.

Para o vereador, tanto o valor como a quantia de 600 atendimentos são razões impeditivas para o credenciamento. O principal motivo é que as operadoras, inicialmente, pretendem utilizar a estrutura da Santa Casa para se fixar.

Mota relatou que, num segundo momento, quando atingirem número suficiente de usuários, as operadoras pretendem construir PAs.

“Toda essa proposta, nós entendemos, que o hospital deu para não dar um não mascarado. Para não chegar e falar: ‘Olha, não quero o plano, esqueçam Tatuí’”, disse.

Conforme o vereador, as propostas apresentadas pela provedoria são inviáveis. Mota alegou que, até o recebimento do documento, as operadoras estavam abertas à negociação. Ele disse que elas concordaram, por exemplo, em pagar mais pelo CH (coeficiente de honorários) para os médicos.

Também aceitaram os valores estipulados para serviços hospitalares, sendo o maior a diária de UTI (unidade de terapia intensiva) adulto, de R$ 906,66, e o menor, do minuto de aplicação de oxigênio, fixado em R$ 0,37.

Mota reclamou do tempo que o hospital levou para apresentar proposta. Conforme ele, o prazo teria expirado em março e o documento, sido preparado somente após reunião entre o representante, a provedoria do hospital e o prefeito José Manoel Correa Coelho, Manu, que se reuniu pela segunda vez com o diretor da Cosfer na quinta-feira da semana passada.

Ao final do encontro, Mota disse que o prefeito se prontificou a conversar com a provedoria. Caso nenhuma resposta seja enviada ao parlamentar nos próximos dias, ele pretende abrir uma CEI.

“Vou cobrar uma posição na Câmara para saber por que a Santa Casa efetivamente abriu mão do credenciamento, porque o que eles apresentaram é uma proposta indecente”, declarou.

A comissão deve tratar não só da questão do credenciamento, como da situação financeira do hospital. Na semana passada, o vereador Antonio Marcos de Abreu (PP) afirmou que a Santa Casa tem déficit de R$ 4 milhões.

“Tudo que acharmos que está errado vamos investigar. Inclusive, até atitudes dos médicos e de funcionários e reclamações de usuários. A CEI tem capacidade de fazer uma apuração geral dentro da Santa Casa”, ressaltou.

Por meio da comissão, o vereador disse que a Casa de Leis poderá verificar, até mesmo, se há condições de trabalho por parte dos funcionários.

“Eu não gostaria de chegar a esse ponto, mas o principal é solicitar do hospital um planejamento para cobrir o déficit que está acontecendo na atualidade”, adicionou.

Também segundo ele, o hospital deixou de ter receita ao demorar em apresentar proposta às operadoras. Mota afirmou que, mesmo que houvesse acordo, elas necessitariam de mais 60 dias para proceder com a captação de usuários.

“Quando o plano é vendido, existe a carência de 30 dias para o pagamento. Nesse caso, a parcela vai cair somente no mês seguinte. Só nessa brincadeira, a Santa Casa perdeu tempo e dinheiro. Para voltar a negociar, o tempo recorde para se fechar um acordo é mais três meses, sem receita”, argumentou.

O vereador mencionou, ainda, um “descompasso” entre o discurso apresentado pela diretoria em fevereiro deste ano e a proposta entregue no fim de abril.

Conforme ele, no encontro inicial, o hospital teria dito que entendia como real necessidade o credenciamento de novas operadoras de plano de saúde, com a saída da Unimed, por ocasião de inauguração de hospital próprio.

Mota frisou que o objetivo dele é viabilizar planos para atender às empresas. “Mas, nós também brigamos para que eles possam ser usados pela população, para que o aposentado e o autônomo possam pagar. Atende às empresas e, ao mesmo tempo, gera receita para a Santa Casa”.

Para ele, a vinda de novos planos é “saudável”, uma vez que melhoraria a qualidade dos serviços prestados por outras empresas, em razão da concorrência.