Cristiano Mota
Professora Raquel, Mayara e Natanie falaram sobre movimento local
Estudantes de escolas estaduais que têm professores em greve em Tatuí estão sendo afetados pelo movimento liderado pela Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo).
Apesar dos transtornos, parte dos alunos apoia a paralisação, que, no município, completa 54 dias neste domingo, 17. Entre eles, Mayara A. S., de 16 anos.
Aluna do ensino médio da Escola Estadual “Professor José Celso de Mello”, ela conta que a situação dos estudantes está “complicada”. “Nós acabamos não tendo professores e ficamos sem força para vir para as aulas”, relatou.
No caso de Mayara, o motivo é o número de professores em greve. Na escola dela, apenas dois que lecionam no período da noite decidiram não aderir.
Como o número de substitutos não é suficiente para atender às classes, acontece um “rodízio” e os alunos são dispensados antes do horário normal, que é às 23h.
“Temos aulas com os substitutos. Acontece que nem todas elas são preenchidas. Das que temos, acho que metade acontece. Depois, acabamos sendo liberados, ou ficando mesmo até dar o horário para irmos embora”, descreveu.
Segundo a estudante, outro aspecto negativo da situação é a descontinuidade do conteúdo. Por lei, professores que “cobrem a falta” de outros podem ser de matérias divergentes: quem leciona artes está apto a substituir em matemática, por exemplo.
Nesse caso, o substituto vai trabalhar, em sala de aula, conteúdo relativo à matéria que está relacionado à área dela. “O que acaba acontecendo é que as aulas servem para passar o tempo na escola”, disse a estudante.
Mayara relatou que parte dos colegas não compreende a luta dos professores que estão em greve. Conforme ela, os demais entendem não só “o lado dos educadores, como a causa que eles defendem”.
“Sabemos que eles precisam lutar por eles e por mais melhorias para nós mesmos. Fica difícil para nós não termos matéria, virmos aqui e termos aulas com substitutos. Muitos querem ir embora, ficam com raiva, mas eu entendo que os professores paralisados estão lutando também por nós”.
Em função do clima de insatisfação, a estudante disse que até mesmo as aulas de professores substitutos estão sendo prejudicadas. O motivo é o tumulto que se cria quando não há professores suficientes para atender às classes.
“Querendo ou não, não tem substituto suficiente e alguém vai ficar sem aula. Às vezes, tem quatro, cinco professores para dez salas de aula”, comentou.
Como são dispensados antes do horário de saída, Mayara contou que alguns alunos se revoltam. A proximidade do inverno também complica a vida dos estudantes, uma vez que muitos, no período da noite, deixam de ir por conta do frio.
A maior preocupação da estudante e dos colegas dela é com o vestibular. Mayara disse que os alunos estão temerosos em razão de não receberem o conteúdo esperado.
“Nós ficamos muito preocupados. Para quem estuda no 3º é mais complicado. Eles vão sair da escola sem o ensino que estão precisando. Pretendem fazer um vestibulinho, mas não sabem se terão condições”, argumentou.
Mesmo não tendo todas as aulas desde o início da greve, a estudante afirmou que continua indo à escola para não ter mais problema e em respeito aos professores. “Nós acabamos vindo por quem está em greve e por quem não está. Até porque eles estão tentando dar conteúdos”, ressaltou.
A professora de arte Natanie Montori da Rocha compõe o movimento grevista desde 24 de março. Ela dá aulas na unidade de ensino do CDHU (Conjunto Habitacional “Orlando Lisboa de Almeida”) e na “Semíramis Turelli Azevedo”, no Jardim Tóquio, tendo alunos do ensino fundamental e médio.
Natanie contou que o objetivo dos professores é buscar não apenas a equiparação salarial, mas “defender ideais”. A categoria reivindica, além de reajuste de 75,33% do salário, redução do número de alunos por sala de aula e a revisão da “duzentena” (período de 200 dias que os professores eventuais da classe “O” têm de obedecer para dar aulas pelo Estado).
“Não é uma única exigência, mas nós queremos e precisamos que todos os professores façam a adesão ao movimento”, declarou a professora.
Conforme ela, no Estado, a greve já soma adesão de 60 mil educadores. Em Tatuí, os números oscilam, com “leve baixa”. Segundo Natanie, professores da “Lienette Avalone Ribeiro”, no Parque Santa Maria, retomaram aulas.
Para manter-se unida e a par dos “últimos acontecimentos”, os docentes do município participam de encontros semanais em São Paulo. As assembleias são realizadas pela Apeoesp no vão livre do Masp (Museu de Artes de São Paulo), todas as sextas-feiras.
Eles também promovem visitas às unidades para distribuir panfletos do movimento. A ideia é “tentar incentivar outros professores a aderirem à paralisação”.
“Quando tivermos um maior número de docentes em greve, nosso movimento vai ficar mais forte e poderá conquistar o que está pleiteando”, disse.
De acordo com ela, muitos professores ainda resistem por medo de retaliação e motivos financeiros. “Acho que o corte do salário é o principal motivo. Eu mesma tive meu salário deste mês descontado”, contou.
O governo deverá ter de repor o salário da educadora por conta de decisão do TJ (Tribunal de Justiça) de São Paulo. Na semana passada, o órgão decidiu, por 17 votos a favor e 6 contra, favoravelmente a mandado de segurança impetrado pela Apeoesp.
A entidade solicitou ao órgão especial do tribunal que os dias parados não fossem descontados do pagamento dos educadores.
Natanie disse que o sindicato entende como retaliação a atitude do governo (em descontar do salário os dias em greve). Afirmou que esse tipo de atitude prejudica o movimento e a categoria, uma vez que o sindicato “perde força”.
“Em qualquer movimento que não seja de funcionário público, não há retaliação no salário. Um funcionário da iniciativa privada em greve continua recebendo. Quando volta, ele tem que repor isso”, defendeu a professora.
Segundo ela, por medo de desconto, houve pouca adesão dos professores do município. O movimento registra, atualmente, paralisação de docentes de três escolas.
“Se for ver por Tatuí, o movimento está fraco, mas, em São Paulo, é muito maior, porque lá a situação está muito mais grave”, afirmou a educadora.
Entre os “fatores motivacionais” dos professores paulistanos, Natanie citou a falta de água, a superlotação em sala de aula e a ajuda cedida pelo governo para o transporte. “Não tem como dar matéria num lugar que não tem água, com 80 alunos por classe e morando na zona sul com turma na norte”.
A professora afirmou que, em todo o Estado, a situação dos professores “está ruim”. Entretanto, disse que “a mais crítica” é vivida por quem leciona na capital.
Também conforme ela, os problemas em São Paulo são maiores. Daí, a adesão e a permanência dos educadores. “Lá, a situação é insustentável. Tanto que tem muito professor que prefere dormir na frente da Secretaria da Educação do que enfrentar uma sala de aula. Isso, fora a violência”, salientou.
Apesar de integrar um movimento “mais fraco”, a professora disse que permanecerá em greve até que uma solução seja dada. A categoria espera que haja entendimento entre o governo e a Apeoesp, via Justiça, nos próximos dias.