O atentado cometido em Suzano no dia 13 de março entrará para a história como mais um ato de selvageria que, em última instância, reflete e evidencia a banalidade do mal que tem acompanhado a sociedade brasileira nos últimos tempos.
Em tempos de imagens captadas por câmeras exclusivas de monitoramento, assistimos, chocados, uma pessoa que não fazia parte da comunidade escolar, entrar naquele espaço, sacar sua arma e, de maneira covarde, começar a atirar a esmo, atingindo pessoas sem nenhum critério.
Na sequência, seu comparsa adentra ao recinto para auxiliá-lo naquele estúpido derramamento de sangue inocente. Isso é tão insano e bárbaro que nos remete ao desejo de encontrarmos, pelo viés da razão, alguma explicação plausível.
Diante do caos, necessitamos pensarmos em saídas razoáveis para a situação tenebrosa da violência que nos assalta. Precisamos lembrar que o poder nunca é propriedade de um único indivíduo, mas sempre de um grupo, que unido, pode preservá-lo. O poder que almejamos como sociedade unida é manter a vida com dignidade.
Hannah Arendt dizia que “a forma extrema de poder é todos contra Um; a forma extrema de violência é Um contra todos”. Neste caso, a forma extrema de violência se deu através de Um (armado) contra todos desarmados, mas isso não pode nos levar ao enganoso raciocínio de que armando todos os outros, a violência seria contida.
É neste momento que aparecem os discursos simplistas de políticos perpetradores do discurso de ódio. A simples sugestão que um professor ande armado numa comunidade escolar é uma violência simbólica tão grande e desmedida que coloca em xeque a essência e a finalidade das práticas de ensino-aprendizagem, afinal, um professor carrega e ostenta com orgulho as suas únicas armas: os livros e o desejo insaciável de construir, por meio da juventude, uma sociedade mais justa e igualitária.
Por outro lado, não se pode e não se deve romantizar o espaço da escola como se ele estivesse blindado e não sofresse com as mazelas da urbe.
A escola é um espaço de conflitos para onde geralmente escorrem as águas turbulentas da intolerância e da mediocridade que têm assolado a sociedade brasileira num radicalismo infértil, fato que impossibilita a construção de saídas para os problemas reais do nosso tempo.
Tragédias como essa viram pretexto para disputas engalfinhadas entre acólitos beligerantes, de direita e de esquerda, nas múltiplas redes sociais. Neste tipo de ambiente, o ódio do discurso predomina.
Alguns têm argumentado que uma pessoa armada poderia ter evitado ou minimizado os resultados do ataque, isso é verdade. Agora, vale frisar que isso não deveria ser feito por nenhum professor ou agente escolar, mas por um representante do Estado, que, através da violência legítima, poderia impedir a propagação do mal banal naquele contexto.
Escola não é “bunker”, não é fortaleza medieval e nem presídio, mas precisa se adaptar ao seu tempo. Na reconfiguração dos pactos sociais em tempos de violência e brutalidade, é necessário responder à altura. Somos obrigados a concordar com Hobbes que dizia que “pactos sem espada, são apenas palavras”.
Infelizmente, em tempos sombrios como os nossos, a escola não está imune à violência e precisa se defender dentro da legalidade e das possibilidades que estão à sua disposição.
Na prática, um agente policial bem treinado poderia dirimir aquela violência toda, gostemos ou não desta ideia. Não se trata, portanto, da glorificação da violência, mas de tentar contê-la dentro das condições do Estado Democrático de Direito.
Em suma, não precisamos nem do discurso de ódio e nem o ódio do discurso, o que precisamos é de medidas efetivas e racionais para preservar as vidas das pessoas envolvidas na comunidade escolar como um todo.
* Professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e doutor em filosofia pela Unicamp.