Shopping em Tatuí

Algo que, não tão raramente, ainda é confundido por parte da população é o compromisso de a imprensa em geral – seja qual for o meio de comunicação – publicar tudo que pode apurar e comprovar.

Muitas vezes, além das notícias propriamente ditas, isto implica na divulgação de depoimentos testemunhais (com ou sem provas, em caso de acusações), opiniões (exercício da liberdade de expressão) e, entre outros conteúdos, também as promessas – naturalmente.

Sucede que, quando na instância política, a população tem se mostrado muito cautelosa quanto às expectativas de conclusão prática das promessas.

Em Tatuí, possivelmente, a maior expectativa dos últimos anos foi criada em torno da construção de um shopping center, anunciada há cerca de dois anos e que não se materializou. A ideia de um centro comercial desse porte, desde então, tem sido claramente desacreditada.

Por mais que não seja formada por grandes empreendedores, a população em geral ainda sente a crise financeira nacional e sabe que, em momento de dificuldade econômica, seria muito inusitado tamanho investimento.

Assim, como se diz, não “bota fé”. Mas, como acentuado logo antes, cabe à imprensa divulgar. Não há opção de se omitir, mesmo frente a promessas sobre lastro frágil, senão imaginário.

Por sua vez, cabe a quem promete cumprir, sob o risco de, se não o fizer, perder a credibilidade – e futuros votos, em sendo políticos. Portanto, sem juízo de valor, novo projeto foi levado a púbico por este jornal na semana passada.

Essa nova promessa é tão significativa que, inclusive, rendeu o maior número de visualizações no portal de notícias de O Progresso em toda a sua história, já perto de alcançar os 20 anos.

Trata-se da revitalização e posterior adequação do complexo da antiga Fábrica São Martinho para abrigar um shopping e um hotel. Claro, anúncio ainda mais empolgante a quem valoriza o patrimônio histórico e cultural do município.

A proposta foi divulgada a O Progresso na quarta-feira da semana passada, 6, pela administração dos imóveis compostos pela antiga Fábrica de Tecelagem São Martinho e pelo “Casarão dos Guedes”.

A confirmação teria sido feita por Laura Emília Calfat Chammas, esposa do proprietário Jorge Chammas Neto, na tarde de segunda-feira, 4, quando ela visitou os imóveis, na companhia de “um corpo de profissionais”.

Durante a visita, ela trocou informações com o arquiteto Pedro Paulo. O profissional percorreu as propriedades para verificar as possibilidades de restauro e ocupação. O passo seguinte seria compor com as autoridades locais entendimento para viabilizar o uso comercial dos imóveis.

O hotel seria instalado no casarão, imóvel edificado em meio a um terreno de, aproximadamente, 3.000 metros quadrados. A casa é dividida em três pavimentos, compostos por porão, piso térreo e superior.

O objetivo anunciado pelos proprietários é de aproveitar o casarão para o hotel e o restante do terreno (a área do jardim) para construir mais quartos.

A nova edificação poderia ser destinada somente a hospedagem e o prédio histórico, para abrigar um café, espaço de confraternização ou um centro de convenções.

Para a fábrica, a intenção é cooptar investidores interessados na recuperação do imóvel e destiná-lo a abrigar um centro comercial. A próxima etapa seria a formatação das propostas e, em seguida, a discussão das possibilidades e de apoios junto às autoridades da cidade e à população.

Certamente, não há quem busque e torça pelo bem da cidade a se colocar contra a revitalização e uso do patrimônio local mais bonito e rico em história.

Contudo, é preciso lembrar que não se trata de um projeto da municipalidade, tampouco da atual administração. Ou seja, todo aquele complexo pertence a particulares, com total domínio sobre o que fazer – ou deixar de – com esses belíssimos imóveis.

Também muito pertinente é lembrar que os proprietários têm compromissos a honrar, justamente, com o município – podendo, até, perder os imóveis, caso não os cumpra.

Além disso, esta é a terceira vez que ideias de ocupação dos edifícios são apresentadas à população. As outras ocorreram em 2011 e 2012. Nas duas ocasiões, a proposta era transformar a fábrica em um teatro com até mil lugares. A obra homenagearia o maestro João Carlos Martins, mas não saiu do papel.

Criar expectativa é natural e tão maior na medida em que anuncia algo importante. O resgate desse patrimônio, sem dúvida, seria um marco na história da cidade e, evidentemente, cabe a este jornal e a todos os demais veículos dar a maior divulgação e apoio possível.

Só o que não pode é o descuido quanto aos interesses da população, já tão cansada de promessas, especialmente quanto a essa história de “shopping” – aliás, como se isso fosse a coisa mais maravilhosa do mundo.

Shopping existe em qualquer lugar com população razoável para sustentá-lo. História própria e patrimônios locais, só especificamente em cada comunidade. Isto, sim, precisa ser preservado e incentivado.

Se for para abrigar um centro comercial, desde que preservando as características originais, que seja. E será ótimo! Mas, é fundamental, também, resgatar-se a máxima de que “promessa é dívida”, sem jamais, assim, dar motivo a novas decepções.