Santa Casa demite 36 para se ‘reajustar’





Arquivo o Progresso

Nanete Waiti disse que hospital está passando por readequação e pede apoio da comunidade

 

Cinquenta dos 437 funcionários que recebiam por serviços prestados à Santa Casa não integram mais o hospital. A diretoria demitiu 36 deles no final do mês passado, com a justificativa de contenção de gastos. Outros 14 trabalhadores deixaram “voluntariamente o emprego”, segundo a direção.

Em entrevista a O Progresso, a provedora Nanete Walti de Lima confirmou a saída dos funcionários. As demissões estiveram entre os temas debatidos por vereadores durante a sessão ordinária da Câmara, na noite de terça-feira, 3.

Nanete disse que elas aconteceram por causa da saída da operadora de saúde Unimed. De acordo com ela, o convênio médico era responsável por 30% da arrecadação da Santa Casa, recurso essencial para pagamento de débitos correntes.

Esse percentual é questionado pelo presidente do Sindmetal (Sindicato dos Metalúrgicos de Tatuí e Região), Ronaldo José da Mota (reportagem nesta edição).

A Unimed deixou de utilizar completamente a estrutura da Santa Casa em fevereiro, uma vez que inaugurou hospital próprio, no fim do ano passado. “Nós sentimos muito a perda de recursos e precisamos nos readequar”, disse ela.

Na tentativa de fazer com que a situação fosse “menos traumática” para os funcionários, a provedora afirmou que a diretoria adotou “alguns critérios”.

“Nós levamos em conta o salário (optando por colocar na ‘linha de corte’ os funcionários que tinham renda maior), fizemos uma pesquisa para saber quem eram os mais faltosos e quais deles traziam mais atestados”, argumentou.

De acordo com ela, as faltas geram transtornos ao hospital, especialmente na área da enfermagem. Enfermeiros e técnicos têm a chamada escala 12×36 (jornada de 12 horas e folga de 36 horas). Ao optar por demitir os “mais faltosos”, o hospital estaria resolvendo uma questão de ordem trabalhista.

Nanete afirmou que, por causa da falta, o hospital era obrigado a chamar outro funcionário para cobrir a escala. Na prática, precisava acionar um trabalhador que estava de folga para prestar atendimento. “Isso gerava muita hora extra e o MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) caiu em cima”.

A provedora sustentou que a diretoria vinha sendo orientada pelo órgão a não sobrecarregar os funcionários que cumpriam a carga horária corretamente.

“Acontece que nós precisávamos repor. Se a pessoa faltava, a escala ficava vaga, e nós tínhamos que completá-la. Agora, como diminuiu bastante a demanda, inclusive do SUS (Sistema Único de Saúde), nós aproveitamos a ocasião para tomar essa medida e uma série de outras ações”, argumentou.

A provedora afirmou que o hospital está passando por uma fase “bem crítica”, fazendo menção às dificuldades enfrentadas para arcar com os pagamentos de dívidas e com o custeio dos atendimentos.

Também acrescentou que entidades de outras cidades estão sofrendo mais que a de Tatuí. “Inclusive, as maternidades de Cesário Lange e de Cerquilho fecharam”, salientou.

Para conseguir manter os compromissos (pagamento de contas de água, luz, telefone, despesas trabalhistas e, principalmente, salários), Nanete disse que a provedoria achou por bem promover o corte na folha de pagamento.

“Nós queremos enxugar sem prejuízo ao atendimento. Não estamos aqui para brincar. Somos pessoas sérias. Isso é um hospital, e nós atendemos a população. Por isso, temos que ter pessoas competentes e que não faltem”, declarou.

Ainda conforme a provedora, as demissões serviram para “equalizar” a folha de pagamento. Nanete alegou que o hospital “inchou” entre os anos de 2010 e 2012.

Como a Santa Casa ainda possuía receita necessária para o pagamento dos trabalhadores, a diretoria alegou que conseguiu mantê-los em seus postos.

“Acontece que, agora, não dá mais. Se nós continuássemos com todos os funcionários, teríamos de optar por quem pagar. E não dá para escolher quem vai ou quem não vai receber. Trabalho e salário são coisas sérias”, disse.

Para definir os critérios de demissão, a provedora afirmou que a diretoria se reuniu com os responsáveis pelos setores entre janeiro e fevereiro.

Na ocasião, falou sobre a necessidade dos cortes e a respeito da redução do atendimento. Nanete também afirmou que chegou a conversar com alguns funcionários.

Conforme ela, o hospital entrou em entendimento com os trabalhadores e resolveu pagar a eles o aviso-prévio. As demissões aconteceram entre os dias 26 e 28 de fevereiro. Nos dias 26 e 27, houve desligamento de quem cumpria jornada de oito horas por dia. No dia 28, os do sistema 12×36.

A expectativa da provedora é de que a medida gere economia de 15%, “sem prejuízos”. Nanete sustentou que a readequação não afetará o atendimento à população. “Temos quadro suficiente para a demanda”, argumentou.

Os demitidos atuavam nas áreas de lavanderia, limpeza, manutenção e almoxarifado. A provedora afirmou que tinham salários “bem distintos” e que, por isso, não seria possível traçar uma média do custo mensal.

Saída repentina

Mesmo sendo esperada, a transferência dos atendimentos da Unimed (convênio particular) da Santa Casa para espaço próprio deixou a diretoria do único hospital público do município “sem chão”. A provedora afirmou ter sido comunicada oficialmente um dia antes da “saída definitiva”.

“Não houve comunicado com um prazo para que nós nos adequássemos. Existia uma expectativa, porque um hospital tinha sido inaugurado, e não havia mais motivos de atender na Santa Casa, mas fomos pegos de surpresa”, declarou.

Como medida emergencial, a Santa Casa decidiu enxugar a folha de pagamento. Em paralelo, a provedoria alega que está adotando “muitas providências” para reduzir os gastos e continuar honrando compromissos.

Para isso, revisou o sistema de manutenção. A equipe que mantém os equipamentos em dia está trabalhando de modo “mais autônomo”. Nanete disse que o objetivo é fazer com que os equipamentos fiquem em boas condições, gerando menor custo de mão de obra especializada.

Nesse sentido, a maioria dos reparos está sendo feita pelos funcionários do hospital. Parte deles recebe treinamento da Elektro, concessionária responsável por distribuição de energia elétrica, por meio de programa de uso sustentável.

A iniciativa vai permitir, ainda, que o hospital possa usar energia solar, conforme antecipado no final do ano passado por O Progresso.

Também para reduzir os custos, a lavanderia da Santa Casa passará a funcionar somente durante o dia. A direção do hospital informou que está terminando a adequação do espaço (que ganhou novas máquinas de lavar e de centrifugar em 2014) e ampliando o enxoval para evitar lavagens no turno da noite.

As medidas de reajuste incluem projeto de construção de um poço artesiano no terreno do hospital. Conforme a provedora, a diretoria pensa em implantá-lo para atender somente à lavanderia. “Nós já pesquisamos junto à Vigilância Sanitária e podemos utilizar esse tipo de água na lavanderia”.

Na farmácia, o hospital pretende reduzir os custos com medicamentos ampliando a implantação do sistema de distribuição dos produtos por dose unitária.

Nele, todos os medicamentos prescritos aos pacientes pelos médicos são fornecidos em doses, não mais em frascos, evitando o desperdício.

Pacientes que precisam de três doses diárias de um mesmo medicamento, por exemplo, recebem uma espécie de kit por dia, contendo as três dosagens. “Antes, usava-se o frasco todo e, quando a pessoa tinha alta, ele era descartado porque não tinha sido acondicionado corretamente”, contou Nanete.

Na mesma linha de trabalho, a Santa Casa está em fase de implantação de uma farmácia satélite para atender ao centro cirúrgico. Ela consiste em um núcleo farmacêutico que visa garantir rapidez na entrega dos medicamentos aos pacientes, atendendo em “tempo real” as prescrições dos médicos e auxiliando no controle do estoque.

As ações são consideradas complementares às demissões efetivadas pelo hospital. Conforme a provedora, a decisão do desligamento foi tomada estritamente por causa da questão financeira. “Não resolvemos mandar as pessoas embora porque não gostávamos delas, é porque não tinha outra maneira”.

De acordo com Nanete, o hospital teve queda acentuada da receita também por conta da não realização de procedimentos cirúrgicos particulares.

A razão é que o hospital não pôde mais receber por cirurgias realizadas por médicos vinculados à Unimed, uma vez que o conjunto de aparelhos usados em videolaparoscopia (cirurgia minimamente invasiva) pertence ao convênio.

No momento, a Santa Casa efetiva, apenas, cirurgias convencionais e que, conforme a provedora, oferecem muito risco para os pacientes. Para recuperar essa receita (as cirurgias particulares), o hospital quer adquirir um equipamento próprio. “Estamos analisando se compramos ou locamos”, disse Nanete.

O esforço da direção para manter o hospital em funcionamento inclui inscrições em todos os programas de recursos dos governos federal e estadual.

“Tudo que nós sabemos, por meio da Fehosp (Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Estado de São Paulo), e que é possível pleitear na área de média complexidade, nós estamos nos inscrevemos”, disse a provedora.

Nanete concluiu afirmando que a direção poderá recontratar os funcionários. Contudo, afirmou que essa projeção dependerá do quadro econômico.

“Eu até espero que a Santa Casa consiga, com essas medidas, melhorar. É um sonho de todo administrador, não que esperamos que o povo fique doente. Se não ficasse, seria melhor, mas, se a demanda aumentar e se nós conseguirmos um novo convênio, lógico que o quadro vai mudar”, concluiu.

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