Pequena aula de propaganda

Mario D’Andrea é o atual presidente da Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade) e da Dentsu, uma das maiores agências do segmento no mundo.

O publicitário já recebeu dezenas de prêmios nacionais e internacionais, entre os quais, nove vezes o Profissionais do Ano/Rede Globo, o Festival de N. York, ouro no London Festival, Grand Prix no Fiap e “14” Leões em Cannes. Pode-se considerar, sem qualquer desconfiança e esforço, que D’Andrea entende de propaganda.

Muito bem, ele esteve no programa “Show Business”, no domingo passado, 13, transmitido pela Band. À jornalista e apresentadora Sonia Racy, falou sobre fake news, jornalismo e, claro, propaganda, sempre evidenciando a proximidade e interdependência dessas atividades.

A princípio, o publicitário lembrou que as pessoas sempre distribuíram “fake news”, as informações falsas, inadvertidamente ou não. “O que acontece é que as redes sociais potencializaram isso absurdamente rápido”.

“As redes sociais, ao contrário do que se dizia, que iriam democratizar a informação, elas sucatearam a informação, porque começaram a fornecer de graça algo que é impossível fornecer de graça”.

“Veja: tudo que é de graça você deveria desconfiar. O bom jornalismo custa caro. Um veículo de comunicação que assina uma notícia teve um trabalho anterior gigantesco”, acentuou o publicitário.

“Toda vez que alguém está na rede social achando que está recebendo algo grátis, alguém está ganhando com isso – inclusive, vendendo seus dados. Está aí a prova no Facebook: você é a moeda de troca numa rede social”, argumentou D’Andrea.

“Por isso, as redes sociais, ao mesmo tempo em que são ágeis, também são mais lentas em conquistar a confiança das pessoas, pois sucateiam a informação de maneira gratuita”.

A melhor maneira de se prevenir contra a desinformação, também segundo ele, é a mesma já repetida à exaustão: conferir a fonte da notícia, buscar veículos de comunicação confiáveis e estabelecidos no mercado e ler as reportagens “até o final” – o que muita gente não faz, mas, a despeito disto, sai postando opiniões a comprometer ainda mais as informações corretas. Comentários, aliás e não raro, só não mais estapafúrdios que maldosos.

Neste aspecto, o publicitário, sem deixar de reconhecer a abrangência das redes sociais, reitera a condição fundamental da credibilidade não só para os consumidores de notícias, mas para o próprio mercado publicitário.

“As fake news despertaram um lado positivo no mercado, pois reforçaram a importância do jornalismo bem feito e, do ponto de vista da publicidade, reforçam que a qualidade é melhor do que a quantidade”, assegurou.

“O modelo de negócios vem se atualizando, mas a credibilidade continua sendo algo essencial no relacionamento entre os veículos e seus leitores”, afirmou.

Uma das consequências observadas por D’Andrea quanto à necessidade de informações confiáveis tem sido o aumento sistemático das assinaturas de jornais em suas versões digitais.

Isto acontece não só nos Estados Unidos (onde o movimento já é mais significativo), mas, também, no Brasil, particularmente junto ao público jovem.

“Posso até não concordar com o que está sendo dito, mas sei quem é e porque está sendo dito. Isso é fundamental, coisa que, na fake news, a gente não tem”, pontuou D’Andrea.

Essa tendência é francamente positiva não só para os veículos, mas para qualquer país cuja população preza pela democracia, a qual só pode ser sustentada com liberdade de expressão e de (confiável) informação.

Neste particular, o publicitário ressalta a importância da sinergia entre publicidade e imprensa séria para a manutenção da democracia.

“Uma das grandes missões da propaganda, nos grandes países do mundo, é ser avalista da liberdade de imprensa”.

“Se você pegar países onde a publicidade é avançada, a imprensa é absolutamente livre e avançada. Não é coincidência”.

Já o contrário, defendeu D’Andrea – apontando Coreia do Norte e Venezuela -, indica atraso e totalitarismo. “Em grandes países na história do mundo onde a imprensa não tinha liberdade como deveria, praticamente não havia propaganda”.

Já se dirigindo aos profissionais da área, D’Andrea lembrou que, quando o digital começou no país, dizia-se que iria “destruir ou derrubar” as grandes agências de publicidade especializadas nos veículos tradicionais, como TV e jornal, “mas foi exatamente o contrário”.

“Elas estão aí, e colocaram dentro de si a cultura digital”, contou, acrescentando que grandes agências digitais foram assimiladas pelas convencionais, tornando-se “off-line”, inclusive.

Por sua vez, defendeu que, “quando se fala em qual a melhor mídia para determinado produto”, deve-se verificar, na verdade, “qual a melhor mídia para se atingir o consumidor de determinado produto”. “Neste momento do dia, nesta jornada do consumidor, qual o melhor veículo? O centro de tudo que a gente faz é o consumidor, não necessariamente a minha tecnologia”, explicou.

“O caminho para se falar com o consumidor sobre os produtos”, conforme D’Andrea, ficou muito mais complicado e exigente quanto à dinâmica da publicidade.

“Se, antes, eu fazia um anúncio em televisão e um em revista e jornal e estava resolvido meu problema e do meu cliente, hoje, é muito mais complicado, exigindo mais tecnologia e inteligência de quem está fazendo o trabalho”.

Em virtude do volume de informações absorvidas pelas pessoas a todo instante e, por consequência, da dispersão, o talento, o profissionalismo e, principalmente, as informações sobre o produto e o mercado contam cada vez mais para o sucesso das campanhas.

Até por isso, segundo D’Andrea, os (bons) profissionais da área buscam a integração das ferramentas que envolvem mídias e veículos distintos.

Com relação aos impactos na atividade econômica dos países causado pela publicidade, D’Andrea evoca recente pesquisa internacional apontando que, a cada libra investida em propaganda na Grã-Bretanha, gerava-se quase dez libras na economia – não no mercado de publicidade, em vendas ou em empregos na área, mas na economia em geral, em aumento de demanda de consumo.

Essa mesma pesquisa, aplicada no Brasil a partir da expertise do grupo Deloitte, de atuação global, resultou em número ainda mais significativo. Conforme D’Andrea, a cada real investido em propaganda, são gerados R$ 10,69 na economia do país.

Dando apenas um exemplo, o publicitário questiona: “Quantas marcas de cervejas foram criadas ‘do nada’ e se produziram milhares de empregos para atender a uma demanda criada pelo marketing e pela propaganda?”.

Quanto à importância da propaganda justamente em momentos de crise, D’Andrea observa os anunciantes em posturas distintas. Os “grandes” têm clara a necessidade de aumentar os investimentos, colocando seus produtos e serviços ainda mais em evidência diante do consumidor. Já os “pequenos”, não.

No entanto, mesmo junto às grandes empresas, o publicitário reconhece dificuldades, especialmente quando administradas por profissionais essencialmente de áreas técnicas – como financeira, de produção etc. –, sem qualquer noção de marketing.

Conforme D’Andrea, quando sob administrações com essa carência, “as empresas encaram o marketing como custo, o que é um absurdo, porque marketing é o único lugar de uma empresa onde eu invisto e tenho retorno”.

“Se não tenho retorno, é porque foi feito algo errado. Mas ele (o marketing) é feito para dar retorno. É quase como colocar o seu dinheiro em um fundo de rendimento”.

“Não existe campanha cara ou barata; existe boa ou ruim. Simples assim. Agora, não fazer (publicidade) é a pior das decisões, porque você está abrindo mão da chance de melhorar as suas vendas ou, no mínimo, de se defender de uma crise”, sentenciou.

“No meio de uma crise, a gente sabe que tem de tomar decisões dolorosas, mas simplesmente fugir do mercado não me parece a decisão mais inteligente”, concluiu o publicitário.

Ao final da aula, observa-se que, diferentemente do que até alguns jovens publicitários podem crer, promover campanhas de marketing eficientes não se resume a duas ou três postagens no Facebook por semana.

E isto mesmo que as publicações sejam, realmente, “institucionais”. Ou seja, sem erros de português e isentas de imagens dos donos das empresas tomando caipirinha no pagode com os amigos…

Propaganda é algo muito sério, que assegura a própria democracia, garante a boa informação e, naturalmente, invoca pesquisa, ausência total de preguiça, conhecimento de causa e, claro, talento. Muito talento!