Novo protocolo foca em vítimas de abuso

Reunião aponta caminhos para o atendimento das crianças e adolescentes vítimas (foto: AI Prefeitura)

Um protocolo de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de abuso e violência sexual foi criado para normatizar e padronizar o acolhimento dessas pessoas nos órgãos públicos de Tatuí. O material será lançado oficialmente na terça-feira, 14, às 19h30, no teatro “Procópio Ferreira”.

A cartilha, desenvolvida por uma comissão da Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Social, em parceria com o CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente), reúne normas e um fluxo de procedimentos para estruturação padronizada do atendimento e acompanhamento de diferentes situações envolvendo violência sexual.

As informações são do presidente do CMDCA, Cláudio Bertolacini, e do secretário do Trabalho e Desenvolvimento Social, Alessandro Bosso. A O Progresso, eles contaram que a ideia de montar um protocolo surgiu em 2017, após a realização da primeira campanha “Faça Bonito” – desenvolvida anualmente pelo Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, celebrado em 18 de maio.

Conforme o presidente do CMDCA, ao trabalhar o tema em escolas, OSCs (organizações da sociedade civil) e Centros de Referência de Assistência Social, foram surgindo denúncias entre os participantes.

Ele afirma que a necessidade de atendimento levou a organização a perceber que o município não estava preparado para receber esse tipo de demanda.

“As pessoas que recebiam essa denúncia ficavam perdidas e não sabiam se o certo era encaminhar para o Conselho Tutelar, à delegacia, à Secretaria de Saúde ou a outro tipo de atendimento. Então, começamos a discutir sobre o fluxo, desde o acolhimento da denúncia até os procedimentos para agilizar e melhorar o atendimento às vítimas”, lembrou.

Diante das “fragilidades” da rede municipal na abordagem, atendimento e encaminhamentos das demandas recebidas como consequência das campanhas de prevenção, o presidente do CMDCA – um dos principais órgãos de atendimento à criança e ao adolescente (que, na época, era Alessandro Bosso) -, propôs a elaboração do “Protocolo de Atendimento à Criança e ao Adolescente em Situação de Violência Sexual do Município de Tatuí”.

O secretário destaca que, durante o período, uma comissão permanente, composta por membros do conselho, servidores municipais e Conselho Tutelar, por meio da resolução 06/2018, foi formada no intuito de coordenar os processos para a formalização do fluxo municipal de atendimento.

O secretário conta que foram necessárias diversas etapas, reuniões e debates para o estudo e compreensão dos fluxos internos das principais instituições, até que pudesse ser traçada uma forma de padronizar os procedimentos, consequentemente evitando a revitimização da criança ou do adolescente.

“A intenção era saber como estava sendo realizado o acolhimento da denúncia e como isso era levado adiante. Queríamos conhecer a dificuldade que cada órgão estava enfrentando para poder traçar um organograma completo, oferecendo adequada acolhida à vítima e à família e proporcionando encaminhamentos eficazes aos serviços da rede”, argumentou o secretário.

A comissão criou uma espécie de manual, que propõe corresponsabilidade por parte de cada um dos integrantes do chamado “Sistema de Garantias de Direitos”. Por isso, os últimos detalhes do protocolo foram definidos na segunda-feira, 6, data em que uma prévia da cartilha foi apresentada no paço municipal, em reunião com autoridades e agentes envolvidos em serviços de atendimento de crianças e adolescentes.

A apresentação teve participação da prefeita Maria José Vieira de Camargo; do juiz Marcelo Nalesso Salmaso, da Vara de Infância e Juventude; do presidente da Câmara, Antonio Marcos de Abreu; e dos secretários municipais Renato Pereira de Camargo (Negócios Jurídicos), Miguel Lopes Cardoso Júnior (Educação) e Kátia de Campos Abuchaim (Saúde).

Também estiveram presentes o presidente do Conselho Tutelar, Rodrigo Edval Batista, a vice-presidente do CMDCA, Daniele de Campos Mendes de Moraes, o gestor da Assistência Social, Edmar Pereira, além de Bosso e Bertolacini.

“Construímos o fluxo de baixo para cima, então, era necessário apresentar o planejamento, para que todos os envolvidos com o sistema de atendimento compactuassem com a cartilha. Agora, não será discutido mais nada, o material está pronto e terá que ser seguido. Cada setor vai ter que se organizar”, comentou o secretário.

Para o presidente do CMDCA, o protocolo também servirá de “termômetro” para saber os setores que estão funcionando de maneira correta e os que não estão cumprindo com as normas propostas.

“Na verdade, este protocolo é para acabar com este jogo de pingue-pongue em que um órgão passa o problema para o outro e para que a vítima seja atendida de fato, de maneira correta e de forma rápida”, acrescentou.

Bosso revelou que o protocolo trará um organograma constando todos os setores tidos como portas de entrada de denúncias, como escolas, Centros de Referência, delegacias, Conselho Tutelar e outros. Cada órgão será identificado por uma letra, na qual será descrita a função do setor e quais os procedimentos inerentes a cada um deles.

“A minha intenção e da comissão é que esta descrição de funções e procedimentos se transforme em lei ou decreto. Vamos regulamentar uma lei que já existe ou vamos montar uma lei nova, para que o protocolo criado funcione de fato”, destacou Bosso.

Os membros da comissão afirmaram que todo o conteúdo da cartilha será divulgado durante o lançamento oficial do material, na cerimônia de terça-feira, ocasião em que serão distribuídos os exemplares impressos.

Campanha ‘Faça Bonito’

A data para o lançamento do “Protocolo de Atendimento à Criança e ao Adolescente em Situação de Violência Sexual do Município de Tatuí” não foi escolhida por acaso. Na segunda-feira, 13, tem início a “Semana Municipal de Combate à Pedofilia e ao Abuso Sexual de Crianças e Adolescentes”.

A campanha municipal foi instituída pela lei 5.202/2017 e é celebrada anualmente na semana de 18 de maio, data que também marca o Dia Municipal de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, conforme a lei 5.102/2017.

As ações constam no Calendário Oficial de Eventos do Município de Tatuí e são inspiradas na campanha nacional “Faça Bonito – Proteja Nossas Crianças e Adolescentes”.

A ação nacional, conforme o site oficial da campanha, escolheu a data porque em 18 de maio de 1973, na cidade de Vitória (ES), um crime bárbaro chocou todo o país e ficou conhecido como o “Caso Araceli”.

Esse era o nome de uma menina de apenas oito anos que havia sido raptada, estuprada e morta por dois jovens. Conforme Bosso, a proposta é mobilizar, sensibilizar, informar e convocar toda a sociedade a participar da luta em defesa dos direitos de crianças e adolescentes.

Ainda como parte da campanha municipal, no sábado, 18, será realizada a tradicional passeata pelas ruas centrais da cidade, com saída às 9h, em frente à prefeitura, seguindo até a Praça da Matriz.

Os preparativos para a ação municipal tiveram início no dia 15 de abril. A Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Social e o CMDCA promoveram, no Centro de Artes e Esportes Unificados “Fotógrafo Victor Hugo da Costa Pires”, o CEU das Artes, uma reunião entre representantes da sociedade civil e do governo para a definirem a programação da edição 2019.

Ao todo, 37 pessoas participaram, entre elas, representantes de OSCs, do Comitê de Cidadania da Ford, do Colégio Objetivo e do Conpas (Conselho de Pastores Evangélicos de Tatuí).

Representando o governo, estiveram pessoas ligadas às Secretarias Municipais de Saúde, do Desenvolvimento Social e da Educação, além da Secretaria Estadual de Educação.

Conforme Bosso, o objetivo da reunião foi chamar as instituições da iniciativa pública e privada para divulgar a campanha e convidá-los a desenvolverem ações durante a “semana de conscientização”.

“É o quarto ano da campanha em Tatuí. Sempre tivemos uma boa participação, mas a maioria era do setor público. Neste ano, queremos unir forças com a iniciativa privada, que, afinal, também deve estar engajada com os direitos das crianças e adolescentes”, disse Bertolacini.

Algumas instituições, inclusive, já anteciparam a campanha e começaram a trabalhar o tema ainda no mês de abril. Escolas municipais e estaduais estão trabalhando com pesquisa e redação, enquanto o Cras Leste, durante o mês, abordou o tema nas reuniões com famílias beneficiárias de programas sociais.

Os órgãos que participaram da reunião de apresentação da campanha receberam um questionário, criado por meio de uma plataforma online, para preencher.

Os dados compilados devem mostrar o número de pessoas que participaram, quais os tipos de atividades desenvolvidas e outros detalhes, como idade e público atingido.

O resultado será apresentado durante o evento de lançamento do protocolo, no Conservatório de Tatuí. “Por meio deste material, vamos ter um parâmetro de todas as atividades realizadas durante a campanha e poderemos mensurar o resultado alcançado”, explicou o presidente do CMDCA.

Bertolacini destacou que a intenção da campanha é incentivar as pessoas a denunciarem. “Até é por isso que, nos panfletos da campanha, a gente só divulga o disque 100 e 181. A campanha é para que haja conscientização, para que crianças que estejam sofrendo isso sejam identificadas e para que sejam investigadas todas as situações”, concluiu.

Violência sexual

Segundo números da Secretaria do Trabalho e Assistência Social, as notificações de violência doméstica ou sexual com vítimas entre 0 e 20 anos têm oscilado ao longo dos últimos três anos.

O órgão mostra que, em 2016, foram registrados 15 casos caracterizados como violência sexual. Já em 2017, houve 13 atendimentos e, em 2018, o número voltou a subir, com o registro de 15 casos. Somente neste ano, aconteceram quatro notificações.

Já os dados divulgados pela SSP (Secretaria de Segurança Pública) mostram que os números tiveram alta nos últimos três anos. De 2017 para 2018, o crescimento foi de 43%, passando de 28 para 40 casos registrados nas delegacias de Tatuí.

Somente nos três primeiros meses deste ano, a SSP contabilizou 13 casos de estupro de vulnerável, enquanto que, no primeiro trimestre de 2018, foram nove casos e, em 2017, três casos no mesmo período.