Da reportagem
O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes determinou a quebra de sigilo bancário do deputado federal tatuiano Guiga Peixoto (PSL-SP) e outros nove deputados e um senador, na terça-feira, 16, em decorrência de inquérito que investiga atos antidemocráticos, entre os quais, os que pedem fechamento do Congresso Nacional e do STF.
Na quarta-feira, 17, a O Progresso, o parlamentar tatuiano negou que tenha participado ou financiado qualquer tipo de manifestação e disse estar tranquilo quanto às investigações determinadas pelo Supremo Tribunal Federal.
“Minhas contas bancárias não têm nenhum segredo, até porque não participei nem financiei nenhum ato de manifestação. Quanto a isso, estou tranquilo, sempre estive e sempre estarei dentro da lei. Então, não tenho o que temer”, sustentou o parlamentar.
Sobre a quebra de sigilo, Guiga afirmou ter ficado sabendo do caso pela imprensa e que não fora notificado pelo STF, mas que está à disposição da Justiça. Também ressaltou estar indignado com a investigação.
“Não recebi nenhuma notificação oficial, só soube da investigação por meio da imprensa e, além disso, desconheço qualquer caso de quebra de sigilo bancário de algum deputado por algo deste tipo”, disse o deputado.
Guiga assegurou também que, na conta bancária dele, estão apenas doações a instituições filantrópicas e entidades assistenciais.
“Tem doações para asilos de Tatuí, Boituva, Cerquilho, Sorocaba e Itapeva; Apaes de Boituva e Tatuí; educandários, em Tietê e Itapetininga; e Igreja Sagrada Família e Conselho de Pastores Evangélicos de Tatuí”, detalhou.
Além de Peixoto, foram alvos da quebra de sigilo bancário os deputados: Cabo Junio do Amaral (PSL-MG), Carla Zambelli (PSL-SP), Bia Kicis (PSL-DF), Otoni de Paula (PSC-RJ), Carolina de Toni (PSL-SC), Alê Siiva (PSL-MG), General Girão (PSL-RN) e Aline Sleutjes (PSL-PR). O senador atingido é Arolde de Oliveira (PSD-RJ). Todos da base de apoio do presidente Jair Bolsonaro.
A decisão de Moraes foi tomada em conjunto com a autorização de ações de busca e apreensão cumpridas pela Polícia Federal, mais cedo, em endereços ligados a 21 alvos relacionados aos atos investigados.
A operação, batizada de “Lume”, foi solicitada pela Procuradoria-Geral da República – que conduz as investigações abertas em abril -, com apoio do Ministério Público Federal, em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Maranhão, Santa Catarina e no Distrito Federal.
O inquérito do STF investiga a origem de recursos e a estrutura de financiamento de grupos suspeitos de organizarem os atos. Segundo o MPF, há indícios de que as 21 pessoas alvos da operação possuem envolvimento com a realização de manifestações pedindo o fechamento do STF e do Congresso Nacional.
Conforme o órgão, uma linha de apuração é de que os investigados teriam agido de forma articulada com agentes públicos que possuem foro privilegiado “para financiar e promover atos que se enquadram em práticas tipificadas como crime pela Lei de Segurança Nacional (7.170/1983)”.
Para Guiga, a forma como está seguindo a investigação, com quebra de sigilo bancário e buscas, é um exagero. Ele também apontou que atos e manifestações ocorreram em outros momentos, “sem que ninguém fosse punido”.
“Tivemos outros atos até de vandalismos, como o ‘Antifas’, e ninguém foi indiciado. Em 2014, o MST invadiu o STF e nada aconteceu, picharam o Palácio do Alvorada e não vi ninguém ser punido. Então, eu realmente fico sentido com a forma como os poderes estão agindo. E tem um poder que está querendo sobressair dos outros dois”, acrescentou.
“Sou respeitoso com as instituições, com todos os poderes, porém, como cidadão brasileiro e como parlamentar, eu gostaria de ser respeitado. Se um ministro ligasse e pedisse, o meu extrato estava à disposição”, completou Guiga.
O parlamentar ainda reiterou apoio ao presidente Bolsonaro. “Sou fiel e verdadeiramente apoiador incondicional do presidente, acredito nele sem dúvida alguma. Tem muitas coisas que ele fez, mas posso destacar que, em um ano, ele recuperou um milhão de empregos”.
“Tristemente, tivemos a pandemia, que atrapalhou todo aquele projeto de alta da economia como estávamos prevendo, com a geração de empregos, com a facilidade de negócios, entre outras coisas. Contudo, reafirmo meu apoio incondicional a Jair Messias Bolsonaro”, adicionou.
E finalizou: “Estou tranquilo e sereno, também estou triste com tudo isso, mas nada me abalará neste movimento que estou fazendo em prol de um Brasil novo, com o compromisso com o futuro. Um Brasil com ferramentas, ética, transparência para as próximas gerações. É só isso que eu quero”.
Divulgação
De acordo com a prestação de contas e notas fiscais apresentadas pelos parlamentares e disponíveis no portal de transparência da Câmara dos Deputados, Bia, Girão, Aline e Guiga contrataram os serviços de empresas do publicitário Sérgio Lima para cuidar de redes sociais.
O publicitário é um dos alvos da ação de busca e apreensão em operação da Polícia Federal e recebeu ao menos R$ 87.700 da cota parlamentar dos quatro deputados da base de apoio do presidente na Câmara nos últimos seis meses.
Os gastos foram declarados como “divulgação de mandato parlamentar” e são legais, permitidos pelo regimento interno da Câmara. Lima é o criador da identidade visual e articulador da “Aliança pelo Brasil”, partido político que o presidente Bolsonaro pretende fundar. Todos negam qualquer irregularidade ou participação em atos contra a democracia.
Cada parlamentar tem direito a uma cota mensal independente dos salários, incluindo o dos funcionários de gabinete, que varia entre R$ 30.788,66, no Distrito Federal, e R$ 45.612,53, em Roraima. O valor é destinado a despesas do mandato, como passagens aéreas, conta de celular e divulgação de mandato.
Conforme o portal da transparência, Guiga pagou, de março a maio, R$ 6.500 por mês à empresa de Lima. O parlamentar confirmou a contratação dos serviços e ainda afirmou que as redes sociais dele cresceram desde que Lima assumiu o serviço.
“Eles acompanham meu mandato e fazem a divulgação nas minhas redes sociais. Fazem tudo para mim, as postagens, tudo. Eu apenas entro e acompanho o que está sendo feito”, declarou.
Quebras de sigilo
Em outras oportunidades, diversos políticos já foram alvos de medidas semelhantes, principalmente no âmbito da Lava-Jato e de operações derivadas.
É o caso, por exemplo, do então presidente Michel Temer, que teve o sigilo quebrado pelo ministro Luís Roberto Barroso (STF), em 2018, no inquérito que investigou supostas irregularidades no setor portuário. Inicialmente, Temer disse que iria divulgar os extratos, mas depois recuou.
Outros chefes de Poderes também foram alvos de quebras de sigilo, como o então presidente do Senado Renan Calheiros, em 2015, e o então presidente da Câmara Eduardo Cunha, em 2016. Os dois eram investigados na operação Lava Jato.
Medidas como essa já atingiram também governadores, como Luiz Fernando Pezão, ex-governador do Rio de Janeiro, e Wilson Witzel, atual governador do estado.
O pequeno volume de saques em uma conta de Pezão foi um dos indícios que o levou à prisão, em novembro de 2018, quando ainda estava no cargo. Já Witzel é investigado por supostas fraudes na área de Saúde. Nos dois casos, as quebras foram autorizadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a quem compete conduzir investigações contra governadores.
A lista de parlamentares inclui, ainda, o atual deputado federal e então senador Aécio Neves (PSDB-MG), em 2017, e o ex-presidente e atual senador Fernando Collor (Pros-AL), em 2015.
Mais recentemente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente Bolsonaro, também teve o sigilo quebrado, a partir de investigação sobre uma suposta “rachadinha” no gabinete dele, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).