Menor aprendiz no mercado de trabalho





Paula Bragalda

Menores Aprendizes do programa social participam de oficina de comunicação oral e escrita ministrada por professores e voluntários do ‘Lar Donato Flores’

 

Inclusão social é o objetivo do programa “Lar Espaço Feliz”, mantido pelo Lar “Donato Flores”, entidade que oferece atividades ininterruptas a 150 meninas da cidade.

A organização social fundada em 1961 e já inseriu 54 jovens no mercado de trabalho, por meio do programa de encaminhamento “Menor Aprendiz”. Ele teve início em 2003 e completa, neste ano, 11 anos de funcionamento.

Mesmo em férias parciais das oficinas, as atividades do projeto que já atenderam outras 200 jovens, continuam “a todo vapor”. As ações serão retomadas na totalidade dia 3 de fevereiro. Elas acontecem de segunda a sexta, em dois períodos: das 8h às 11h e das 14h às 17h.

Com base no ensino extracurricular do Lar, as meninas que ainda cursam o ensino médio, em período oposto às oficinas, ganham a primeira oportunidade de emprego por empresas parceiras da instituição. “A maioria delas é absorvida pelas empresas”, afirma a coordenadora voluntária do Lar, Ana Feltrin.

Segundo ela, a empresa contrata conforme a necessidade, sendo a maioria encaminhada para o serviço administrativo. Ana afirmou, também, que as contratantes “não correm riscos”. A razão é que elas fazem uma triagem, analisam o perfil das meninas para, posteriormente, seguir com as seleções.

“Temos empresas que rescindiram um contrato, porém, efetivaram a menina em outro cargo, e contrataram mais uma. Muitas das nossas já estão no Conservatório e em outras empresas privadas. Além delas, temos meninas em ‘intercâmbio’, em São Paulo e Jundiaí, e que são medalhistas no judô”, conta Ana.

Para a coordenadora, “é muito satisfatório ver a realização pessoal e profissional dessas jovens”. Ela disse que esse “é o verdadeiro significado” de inclusão social.

A coordenadora também cita como gratificante o fato de a coordenação receber “boas notícias” a respeito das meninas que permaneceram no Lar. “Pelo menos uma vez por ano, costumamos nos reunir com as aprendizes, para saber como estão”.

É o que diz, também, o diretor do Lar, Ubirajara Interdonato Feltrin. O “Bira”, como é conhecido, mostrou-se entusiasmado com os resultados do programa. “As meninas veem que precisam estudar, batalhar e correm atrás. Algumas voltam para nos contar sobre a vida. Muda tudo, desenvoltura, fala”.

Baseado nos casos de sucesso do Lar Espaço Feliz, ele diz que a inclusão social na vida das meninas assistidas é visível e passível de medição.

“Elas perdem a vergonha de falar, de se expor, por causa das aulas de dança, teatro e coral. As apresentações no Conservatório mudam-nas. Desenvolvem a pessoa, promovem a vontade da discussão”, enumerou.

De acordo com Ana, o contrato em regime de CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) das meninas encaminhadas pode ser temporário. Por esse motivo, os contratos têm ou não chance de serem prorrogados. As regras seguem exigências do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego).

“O contrato temporário pode expirar e ou pode se tornar fixo, mas há regras que precisam ser observadas, tudo com o nosso acompanhamento, porque são menores de idade”, explicou.

A coordenadora informa, ainda, que a missão do Lar não é “arrumar” colocação de trabalho a nenhuma das meninas. Destacou, também, que o resultado do trabalho social tem gerado índice satisfatório de alocações, devido ao nível de conhecimento delas.

“Os escritórios, as lojas, quando precisam de alguém com um nível eficiente de conhecimento, sempre nos ligam. Dificilmente elas ficam desempregadas. Não cobramos nada por isso, o nosso trabalho é social, apenas”, ressalta.

Ana destaca que, para serem atendidas pelo projeto, as meninas que estão cursando o ensino médio precisam ter informações de todas as rotinas administrativas. “Informática, raciocínio lógico e matemático, comunicação oral e escrita, cidadania e civismo”, completou.

A possibilidade de incluir o programa de colocação no mercado de trabalho pela entidade surgiu, como assegura a coordenadora, em consequência às atividades do Lar Espaço Feliz. De acordo com Ana, ele obedece “a uma grade específica de conteúdo e tempo de permanência na instituição”.

“Antes, o programa se encerrava em 24 meses. As meninas vinham ao Lar por duas horas e permaneciam mais seis horas na empresa, todos os dias da semana. Em julho do ano passado, isso foi modificado pelo ministério”, citou.

As meninas que participam do programa são divididas em turmas, sendo que uma frequenta a entidade todos os dias e a outra permanece no Lar por algumas horas, cumprindo jornada de seis horas nas empresas.

Durante 11 meses, as meninas encaminhadas trabalham de terça a sexta. Nesse caso, elas frequentam atividades na entidade somente às segundas.

As demais equipes revezam-se, atendendo a um prazo de 23 meses de contrato. Essas ficam segunda-feira no Lar e de terça a sexta nas empresas.

De acordo com Ana, o ritmo ficou “puxado”, pois o que antes era programado para acontecer em 24 meses, se realiza em 11 ou 23 meses, em função do tempo de trabalho (atuais quatro horas na semana em comparação com o trabalho que era desenvolvido todos os dias). “Tá puxado pra nós e pra elas”, comentou.

Seleção

Atualmente, as meninas são oriundas de diversos locais da cidade. E como a procura pelo Lar Espaço Feliz costuma ser grande, a entidade estabelece alguns requisitos básicos para a seleção. No caso, a escolha da turma de 2014 encerrou-se no dia 21 deste mês, sendo realizada nos períodos da manhã e da tarde.

“Tem que ter renda de meio salário mínimo per capita, ou problema social detectado pela assistência social – o que justifica os critérios de escolha. A nossa capacidade máxima é de 150 meninas, pois temos que atendê-las com lanche, uniformes e material de apoio”, afirmou a coordenadora.

Conforme assegura, muitas das meninas acabam indo ao Lar por conta própria, pois todas as oficinas são gratuitas. Ana argumenta que as atividades são “de extrema importância na vida das assistidas”. Em especial, por conta da primeira oportunidade de emprego que o projeto representa.

Aprendizes

Adriele da Cruz Silva, que está há seis anos na instituição, e Sthefany da Costa Oliveira, há sete, são da terceira turma de aprendizes.

Elas frequentam aulas de “rotinas administrativas” e ingressaram no dia 23 deste mês, quinta-feira, na empresa Ford. A primeira está no RH (recursos humanos) e a segunda, no setor de engenharia. Ambas retornam na segunda-feira, 27, para as oficinas do Lar.

Elas ingressaram na mesma empresa que outra integrante, Natalia de Brito Coutinho, 16. A jovem está há três anos na ação e disse que o convívio no Lar ajudou a aprimorar suas habilidades e a melhorar o aprendizado.

“Tudo o que aprendo é uma experiência para mim. Não há dinheiro que pague o contrato de menor aprendiz. As aulas de administração, português, matemática – assuntos complementares -, levamos para a vida toda, principalmente para o comportamento no trabalho e na conversa com outros profissionais”.

Natalia está no segundo ano do ensino médio e atua na área ambiental da empresa. Ela quer seguir carreira, após a conquista do emprego por meio do programa. Ela trabalha das 8h às 15h. Para conseguir realizar o sonho, a jovem já está fazendo cursos complementares, como o de jardinagem.

A menor aprendiz Carla Monique de Campos Ribeiro, que trabalha na CCR-SPVias, considera que o Lar possibilita às meninas “uma oportunidade ímpar”. “Muitas outras, da minha idade, não têm esta chance de melhorar enquanto profissionais”.

Carla está no terceiro ano do ensino médio. Trabalhou no RH da concessionária e, atualmente, integra a equipe que atua “na interação com o cliente”.

Quanto à escolha da faculdade, ela ainda tem dúvidas sobre direito ou relações internacionais. Afirmou, apenas, que tenta se decidir em sala de aula.

Para ajudar Natalia e tantas outras meninas, Beatriz Moraes de Abreu, educadora social, utiliza, como método do aprendizado, frases de incentivo.

As mensagens são escritas na lousa. Ela também lê as redações entregues na aula anterior e cita os principais erros gramaticais e por quais motivos não repeti-los novamente.

O Lar mantém uma profissional por oficina. A grade de horários e as atividades são variadas e consideradas extracurriculares. Para o primeiro semestre, as meninas discutem, nas oficinas, o tema: “As Multifaces do Brasil, Envolvido pelo Clima da Copa do Mundo de 2014”.

A lista com as modalidades desenvolvidas e monitoradas pelos educadores sociais, que são funcionários e voluntários do espaço, é composta por: judô, dança, artes, artesanato, coral, teatro, raciocínio lógico e matemático, comunicação oral e escrita, apoio pedagógico, informática, rotinas administrativas, programa de aprendiz, saúde, segurança, cidadania e civismo.

Interação familiar

O Lar “Donato Flores” desenvolve trabalho teórico para garantir o atendimento direto e a defesa de direitos da criança e adolescente, no contexto familiar e comunitário. O objetivo é “reafirmar a natureza de entidade beneficente e de assistência social”.

A instituição conta com um abrigo para crianças de até seis anos de idade e meninas até os 18. Promove ações consideradas importantes. Entre elas, encontros com as famílias.

Os cursos são “formativos e informativos”, acontecem no período noturno e abrangem informática, palestras, biblioteca aberta e atendimento psicológico, ministrado por uma aprendiz voluntária.

“Já fizemos palestras sobre o câncer de mama (no ‘Outubro Rosa’), sexualidade, Facebook (redes sociais) e o ‘Novembro Azul’, além de outras coisas que ajudam na formação dos pais e do atendimento psicológico”, contou Ana.

A coordenadora ressalta que, sem a participação dos pais, o trabalho “não é redondo, pois eles têm que falar a mesma língua dos jovens e incentivá-los”.

Além do Lar Espaço Feliz, que é ininterrupto, as aprendizes participam de diversas ações sociais. Há, ainda, um projeto de férias, que é opcional.

“Essas atividades acontecem todas as terças e quintas, e são mais lúdicas. As meninas que querem aproveitam para olhar as irmãs e realizar outra tarefa em paralelo”.

Dificuldades

Mesmo com estrutura e instalações amplas e arejadas, conforme comprovou a reportagem de O Progresso, atualmente a principal dificuldade para a instituição funcionar, segundo Ana, é a financeira.

“Nós necessitamos de uma equipe mínima de funcionários, tanto no abrigo quanto no fortalecimento de vínculos, que é o Lar Espaço Feliz, e, sem recursos, é difícil”, disse.

“Se não tivermos essa equipe mínima, não podemos funcionar. Os profissionais têm que ser contratados, seja por CLT, seja por serviço temporário. Se for voluntário, com contrato de voluntário. Isso, juridicamente correto, senão perdemos imunidades e nossas certificações”, alegou.

A entidade é mantida com contribuições, doações, parcerias e com renda obtida por meio de bazar, jantar e festas juninas. As atividades “costumam ajudar na manutenção e no pagamento da folha e do 13º salário dos funcionários”.

Os interessados em colaborar com a instituição podem fazer depósitos na agência 0172, por meio da conta-corrente 13-002026-6, banco Santander, CNPJ, 72.196.256/0001-27.