Irmãos torturados eram agredidos no Congonhal também por homem





Os três irmãos de 11, 8 e 7 anos de idade encontrados com sinais de violência pelo Conselho Tutelar na tarde de sexta-feira, 18, eram agredidos também por um homem. É o que informou o presidente do órgão, advogado Luiz Eugênio dos Santos Netto, a O Progresso.

Segundo ele, uma das crianças estava muito ferida. Ela e os irmãos receberam atendimento médico e serão submetidas a tratamento psicológico.

Os meninos estavam sendo criados por uma mulher de 44 anos, acusada de sequestro, cárcere privado, uso de documento falso, falsidade ideológica e tortura.

A mãe adotiva também detinha a guarda provisória de uma menina de quatro anos de idade, irmã dos meninos. A mulher responderá às acusações detida, junto com a filha dela, de 21 anos, e com a mãe biológica dos meninos, de 30.

Conforme os primeiros relatos feitos pelas crianças aos conselheiros, o marido da mãe adotiva, um homem de 34, também participava das agressões.

Os meninos teriam dito que ele, a filha e a proprietária do sítio, localizado no bairro Guarapó, costumavam espancá-los por “motivos fúteis”. Eles usariam, principalmente, tiras de borrachas usadas para fabricação de arreios de animais.

Conforme o CT, as agressões ocorriam, por exemplo, quando uma das crianças não fazia a lição de casa, num dos cômodos em separado da propriedade.

Em alguns casos, as crianças eram obrigadas a permanecer no local, usado para guardar ferramentas, ração para animais e itens usados na manutenção do sítio.

Santos Netto vistoriou a propriedade na companhia da conselheira Fabiana Cristina Cubas Campos e com apoio da GCM (Guarda Civil Municipal). Eles chegaram ao local, às 15h33, para averiguar denúncia feita pela mãe biológica das crianças.

O presidente do CT explicou que ela recebeu voz de prisão por conta da adoção de uma das crianças – a menina. De acordo com Santos Netto, há indícios de que a adoção aconteceu de maneira ilegal. Também houve comprovação, por meio de indicadores, de que as crianças eram mantidas em cativeiro.

Para os conselheiros, a mãe biológica contou que entregou os filhos ao casal com intuito de que cuidassem deles. Com o apoio do companheiro, a mãe adotiva conseguiu regularizar a guarda das crianças, conforme verificado pelos conselheiros. Santos Netto confirmou que a mulher ingressou com pedido na Justiça. “Ela estava com eles havia, aproximadamente, mais de dois anos”, comentou.

As crianças foram morar com o casal no final de 2012. Desde então, continuaram mantendo contato com a mãe biológica. “Ela pediu para ficar perto dos filhos e acabou indo morar com o atual companheiro no sítio”, disse Santos Netto.

No convívio com os filhos mais velhos – de 11 e 8 anos –, ela teria começado a perceber sinais de mudança no comportamento deles. A mulher informou aos conselheiros que as crianças revelaram estar sendo vítimas de agressão. Em princípio, os meninos falaram que sofriam castigos.

Eles seriam penalizados pela mulher, o companheiro dela e pela filha do casal. A situação que resultou na verificação de indícios de maus-tratos, conforme relato das crianças, decorreu de um encontro entre a mãe biológica e um dos filhos, no dia 18.

A mulher disse, para os conselheiros, que passara na escola das crianças para buscá-las, mas não encontrara o menino de oito anos.

“Ela perguntou para o irmão, de 11, porque ele não teria ido. O menino, então, revelou que esse tinha apanhado no dia anterior e que estava preso num quartinho”, disse Santos Netto. O espaço era utilizado para armazenar equipamentos.

A criança também contou, para a mãe biológica, que o irmão tinha sido agredido na sexta-feira. Depois de tomar conhecimento da situação, a mulher acionou o CT. “Nós encontramos a criança de oito anos bastante machucada”, relatou o conselheiro. O menino tinha ferimentos nas costas e nas nádegas.

Para os conselheiros, ele informou ter sido castigado com uma borracha pela mulher de 44 anos. O menino acrescentou, ainda, que as agressões ocorriam constantemente, mas não soube precisar a quanto tempo. Também comentou que o companheiro da mãe adotiva e a filha dela se revezavam nos castigos.

A delegada Rafaela Valério de Melo determinou a prisão temporária dos envolvidos, incluindo a mãe biológica que fez a denúncia. Santos Netto explicou que ela verificou a existência de fraude na documentação da menina de quatro anos.

“O casal fez com que a mãe biológica aceitasse reconhecer a menina como filha do companheiro da mãe adotiva. Pelo que nós apuramos com testemunhas, a mulher que denunciou não teve nenhum relacionamento amoroso com o homem. Isso foi feito para facilitar a obtenção da guarda”, relatou.

As três mulheres detidas foram encaminhadas à Cadeia Pública de Cesário Lange. O marido da mãe adotiva não estava na propriedade no momento do flagrante. Conforme o presidente do CT, ele pode ser considerado foragido.

A irmã adotiva das crianças teria justificado as agressões enquanto era ouvida pelos conselheiros. Santos Netto informou que ela mencionou ter batido nos meninos porque eles “fizeram algo que ela não concordou”. Ela também teria confirmado que deixava as crianças num local apelidado de “quarto da tortura”.

Além dos ferimentos encontrados no menino de 8 anos e nas marcas verificadas nos corpos dos irmãos dele, de 11 e 7 anos, o presidente do CT disse que os depoimentos das crianças não deixam dúvidas de agressões e maus-tratos.

De acordo com ele, todos os meninos ouvidos pela equipe relataram espancamentos de forma semelhante e contaram terem sido deixados no quarto.

“O depoimento das crianças é claro: o quarto era mesmo usado para aplicar as agressões. Fora o físico, os meninos sofreram danos psicológicos”, constatou o conselheiro.

Segundo ele, as crianças costumavam ser deixadas no local até que os machucados sarassem. A intenção era evitar que as lesões pudessem ser vistas na escola. “Elas ficavam lá até melhorarem”, declarou.

O CT descartou a possibilidade de as crianças serem obrigadas a trabalhar. Contudo, antecipou que será preciso realizar novos exames e acompanhamentos. Atenção especial será dada à menina de quatro anos.

“Por conta da idade, ela não foi ouvida, mas será entrevistada por psicólogos. Ela aguarda uma intervenção mais específica do fórum”, comentou.

Até o fechamento desta edição (terça, 17h), as crianças permaneciam na Casa de Acolhimento (antiga Casa de Abrigo Transitória), no Vale da Lua. Elas poderão ser entregues a familiares da mãe biológica, ou ficarem no local. A decisão cabe à Vara da Infância e da Juventude. A Polícia Civil abriu inquérito.