É Carnaval





O carnaval em Tatuí foi famoso em todo o estado de São Paulo. Além dos bailes carnavalescos nos clubes, as ruas borbulhavam em festa. O centro da cidade se transformava no reino de Momo: a partir da praça da Matriz, praça da Santa, as proximidades dos clubes – Recreativo, Tatuiense, Tatuí Clube e Sociedade Italiana -, rua Onze, rua Prudente, rua José Bonifácio… fora do centro, o bairro Quatrocentos também explodia em alegria. Na ocasião, havia mais alguns bares nesse bairro, além do animadíssimo clube Princesa Isabel.

Quem viveu essa época nem mesmo tem vontade de sair às ruas nos atuais carnavais, desanimadíssimos e sem graça. Os hotéis da cidade não tinham vagas, pois os turistas reservavam aposentos até mesmo com um ano de antecedência.

Ah, e a Prefeitura não precisava de verbas para patrocinar os festejos, pois quem fazia a festa era a população. Sobrava, claro, trabalho ao pessoal da limpeza pública (que na ocasião eram funcionários municipais), pois a quantidade de confete e serpentina nas ruas do centro era imensa.

O carnaval de rua era animado também pelo Cordão dos Bichos, dirigido pelo Moacir Peixoto e que contavam com a participação de inúmeros tatuianos. O professor Wilson Bertrami, arquivo vivo de Tatuí, recordando antigos carnavais, lembrou-se de um dia, quando o Cordão dos Bichos desfilava no entorno da praça da Matriz, e que, dentre os bonecos do cordão, havia uma jaula com um integrante fantasiado de leão, cujo domador era o famoso Joaquim Meia Garrafa.

Durante as décadas de 1960 e 1970, do alto de seus 140 centímetros, Joaquim Tavares de Almeida marcou um pedaço da história de Tatuí. Inteligente, dono de uma vivacidade incrível, não passava despercebido em qualquer lugar em que estivesse. Quando aparecia, tornava-se o centro das atenções.

O pequeno domador manuseava um chicote para dominar o “leão” preso na jaula. Como era bastante popular na cidade, a cena agradou muito à multidão, que aplaudiu intensamente.

Com os aplausos, Joaquim Meia Garrafa empolgou-se e aumentou as chicotadas no leão, a ponto de machucar realmente. Ah, o rapaz que vestia a fantasia de leão enfureceu-se com o Joaquim, abriu a jaula, desceu e foi bater no “domador”. Temendo apanhar, Joaquim largou ali o chicote e saiu correndo por entre a multidão, perseguido pelo furioso leão, arrancando gargalhadas de todos que ali estavam. Nem deu mais para prosseguir com aqueles personagens e a jaula ficou vazia. O domador teve de ser substituído pelo Moacir Peixoto.

Enquanto a cidade toda festejava, nos bares e no clube Princesa Isabel do bairro Quatrocentos a animação era geral. Só ao redor da esquina da rua Maneco Pereira com a rua do Cruzeiro, havia 5 bares. Nos arredores da esquina de baixo, da Maneco Pereira com a rua São Bento, mais 3 bares e, no meio do quarteirão entre a Cruzeiro e a São Bento, o Clube Princesa Isabel, fervilhando de gente.

Por ali, o rei do pedaço na ocasião era o Amado de Jesus Miranda, conhecido como Amadão. Homem forte e ágil, mantinha longe qualquer um que quisesse se impor no clube. Era também o mestre-sala da escola de samba tatuiana. E muito bom na capoeira, motivo que espantava os valentões do local.

Certo carnaval, um frequentador do bairro Quatrocentos, conhecido como Vadô Marques, passou todos os momentos de festa acompanhando o Massagem. Esse homem, conhecido pelo apelido de Massagem, borracheiro da Rabelo, era extremamente forte, capaz de erguer uma roda de trator com pneu como se fosse uma pena. Ficou muito famoso na cidade devido a sua força. Acho que nem o Amadão abusava do Massagem.

Andar com o Massagem dava uma sensação de segurança em qualquer ambiente, pois o homem, forte como era, todos respeitavam. Imagine, mexer com o Massagem!!! Ô loco!

Mas o Vadô Marques não estava em busca de segurança, mas sim estava com um apetite de leão e, sabendo que o Massagem não era nem um pouco pão duro quando o assunto era comer, ficaram os dois, além de outros amigos, nos bares do Quatrocentos, tomando cerveja e comendo uns tira-gosto e, para completar, em todas as noites desse carnaval comeram a famosa bisteca do Caipirinha, que na ocasião era feita e servida nas dependências do clube Princesa Isabel. Havia, ainda, um pessoal que, para agradar o Massagem, pagava tudo que ele consumia. Vadô aproveitava-se disso também.

No final da noite de terça-feira de carnaval, saciadíssimo, segundo o testemunho do Ari Bicheiro, Vadô prometeu ao Massagem:

– Este ano você pagou tudo, mas no ano que vem, pode ficar certo, será tudo por minha conta! – papeou. Massagem nem deu bola, pois se fosse crer nisso estaria esperando até o fim da vida.

Voltando à praça da Matriz, Joaquim Meia Garrafa entrou no Bar 80, em um outro carnaval, ocasião em que afirmava ter deixado de beber. Realmente Joaquim deixou de beber, mas foi somente alguns anos depois deste fato.

O Bar 80, cujo dono, nessa época, foi o Turcão Adum, estava lotado. Tanto na parte do bar como no restaurante. As refeições por lá eram deliciosas e as cervejas bem geladas. Muitos sentem até hoje a falta desse bar e restaurante.

Joaquim, empertigando-se, disse:

– Veja para mim uma caixa de cerveja! – pediu, empostando sua voz.

Turcão estranhou, pois o Meia Garrafa havia dito que ia parar de beber. Mas mesmo assim mandou um empregado buscar as cervejas.

Quando o rapaz apareceu com uma caixa cheia de cervejas, Joaquim, mais uma vez empostando a voz, disse:

– Epa, mas eu não pedi uma caixa cheia de cervejas! – fingindo-se irritado, falou com voz alta – Eu pedi só a caixa, para me sentar! – explicou, arrancando gargalhadas de todos que ali se encontravam.