Cidade buscará em hortas o ‘fim da fome’

Alunos de unidade de ensino já trabalham com produção própria; proposta da administração é de desenvolver um projeto piloto voltado para moradores de todo o município (foto: AI Prefeitura)

Estimular a produção de alimentos em pequenas e médias escalas, com finalidade de erradicação da fome em Tatuí. Este é o objeto principal de projeto lançado na tarde de segunda-feira, 16, na Câmara Municipal.

A iniciativa envolve três entidades, com participações distintas, mas tendo em comum a prioridade de assistir famílias cadastradas no Banco de Alimentos “Zacharias Nunes Rolim”.

Denominado de “Agricultura Restaurativa”, o projeto deverá ser colocado em prática a partir do ano que vem. É o que prevê o diretor do Sindicato Rural Patronal, Milton de Albuquerque. De acordo com ele, o grupo de trabalho precisa realizar uma série de ações antes de convidar a população para participação.

A primeira medida consistiu na reunião, realizada com profissionais da área alimentícia e nutricionistas, na Câmara. O encontro contou com participação do secretário municipal do Meio Ambiente e Agricultura, Célio José Valdrighi, e da assessora especial da pasta, Heloísa Saliba e Borges.

Também participaram representantes do BAS (Banco de Alimentos de Sorocaba) e os vereadores Luís Donizetti Vaz Júnior, Antonio Marcos de Abreu e Severino Guilherme da Silva. Os três acompanharam a abertura dos trabalhos, a cargo da prefeita Maria José Vieira de Camargo.

“Fizemos esta reunião com todas as pessoas que trabalham com a parte nutricional para falarmos dos problemas da alimentação e apresentarmos o projeto”, contou Albuquerque.

Segundo ele, a intenção do grupo é trabalhar em parceria com a comunidade. A iniciativa prevê a formação de frentes de ação em regiões nas quais o município dispõe de terrenos. Serão utilizados apenas imóveis ociosos.

“Vamos trabalhar em locais estratégicos, justamente para podermos fomentar a produção de alimentos, para o banco e para as famílias”, comentou Albuquerque.

O diretor acrescentou que, entre os propósitos do projeto, está o estímulo à produção agrícola. Por meio da iniciativa, a Prefeitura e os parceiros querem fomentar o cultivo familiar – também conhecido como pequena agricultura – de modo a garantir que o município consiga atender aos pedidos de ajuda.

É por isso que o trabalho priorizará áreas próximas das famílias atendidas pelo Banco de Alimentos. O grupo ainda não tem mapeado quais são os espaços aptos a receberem plantios. A escolha será feita após cruzamento de dados a serem repassados pelas unidades do Cras (Centro de Referência de Assistência Social).

“Vamos usar os centros como base para reunirmos as pessoas assistidas pelo Banco de Alimentos. A partir das regiões onde elas moram, vamos começar o trabalho de divulgação, para que possamos ter um empenho de todos”, informou Albuquerque.

Conforme ele, que também é presidente do Consea (Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional), o projeto de Tatuí é considerado pioneiro. Albuquerque mencionou que ação semelhante é realizada em Piracicaba.

Esse município conta apenas com hortas urbanas, mas com fins de comercialização. “Nosso projeto é justamente para restaurarmos a cultura agrícola do interior, para que possamos inserir essas famílias dentro do âmbito da produção”, argumentou.

Em princípio, 320 famílias devem ser convidadas a aderir à proposta. Esse é o número médio de atendimentos registrados pela equipe do Banco de Alimentos por mês.

Com o incentivo ao cultivo, o órgão pretende aumentar ainda mais a assistência ao mesmo tempo em que elevará a capacidade de produção agrícola da cidade. “Nossa fila de espera é grande, mas, a partir do piloto em andamento, poderemos assistir ainda mais famílias”, disse o presidente do Consea.

A ideia é aproveitar quem está assistido ou recebendo ajuda temporária do banco, capacitando-os para todas as fases da produção. Os participantes deverão ajudar no preparo do solo, plantio, trato de cultivo e colheita das chamadas culturas de interesses.

Trata-se de mandioca, abóbora, batata-doce, quiabo, entre outros. “São alimentos que demandam menos mão de obra, menos água e que têm um valor energético maior, até porque, de alface, nem passarinho vive”, reforçou Albuquerque.

Depois de escolhidas as áreas a serem trabalhadas, as famílias serão convidadas a cuidar dos imóveis e a participar do processo de cultivo. A previsão é de que as primeiras sementes sejam plantadas em 2018. Isso porque a Prefeitura precisará de autorização para destinar os imóveis.

O passo seguinte será a preparação dos terrenos. É nessa etapa que a Prefeitura vai avaliar, com a equipe técnica, as condições das áreas e se elas precisam ser capinadas ou preparadas com uso de equipamentos e veículos, como tratores.

Na sequência, a equipe vai preparar o solo para, depois, definir os tipos mais adequados de cultura. “As culturas que demoram mais serão plantadas em áreas maiores; as que demandem de menos tempo, em locais menores”, explicou o diretor.

Ele também será responsável pela assessoria técnica das hortas comunitárias. Albuquerque trabalhará ao lado de profissionais da Prefeitura – que cederá os imóveis – e da Faesb (Faculdade de Ensino Superior “Santa Bárbara”).

Para acontecer, o projeto demandará de engajamento da sociedade civil, no entendimento da prefeita Maria José Vieira de Camargo.

De acordo com ela, a Prefeitura quer, por meio da ação, estimular as pessoas a terem melhor qualidade de vida, com acesso a alimentos de qualidade superior e em variedade.

“Nossa proposta, com a agricultura restaurativa, é atender à população. Esperamos que as pessoas deem a importância devida para os alimentos. Pretendemos estimulá-las para que plantem alimentos em cada canto possível e que possam aproveitar ao máximo o que o solo pode oferecer”, acrescentou.

Maria José acrescentou que a novidade poderá ser ampliada com ajuda da rede municipal. Algumas escolas, inclusive, já contam com hortas cultivadas pelos alunos, como as Emefs (Escolas Municipais de Ensino Fundamental) “Eunice Pereira de Camargo”, no Jardins, “Accácio Vieira de Camargo”, no São Cristóvão, e “Maria da Conceição Oliveira Marcondes”, no Valinho.

Desde o início do ano, a Secretaria Municipal da Educação desenvolve o “Horta nas Escolas”. Ele prevê plantio de hortaliças e mudas de árvores frutíferas.

Data especial
A prefeita explicou que o novo projeto foi apresentado no Dia Mundial da Alimentação em função da representatividade da data. “A segurança alimentar é uma estratégia importante e que faz parte de um conjunto de ações participativas”, comentou.

“Temos o privilégio de contarmos com o Banco de Alimentos em Tatuí, mas é claro que precisamos melhorá-lo ainda mais. As nossas discussões, na data de hoje (segunda-feira, 16) são o primeiro passo na direção para atendermos melhor ao que o cidadão mais precisa: a qualidade de vida”, complementou.

A ação de estímulo à produção agrícola não será limitada às áreas do Executivo, conforme a assessora da secretaria. Heloísa explicou que a pasta pretende estimular a criação de hortas domiciliares ou comunitárias, que possam ou não atender ao Banco de Alimentos, em espaços públicos e particulares.

Embora o projeto preveja apenas cultivo em lotes da Prefeitura, a assessora mencionou que empresários ou proprietários de áreas ociosas também podem colaborar. A diferença é que todos produzirão alimentos de uma horta “não convencional”.

O grupo não deve plantar alface e escarola, por exemplo, mas dar preferência à batata-doce, abóbora, mandioca, inhame e cará. “Essas são cultivares que demoram mais tempo, mas que, em contrapartida, matam a fome e recuperam a desnutrição, que é o trabalho que estamos visando”, disse Heloísa.

De acordo com ela, mesmo quem não possui terra disponível (pelo menos, à vista) pode participar. A proposta do banco é capacitar as pessoas a produzirem, independentemente do espaço.

“É possível criar um ‘terreno na parede’, ou plantar em um caixote. Nós queremos resgatar, culturalmente, uma série de benefícios dos alimentos, com foco na melhoria da nutrição”, vaticinou.

Os caixotes podem ser usados para cultivar cenouras e batatas, em pequenas proporções. Já as hortas adaptadas (nas paredes) são consideradas ideais para plantio de condimentos, como salsinha e cheiro-verde, também em quantias reduzidas.

Conforme Heloísa, a meta principal do projeto é a diminuição da desnutrição. Para isso, as famílias serão orientadas durante e depois do processo de cultivo. O acompanhamento ficará a cargo de profissionais da Santa Bárbara.

A participação nas hortas não será requisito para atendimento no Banco de Alimentos. A assessora da secretaria disse que o órgão continuará atendendo todas as pessoas em situação de vulnerabilidade, mesmo as que não puderem colaborar.

O projeto piloto será composto, prioritariamente, por famílias assistidas com cestas básicas. Contudo, além dos grupos familiares, que variam de acordo com as emergências atendidas pelo Banco de Alimentos, a iniciativa será aberta a não atendidos.

“Toda ajuda é bem-vinda. A nossa intenção é de buscarmos o máximo de pessoas e de despertarmos, nelas, o interesse pela cultura da agricultura”.

O trabalho atende também a uma necessidade do Banco de Alimentos, que deixou de ser abastecido pelo PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) neste ano.

O governo federal não prorrogou a iniciativa, que consistia na aquisição direta de produtos de agricultores familiares ou de organizações como instrumento de fortalecimento do setor agrícola. Por meio dele, os pequenos agricultores recebiam para produzir alimentos cedidos ao banco do município.

Com a interrupção, o órgão teve redução brusca na quantidade de alimentos. “Hoje, nós contamos, principalmente, com os supermercados na coleta dos alimentos. Portanto, esse é um projeto que vai ajudar ao banco e estimular as pessoas a buscarem alternativas para saírem da desnutrição”, enfatizou Heloísa.